terça-feira, 6 de outubro de 2015

EXPEDIÇÃO SOL DA MEIA NOITE (França, Alemanha, Suécia, Noruega e Dinamarca)

Santos, 08 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Ouvimos dizer que, no auge do verão, nas longínquas terras da Noruega, o sol jamais se põe; ele chega a quase deitar-se no horizonte, num lindo pôr do sol avermelhado, para, novamente, percorrer o caminho de volta ao meio do céu, sem que nunca chegue o anoitecer.


O andar do Sol da Meia Noite das 18hs às 6hs
Fonte: http://umdenosdois.blogspot.com/2008/04/sol-da-meia-noite.html

Assim, em nossa constante ânsia pela VERDADE e JUSTIÇA, após longa análise, concluímos que meticulosa investigação, “in locu”, deve ser iniciada imediatamente, a fim de que não reste comprometido o futuro da humanidade. Portanto, e também com o legítimo intuito de cumprirmos nossa honrosa, longa e árdua META dos 100.000.000.000.000.000 Km viajando, resolvemos colocar, novamente, nossos pés na estrada.

Aproveitaremos a oportunidade para descobrir o que há (se é que há) de podre no reino da Dinamarca e para dar uma voltinha pela Suécia.


Mas nada estará completo sem a sua companhia, portanto: Vem com a gente!

Sayo e Claudio




Santos, 10 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Para que você, que irá nos acompanhar em nossa árdua jornada até os confins da terra, não se perca da caravana, estamos mandando um mapa, com o roteiro da expedição.

Compre seu bilhete, faça as malas (não esqueça o guarda chuva e um casaco quentinho, afinal verão na Escandinávia é inverno no Brasil), pegue o passaporte, avise os familiares, desligue o gás, regue plantas, deixe o gato com o vizinho e as crianças na casa da vó (as crianças modernas não gostam de natureza, prefere computador), prepare o bacalhau, pegue um copinho de Aquavit (não exagere que a coisa é forte), escolha uma poltrona confortável, ligue o computador e VEM COM A GENTE! 

Aproveite para enviar alguma dica para tornar nossa viagem mais interessante. Talvez algum fiorde, que já visitou e achou incrível, de tirar o fôlego;

um restaurante, que viu em alguma revista de turismo; um lugar que você gostaria de conhecer, mas ainda não teve tempo; ou mesmo o endereço de sua adorável prima norueguesa, que faz que prepara um Gravlax


 ou um Smorbrod como ninguém, 


teremos imenso prazer em visitá-los, conferir  e contar tudo, nos mais mínimos e prazerosos detalhes. 

Beijos, 

Sayo e Claudio 



Maison Alfort, 12 de junho de 2014.

Caro Amigo,

As férias, este ano, saíram um pouquinho mais tarde. Abandonamos a Europa no final da primavera, início do verão, nosso período predileto, por um motivo justíssimo, a Copa do Mundo no Brasil, não poderíamos perdê-la e, afinal, não nos arrependemos um milímetro.

É bem verdade que não ganhamos, nem sequer fizemos tão bonito como imaginávamos, ou melhor, a seleção não o fez, porque, de modo geral, ressalvadas todas as atrapalhadas tão típicas nossas, a Copa foi um sucesso todos (quase) adoraram o Brasil e os brasileiros . E nos adoramos participar de junto, assistir um jogo pessoalmente, conhecer gente de outros países e reunir amigos para grandes e alegres comilanças. Perdemos a Copa mas ganhamos uns bons quilinhos (ah, ah, ah!).  

Assim nossa viagem veio parar no alto verão Europeu, ocasião em que os vovozinhos deveriam ficar em casa (ah, ah, ah!), resguardados do calor escaldante. E foi para fugir do calor que escolhemos ir à Escandinávia, pois já que não somos muito chegados a temperaturas muito frias, coisa muito comum no nosso destino deste ano, imaginamos que o verão nos traria temperaturas mais agradáveis.

Voamos com a KLM, que se uniu a Air France. Como sempre, nossa escolha baseia-se no preço, ela era a mais barata na ocasião da compra. Apesar do preço, não nos decepcionou, ainda guarda um pouquinho daquela clamour de andar de avião, quando isso não era para qualquer pobre mortal.

Distribuiram aquelas toalhinhas quentes para limpar as mãos; aperitivo antes do jantar; vinho à vontade em pequenas garrafas; sanduíches e sucos, toda a noite, à disposição; os copos eram plásticos, os talhares também, nem tudo é perfeito, pelo menos eram de boa qualidade.

A chegada foi tranqüila, com as malas todas quase inteiras, mas ao menos, tudo que levamos, um alambique todo, chegou intacto. Nos esperavam os amigos,  Paul e Olga, no aeroporto.

Chamamos a empresa do leasing e, em pouco tempo, já procurávamos um posto para colocar diesel no carro.

Depois de algumas voltas estávamos em nossa casa de Maison Alfort, ao lado de Paris. Mais um pouco e chegavam os amigos Francis e Catherine para nos saldar. Como é início de agosto, a maioria dos amigos está de férias, fora de Paris, assim que nosso jantar  brasileiro será um pouco menor este ano.

Entre um copo e outro começamos a falar de nosso roteiro de viaje. Paul e Olga fizeram um muito parecido, há dois anos, e nos mostraram dois livros com as fotos de sua viagem, seus mapas e nos deram vários valiosos conselhos, além de nos dizerem que era impossível ir à Noruega sem ir ao Círculo Polar, onde realmente se vê o Sol da Meia Noite.

Isso significaria um acréscimo de cerca de mil quilômetros ao norte em nossa viagem, além da mudança parcial de nosso roteiro original, uma cifra bem significativa, principalmente porque estamos quase sempre atrasados e quase nunca conseguimos cumprir todo o nosso roteiro, como bem sabe o Caro Amigo que nos acompanha.

Que fazer? Pensamos bem e, finalmente ... hora do jantar, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio


Paris, 13 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Bem sabemos que o Caro Amigo, que nos conhece bem, já está mais que seguro da decisão que tomamos, já até enrolou um cachecol mais quentinho no pescoço. Sim ... e, finalmente, decidimos que vamos até Tronso, mil quilômetros não é nada (ah, ah, ah!), já fizemos isso na Turquia, só para dormir uma noite em uma pequena cidade litorânea que gostamos; já fizemos isso no Brasil, para jantar um Bife de Chorizo em Puerto Iguaçu. Como diz o caipira, é um tirico de espingarda (ah, ah, ah!) e, como bem sabe o Caro Amigo, o Kuc jamais perderia a oportunidade de poder contar suas proezas pelo Ártico (ah, ah, ah!).

Hoje tivemos um dia a quatro, nos levaram os amigos a conhecer algumas coisas em Paris.   Começamos por um bairro “Bobo”, já havíamos lido o termo em uma revista Viagem e, realmente, é uma moda em Paris, embora na opinião de Olga, e na minha (Sayo), seja algo muito paradoxal; é um bairro boêmio / burguês, não conseguirmos entender bem como um burguês pode ser boêmio, nos parece dois opostos que se repelem por suas próprias definições; a não ser que haja falsidade em um dos dois conceitos. Enfim, fomos a Paris 5 (os números são como anéis que identificam os bairros).

Subimos pela Rue Mouffetard, ladeadas por aqueles pequenos negócios, com vitrines graciosamente arrumadas, como desenhos de um livro infantil, sorvetes, roupas, queijos, vinhos, frios, terrines, frutos do mar.

Assim chegamos a Place de La Contrescarte, onde de deveríamos encontrar uma feira que, inexplicavelmente,  não estava, talvez agosto, quando todos saem de férias e não se incomodam de fechar seus negócios. Se por um lado o trânsito da cidade fica excelente, por outro é péssima a impressão de andar pela cidade com a maioria dos estabelecimentos fechados, inclusive padarias e restaurantes.

Fazia frio e, de quando em quando, até umas gotinhas de chuva caiam do céu acinzentado. Assim que um cafezinho quente, no Café dês Arts, nos caiu como uma luva, assim como o papo com o proprietário, que nos contou que Pierre Barrault, amigo de Baden Powell que escreveu a música tema do filme Um homem e uma Mulher, continua freqüentando o local.

Fomos a Bairro Chinês, Avenida D’Ivry, onde almoçamos, Ravioli (guioza no Brasil) de Camarão e de Porco, Pato Laqueado, aquele que eles costuma pendurar nas vitrines dos restaurantes. O Mercado Tang é uma boa opção para compra de produtos orientais, comidas ou louças.

Depois, acredite o Caro Amigo se quiser, fomos ao Canal de L’Ourcq, na Avenida Quai de Valmy, em plena Paris 10, uma estreito canal navegável, com eclusa e ponte giratória.

E voltamos para casa passando pelo Chatêau Vincennes. Já havíamos planejado jantar “Restô Dontê” (nós também damos aula de francês para franceses, ah, ah, ah!) e aproveitamos a noite para planejar os detalhes do jantar do dia seguinte, pois costumamos fazer alguma comida brasileira para os amigos. Dessa vez seria uma comida goiana, um Arroz de Puta... depois damos os detalhes, estamos cansados.

Beijos,

Sayo e Claudio.


Paris (Ille de La Cité), 14 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Jamais iríamos a Paris sem passar na Igreja da Medalha Milagrosa, que conhecemos no Brasil como Nossa Senhora das Graças, onde a Virgem fez suas aparições à Santa Catarina de Labouré, em 1830, dizendo-lhe como deveria ser cunhada sua medalha, que, de um lado, trás Maria sobre o globo terrestre (mundo), pisando em uma serpente (mal), de suas mãos abertas partem raios (graças, milagres) e trás os seguintes dizeres: “Ó Maria concebida sem pecados, rogai por nós que recorremos a Vós”. Já no verso trás doze estrelas (apóstolos), um “M” (Maria), uma cruz (Cristo), um coração coroado de espinhos (Jesus) e outro transpassado por uma espada (Maria). Medalha que garantiria proteção a quem a portasse com fé. Deixamos o site da igreja para que o Caro Amigo observe os horários de missa e funcionamento, quando for sozinho:  http://www.chapellenotredamedelamedaillemiraculeuse.com/PT/a__Bem-vindo.asp.

Assim, saímos pouco depois das oito, com destino à Rua du Bac, nº 140, para participar da missa das 10:30 horas, descendo na estação Sévres-Babilônia, da linha 10 do metrô. Chegamos um pouco adiantados e aproveitamos para dar uma passeada no mercado Boun Marché, uma perdição, dá para comer por lá; se deliciar com os bolos e doces; ou mesmo só ficar namorando tudo que há para comprar. 

Depois fomos a uma exposição sobre o Oriente Express, aquele famoso trem que ligava, inicialmente, Paris à Istambul, o ocidente ao oriente, e chegou a ligar Londres ao Cairo. Rota de trem que foi imortalizada por Agatha Christie, James Bond e tantos outros.  O Instituto Mundo Árabe, onde estava a exposição, é um lugar interessante para uma visita, no último andar tem um elegante restaurante e um pátio, que pode ser visitado, com uma bela vista do Sena, cortado por barcos, ao fundo da Notre Dame. Dá até para comer algo de modo mais informal num bem transado café árabe, que fica no subsolo. É só pegar a linha 10, do metrô, e descer na estação Jussieu.

De lá seguimos caminhando até a Notre Dame, passando pela beira do Sena, justamente passando pelas tão peculiares banquinhas dos vendedores de livros usados, fotos e pôsteres; muitas fechadas em virtude das férias.

Encontramos a Pont de L’Archeveché entupida de todas as formas de cadeados, garantia de que, quem neles escreveu seu nome, jamais se separará da pessoa amada (Será?). Uma paradinha para comprar um crepe e seguir comendo. Dessa vez não fomos à Notre Dame, pois as filas eram homéricas.  

Por sorte, o sol até mostrou uma carinha alegre, aproveitamos a oportunidade para dar uma voltinha na Paris Plage. Sim, Caro Amigo, a praia de Paris, produzida artificialmente em uma das margens do Sena. Tem até areia, além de espreguiçadeiras, jogos, sorveteria, lanchonete etc. Dá para passar um dia agradável e ainda dar uma espiadinha na cópia de algumas das obras do Louvre, que fazem alusão a mulheres banhando-se, expostas em um painel,  Louvre à La Plage.

Abandonamos a praia na Pont dês Arts, nossa preferida, por ser o local de nossos piqueniques, no dia da Mísica, 21/06, entrada do verão europeu. Lá paramos para namorar a Ille de La Cité, que divide o Sena em dois braços, nos quais repousam alguns peniches, que observam passar barcos lotados de ruidosos turistas, enquanto um sol quentinho bate em nossas costas e afugenta  o inoportuno frio.

Atravessamos o Louvre, observando seus lindos edifícios e sua estranha pirâmide de vidro, e fomos direto para o metrô, pois ainda tínhamos o jantar para preparar.

Alguns dias antes de nossa viagem, assistimos à entrevista de uma “chef” de cozinha que falava de uma comida de seu estado, Goías, um tal Arroz de Puta Rica, originado nos bordéis, a partir da mistura de sobras de comida encontradas na geladeira, após uma noite de trabalho, que era servido às trabalhadoras e seus clientes remanescentes; que foi aperfeiçoada por uma suposta francesa, dona de um dos tantos bordéis, para atrair clientes, que nomearam o prato de Arroz de Puta Rica, enquanto o servido nos outros bordéis era Arroz de Puta Pobre.

Em resumo, no arroz vai de um tudo. Como adoro (Sayo) mudar receita para melhorá-la (o que nem sempre acontece, ah, ah, ah!), coloquei cebola, alho, pimentão, azeite, carne seca, frango, lingüiça, paio, milho, tomate, ervilha, caldo de carne, pimenta, cominho, cúrcuma e salsinha. Para acompanhar (?) fiz um pouquinho de feijão preto e um montão de caipirinha. Estava gostoso, mas não foi o prato que arrancou mais elogios, a moqueca de bacalhau, que preparei há dois anos, fez mais sucesso.

De qualquer modo fez muito sucesso no nosso piquenique. Sim... porque sou nordestina e, na falta de uma matula de frito, vai a matula de Arroz de Puta Rica. Mas voltemos ao jantar, da matula falamos depois, ou melhor... falamos de tudo depois, estamos podres.

Beijos,

Sayo e Claudio   



Dülmen, 15 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Nosso jantar transcorreu tranquilamente, como entrada tivemos embutidos, mariscos e lula em “su tinta”, acompanhados por baguetes e caipirinha. Prato principal, o Arroz de Puta Rica com feijão preto, servidos com vinho tinto. Como não poderia deixar de ser, os queijos com mais baguete. Finalizando com cocada e bombom Garoto.

E a coisa já ia lá pela uma da manhã, quando saímos à francesa (diz nossa amiga francesa que o termo correto é “sair à inglesa”, ah, ah, ah!), pois estávamos puro pó (viajar também cansa, ah, ah, ah!), o pessoal começava a cantar, promessa de uma noite longa. Nos contou Olga que a coisa acabou lá pelas três da manhã, foi então que  descobrimos que 15/08 é feriado em boa parte da Europa, dia da Ascensão de Nossa Senhora.  

Deixamos Maison Alfort, e os queridos amigos, num chuvoso e frio dia de verão, muito típico na região de Paris. Chegamos à Bélgica, que não se encontrava em muito melhor situação, atravessando vilarejos e beirando o rio Meuse, que é navegável graças às suas eclusas; uma viagem de barco pelos canais e pequenos rios da França é um de nossos sonhos.

Numa das eclusas, decidimos parar para nosso primeiro piquenique, com o tal arroz da matula, um copinho de vinho, baguete (amamos!) e queijo Coloumier, uma delícia, mas que já deixava nosso carro com um cheiro terrível, pois seu odor é muito parecido ao do queijo Camambet. Já estávamos famintos e estressados, pois a nossa nova acompanhante Eva Maria, a mulher que mora no nosso GPS, assim batizada por falar demais, repetir demais e criticar demais (“você está acima do limite de velocidade!”). Imaginamos que ela seja, mais ou menos, como a Eva, que só tinha o Adão para azucrinar, então passava o dia atormentando o pobre. Ele não teve sogra mas, em compensação, teve a Eva. O Maria é uma herança de família, já que minhas irmãs e eu somos Marias, além do mais, adoro nomes duplos.

É, Caro Amigo, estávamos estressados, pois a Eva, nascida no Brasil, procurando o caminho mais curto, mudava a cada instante de estrada, nos deixando loucos, pois, como ainda não temos confiança total em sua pessoa, por ser sua primeira viagem, tratávamos de conferir tudo que ela dizia em nossos mapas,  já que não somos nem loucos de sair sem eles. Vai que ela fica muda (não seria nada mal, ah, ah, ah!)!

Ia beirando às nove da noite quando decidimos parar para dormir, não quisemos parar na região de Dortmund, na Alemanha, procurávamos uma cidade mais calma. Um erro gravíssimo, que sempre acabamos cometendo, portanto, Caro Amigo, atenção, quando não tiver hotel reservado ou lugar certo para ficar, procure parar antes das seis horas, assim terá tempo para traçar um plano “B”, antes que escureça. Nós nunca temos hotel reservado, nem certeza de onde vamos parar, gostamos de olhar a cara do lugar antes de decidir.

A primeira cidadezinha em que paramos, Haltern, muito elegantezinha, tinha somente dois hotéis tão elegantes quanto. Seguimos para a cidade seguinte, Dülmen, tão elegante quanto a outra. Escurecia, a vontade de tomar um banho aumentava e a necessidade de comer algo quentinho gritava, rezávamos para encontrar um Zum, hotel que fica em restaurante, assim não teríamos que nos deslocar para comer. Mas, realmente, de rezar a ser atendido há alguma distância... mas falaremos dela depois, vamos parar para um café.

Beijos,

Sayo e Claudio



Lübeck, 16 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

De rezar a ser atendido, para nós, houve  uma distância muito pequena, já que Deus é pai e não nos desampara nunca. Mas temos que tirar o chapéu para Eva, pois ela nos indicou as localizações dos cinco hotéis da cidade. Ficamos no quinto, em uma restaurante de grelhados. O preço era um abuso, oitenta e seis euros, bem fora de nossos planos, mas já não tínhamos ânimo procurar em outra cidade e o jantar foi delicioso, compensou, Salada de Carpaccio e um grosso bife de carne de porco, com aquela batata temperada com cebola, macia por dentro e crocante por fora, que os alemães fazem tão bem. 

Tudo regado à maravilhosa cerveja de trigo alemã.

E no dia seguinte, recompostos, tomamos um bom café da manhã, com ovos quentes (eles têm até máquina para isso) e muitos embutidos. Saímos do hotel com intenções de seguir viagem e, à luz do dia, a cidade nos pareceu até muito simpática, com um centro comercial ótimo (nada com fazer umas compras para melhorar o astral).

Em nossos estudos sobre a Escandinávia, descobrimos que a Noruega é o país mais caro do mundo, informação inclusive confirmada pela Cara Amiga Nayla; onde uma água custa mais de quinze reais, um simples, simples mesmo, jantar mais de quinhentos. Assim, pensamos num plano para baratear a viagem, que será um pouco longa, e não precisar fazer algo tipo CVC. Decidimos fazer compras na Alemanha e já levar um bom estoque para piqueniques, inclusive noturnos. O Kuc costuma dizer que não sai do Brasil para dormir em euro, pois é muito caro, quero só ver o que ele vai fazer na Noruega, que é caríssima, ainda bem que tem o sol da meia noite, assim ele não precisará nem dormir (ah, ah, ah!).

Então o centro comercial nos caiu como uma luva, encontramos nossos mercados prediletos, Audi e Lidl, além de lojas de roupas. Nos divertimos muito! Passava das duas da tarde, quando seguimos em direção ao norte, para Lübeck, chegando quatro horas depois, bem a tempo de correr para a Saturno, afinal era sábado, e comprar uma máquina fotográfica nova, pois a nossa legal quebrou e estávamos só com uma “Xereta” (só os mais velhos saberão o significado, ah, ah, ah!). A Alemanha é um ótimo país para comprar câmeras, os preços são bons e tem modelos de última geração.

Estávamos perto da estação de trem e, não muito distante, encontramos um hotel com restaurante, já com preços mais módicos, que, do mesmo modo que o da cidade anterior, também pertencia a yoguslavos.

Bem sabemos que não há mais Yoguslávia, mas foi assim que eles se apresentaram quando perguntamos de onde eram, pois se percebia que, entre eles não falavam alemão; não seriamos nós a dizer que não eram. Por isso, aconselhados pelo muito simpático garçom, que nos deu as dicas para a travessia para a Escandinávia,  resolvemos comer  pratos típicos dos Bálcãs, “cevapcici ou cevapi”, que, em resumo, são carnes picadinhas (moídas) assadas de vários modos e com vários temperos.

Uma saladinha de entrada e chegaram os pratos cheirosos e fumegantes. O meu  tinha um formato de omelete, mas era pura carne com recheio de queijo de cabra, arroz, salada e fritas; já o Kuc experimentou algo em formado de quibe, com os mesmos complementos. Tudo estava delicioso, a carne muito suculenta.  Algumas cervejas e dormimos como anjos. 

A travessia por Puttgarden, há 100 km de Lübeck, nos pareceu o percurso mais curto, que baratearia a balsa. Ainda paramos, na simpática cidade de Burg para as últimas compras, já que encontramos os nos nossos mercados prediletos, que estão espalhados pela Alemanha toda, para nossa sorte. Era domingo, estava todo comércio aberto e gente comprando como se fosse estourar a 3ª Guerra Mundial, não imaginávamos tínhamos absoluta certeza do motivo. Mas tivemos a confirmação quando pagamos a balsa para a Escandinávia, quase enfartamos, 45 minutos por ... está na hora do café, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Helsingborg (Suécia), 18 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Tivemos a confirmação quando pagamos o ferry, 92 euros pelos 45 minutos que nos levaram à Dinamarca. Por isso o pessoal comprava o mundo, porque, ao que parece, toda a Península Escandinava é caríssima. Parece que compramos pouca coisa, aproveitaremos para fazer um regime (ah, ah, ah!). 

A empresa chama-se Scandline (servicecenter.germany@scandlines.com) e tem ferry a cada hora. Na verdade é algo bem luxuoso, com restaurante, brinquedoteca, lanchonete, lojas e duty free, onde ainda é possível fazer as últimas comprinhas. Lembra um transatlântico, os veículos vão e andares, na parte inferior, e os passageiros podem divertir-se nos pisos superiores.

Atravessamos direto a Dinamarca, pois pretendíamos conhecer duas cidades no lado oeste da Suécia, que estavam no nosso caminho até a Noruega, gostamos de começar(?) a viagem pelos locais mais distantes. Mas tivemos tempo de observar que ela se parece, ou melhor, que sua zona rural se parece com a da Polônia, ainda conserva seu ar bucólico. O segundo ferry, da mesma empresa, teve um custo de 52 euros, por um percurso de 15 minutos, com direito aos mesmos luxos do ferry anterior.

Assim chegamos à Suécia o terceiro maior país da União Européia, uma monarquia constitucional, cuja rainha é uma brasileira, com sistema parlamentar de governo. Chegamos a Helsingborg, a cidade onde o Brasil ganhou a Copa do Mundo de 1958, conhecida por ligar o país ao restante da Europa. O ferry chega exatamente no centro da cidade, que não é grande, tem cerca de cento e cinco mil habitantes.

Quando chegamos o clima não podia estar pior, chovia muito, ventava, fazia frio, menos de 14 graus, tudo estava fechado, nem cachorro andava pela rua, aparentemente o mundo havia acabado. Um horror! Hotel barato também é artigo de luxo, assim como o verão. Imaginávamos que jamais encontraríamos muito calor por aqui, mas, por ser alto verão, esperávamos algo em torno de 20 graus. Finalmente, com ajuda de Eva Maria, já que os centros de informações turísticas estavam fechados, pois era domingo à noite, encontramos um hotel legal por 106 euros, uma verdadeira catástrofe para nosso orçamento. 
Felizmente, o dia seguinte amanheceu com uma cara até melhorzinha. O Kuc até esqueceu que jantou no quarto, quanto viu a mesa do café da manhã cheia de arenque marinado e pepino azedo. O sol não durou muito, aparentemente, por aqui, o clima muda em segundos, do sol para uma pancada de chuva ou uma rajada de vento gelado. De qualquer modo, lugar de turista é na rua, outro dos lemas do Kuc.

Nossa primeira parada foi na Igreja de Santa Maria, luterana, em estilo gótico, retábulo de madeira entalhada policromada, com cenas da vida de Nossa Senhora. O púlpito. Também de madeira entalhada policromada, mostra cenas que vão da criação do mundo à ascensão de Jesus Cristo, com delicados trabalhos de machetaria, um verdadeiro primor.  Os vitrais, embora não apresentem uma tão grande riqueza de detalhes, têm um colorido profundo, que alegra o sóbrio ar da igreja, emprestado pelo ar bege e marrom da madeira dos bancos  e dos tijolos que revestem suas paredes em estilo gótico. Quando nos preparávamos para sair, alguém começou a tocar o órgão, acabamos nos sentando novamente para desfrutar toda beleza um pouquinho mais.

O imponente prédio da Câmara Municipal segue o estilo gótico e os tijolos da igreja, está localizado frente ao mar, como que observando a entrada e saída dos barcos. Não muito longe fica o Centro de Informações Turísticas, onde conseguimos um mapa do país e algumas indicações para visitas na região.

Da fortificação original, onde nasceu a cidade, que pertencia, inicialmente, à Dinamarca, resta somente a Torre Kärnan, na qual subimos para apreciar, do alto, a cidade. Na bilheteria da torre, é possível comprar um bilhete conjugado para visita a quatro locais por cerca de 12 euros. Caminhamos um pouco mais e estávamos no Estádio Olimpic, onde a seleção do Brasil jogou em 1958.

Seguimos, agora de carro, para o que foi o palácio de verão dos monarcas suecos, Sofiero, que fica há 5 km da cidade, cuja entrada estava no bilhete conjugado.  Não se trata de nenhuma suntuosidade, parte dele transformou-se em restaurante, parte em uma cafeteria ótima para um bolinho com café, principalmente se for bolo de chocolate com geléia e frutas frescas. Já nos cômodos restantes, há exposição de fotos, objetos e móveis. O ponto alto da visita são os jardins do palácio, nos disseram que é o mais lindo da Europa. Realmente não mentiram muito.

Infelizmente as rosas se acabaram, mas restaram as coloridas dálias e o que seriam brancos bancos, sob a sobra das folhagens, donde se podia observar um sem fim de pequenas flores silvestres; frutas e legumes enchiam canteiros; macieiras se tornaram cercas vivas, enquanto uvas enchiam estufas de vidro. Algumas abelhas para espalhar o pólen; pássaros de peito colorido fazendo festa; esquilos escondendo sementes. Felizmente os momentos de chuva cessaram um pouco e restou o delicioso sol. O paraíso sem dúvida existe e é por aqui mesmo.

Ainda voltamos ao Centro de Informações Turísticas, para ver algumas exposições no mesmo edifício, também parte do bilhete conjugado, mas não foi muito proveitoso, fizemos tudo meio porcamente, pois encerrava às seis da tarde. A cidade continuava uma tranqüilidade, muitos comércios fechados, pouca gente na rua, o restante, muito inteligentes, foram passar o verão em outro lugar (ah, ah, ah!). Como voltava a chover e o frio aumentava, voltamos para o hotel, onde nos esperava um copo de vinho e uma salada com arenque defumado.

Quanto estivemos no Centro de Informações Turísticas, recebemos uma dica de seguir para Gotembugo por uma pequena estrada que, por vezes, beirava o mar até Kullaberg, uma área de preservação, estamos pensando em alterar mais uma vez a viagem, o problema é saber se não nos faltará tempo para fazer os três países que programamos e os 1.500 km que resolvemos seguir para ir ao Círculo Polar Ártico... mas isso fica para amanhã.

Beijos,

Sayo e Claudio




Kullaberg, 19 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Como não sabemos quando voltaremos ao oeste da Suécia, principalmente em virtude do verão de 15 graus (no sol, quando há) resolvemos seguir a indicação. Infelizmente não conseguimos sair muito cedo, pois nos faltava a última visita do ingresso conjunto.

Fredriksdal fica dentro da cidade, num imenso parque ao lado do estádio. É um museu a céu aberto, que mostra um pouquinho da vida e hábitos locais, entre meados dos séculos XIX e início do XX. Como adoramos museus etnológicos nos divertimos muito na pequena vilinha, com gráfica, farmácia, serraria, cafeteria, casa de fazenda, sauna, serraria, curral, armazém etc, até compramos alguns pôsteres com propagandas antigas, e observamos que o uso de tijolos, que em alguns locais são chamados de azulejos, é uma tônica nas construções desde há muito tempo.  Tudo fica em um parque imenso, entre os tantos que se encontram pela cidade, pois a vida ao ar livre, apesar do frio, é um hábito em todo o país; e nele também encontramos jardins, nos quais as rosas, plantações de ervas, legumes e frutas.

Iniciamos um roteiro beirando o mar, que nos foi indicado como algo imperdível, já mais de onze horas. Na saída de Hittarp, primeira cidade do roteiro, um moinho, casas de fazenda à beira mar, macieiras carregadas de pequenas maçãs vermelhinhas e um lindo B&B, pena que não vimos antes, fica para a próxima.
Tínhamos uma indicação para comer por lá um delicioso sanduíche de arenque, encontramos o pequeno quiosque, em uma minúscula praia perdida, deserta, mas o nosso santo não cruzou com do tiozinho que os vendia, então resolvemos seguir e fazer um piquenique em algum lugar, eles que como seus tais sanduíches, já que não haverá ninguém para fazê-lo em uma terça-feira, naquele fim de mundo. Esperamos que seja ele o tal bruxo desta viagem; em nosso imenso manual de teorias de viajante, temos um capítulo que trata da existência, em cada viagem, de um bruxo para atormentar o pobre turista; assim como alguma “roubada” na qual, infalivelmente, o viajante cairá.  

Vilarejos com ruas sem calçadas, casinhas de boneca, com telhados muito inclinados, talvez por causa da neve; alguns poucos degraus para a porta de entrada, iluminada por lampião; vasos floridos, chaminés e muitas janelas, através das quais o sol entrava e os olhos curiosos, como os nossos, assistiam aos pequenos adornos colocados pelas  zelosas proprietárias, vasinhos com flores, castiçais, abajures, bibelôs, delicadas cortinas esvoaçantes. Foi em um banco de um jardinzinho florido, em uma minúscula praça de um desses vilarejos, que paramos para nosso piquenique; o sol estava maravilhoso, mas o vento cortava.

Era, afinal a rota dos ventos e dos moinhos, encontramos três deles. Há ônibus urbano de Helsingborg para Kullaberg, portanto o Caro Amigo, quanto não estiver motorizado, pode aproveitar toda a beleza da rota ou, se preferir, pode até se hospedar em um dos muitos hotéis e B&Bs da região. 
Em Kullaberg, encontramos o parque, com campos de golfe, parece que os suecos adoram o jogo, e muita área para caminhadas, mas, como a tarde já ia bem adiantada, seguimos pois ainda tínhamos muito chão até nossa próxima cidade, onde chegamos já passavam das seis, novamente descumprimos uma regra de nosso manual, chegamos tarde para ainda procurar hotel.

Eva Maria nos levou diretamente para o centro de Gotemburgo, bem na hora do rush, não que houvesse congestionamentos, mais era um vai e vem de pessoas apressadas, já estávamos cansados, o Centro de Informações Turísticas fechado e os hotéis, encontramos por ali, eram muito caros e sujeitos a uma taxa de estacionamento de 4 euros a hora.  A esse preço sairia mais barato levar o carro para o quarto, para dormir na cama com a gente, pois o hotel sairia mais barato (ah, ah, ah!).

Nosso carro, como em quase toda viagem, está parecendo um carro de cigano, tem coisa espalhada por todo lado, até embaixo dos bancos. Lembrancinhas que já compramos; as roupas de verão que, agora, já sabemos que não usaremos; as provisões para os piqueniques; algumas garrafas de vinho e latas de cerveja, pois a carne é fraca e os impostos sobre bebidas alcoólicas são caríssimos. Mas para dar um ar mais digno à coisa, sempre trazemos um pano preto, para cobrir tudo. Como descascamos esse pepino?... está na hora do café, contamos amanhã.

Beijos,

Sayo e Claudio




Gotemburgo (Göteborg/Suécia), 21 de agosto de 2014. 

Caro Amigo,

Finalmente, depois de duas horas, acabamos ficando no Ibis Style, numa pequena cidade há 5 km de Gotemburgo, nos pareceu o melhor custo benefício, pois não pagaríamos estacionamento. Viajar de carro tem suas vantagens, nos dá mais autonomia, porém tem alguns inconvenientes, como o custo dos estacionamentos nas grandes cidades, ainda assim preferimos. A Suécia é um país caro é bom pesar os gastos.

O tal Ibis Style nos pareceu um engodo, a rede Accor tinha, na Europa, uns hotéis chamados Etap, de bom preço e, normalmente, localizados nas aforas das cidades. Parece que eles mudaram o nome para Ibis Style, incluíram o café da manhã, diminuíram os quartos (uma minúscula cabine de navio, conforme o Kuc, ainda bem que ele adora mar, ah, ah, ah!) sem nem secador; mas com preços bem altos. De qualquer modo, a recepcionista foi simpaticíssima, nos deu muitas dicas e até uns presentinhos, em retribuição ao chaveiro do Fuleco, que lhe demos.

Era um lindo dia de sol, quando saímos para conhecer a Gotemburgo, mas calor não fazia. Pegamos o ônibus em frente ao hotel e em quinze minutos estávamos no centro da cidade.  O que ela tem de mais lindo está nas ruas, a arquitetura em estilo art-nouveau de seus edifícios de quatro ou cinco andares, nos lembrou Karlovy Vary, na República Tcheca, talvez um pouquinho menos romântica, mas tão primorosamente bem cuidada quanto.
Chegando ao Parque Tradgards Foreningen, às margens do Rio Gota, que corta a cidade, demos de cara com um branco palácio de cristal, uma estufa onde estátuas e plantas conviviam harmoniosamente. Um jardim de rosas, muito gramado para descansar e uma cafeteria para quem quiser tomar uma taça de vinho, no final da tarde, apreciando toda essa beleza, ou até um café.

Trata-se a segunda maior cidade do país, mas, vista dali nem se percebia. Em verdade é um pais silencioso, as pessoas falam baixinho, os carros são muito silenciosos e buzinar deve dar pena de morte (ah, ah, ah!).
Vale à pena visitar Igreja da Rainha Cristina, construída em 1648, em estilo barroco, com diferentes vitrais nos quais os santos aparecem emoldurados em oratórios; seus lustres reluzem como se de ouro fossem.
Não dá para dispensar uma passadinha no mercado, tão limpo que dá (quase) para comer no chão e, passeando por seus corredores, dá até para provar muitos dos quitutes locais

Deixamos a cidade sob uma chuva torrencial, temperatura de onze graus, mas, mesmo assim, resolvemos seguir os conselhos do rapaz do Centro de Informações Turísticas e dar uma esticadinha na viagem passando por Lysekil, que  fica a 14 km da estrada que nos levaria a Oslo, bem na beirinha do mar.

Como por milagre, a pesada chuva que caia parou, a cidade nem sequer estava molhada, são os mistérios suecos. É a cidade das coloridas casinhas de madeira e do aquário chamado  Havet Hus. No centro da pequena cidade, um cemitério com ares de jardim; um jardim com ares de uma pintura de Monet. Tudo perfeito.

A Igreja de Lysekil, foi construída em granito, estilo neo-gótico, com decoração interior no estilo art-nouveau. Ela tem uma simpatia cativante, que convida qualquer um a entrar e por ali ficar, ainda que não para rezar, mas, tão-somente, para sentar nas mesas de sua cafeteria, logo na entrada, à esquerda, e de lá somente admirar a beleza de seus detalhes: seus arcos muito pontudos, que conduzem ao céu; suas rosáceas de vitral e granito; o delicado retábulo e o triunfal crucifixo do altar;  seu púlpito de madeira entalhada, com cenas da Anunciação de Maria à Ascensão de Jesus Cristo, que se é sobrio  em cores, é precioso em detalhes, que dão vida a santos e anjos, sabor a frutas e aroma a flores; o silêncio de seu órgão.

No caminho encontramos uma placa indicando de Patrimônio da Humanidade, somos doidos para visitar todos eles, então fomos  ao Museu Vitlycke, na região de Tanum. Trata-se de um conjunto de rochas com pinturas rupestres,  que são exemplos excepcionais da  Idade do Bronze. Há representação de animais, de crianças, de barcos, de homens e mulheres nas atividades cotidianas, caçando, dançando, rezando. A gravura mais famosa, denominada The Bride and Groom, é um casal namorando (?), um símbolo de amor e fertilidade. A visita é gratuita, há uma parte didática, em um pequeno edifício, com banheiro, lojinha e cafeteria, depois é só percorrer um caminho mapeado, sendo que parte dele pode ser feita de carro. Completamos nossos dois mil quilômetros de viagem!

Seguimos mais alguns quilômetros e estávamos em Strömstad a outra cidade de casinhas de madeira, que nos foi indicada pelo gentil rapaz do Centro de Informações Turísticas de Gotemburgo, que nos conseguiu, inclusive, mapas do país e informações em espanhol, uma raridade por aqui. É a cidade dos SPAs, tão simpática com a outra, com aquela limpeza ímpar, um agradável píer, onde os barcos se espremem, jardins bem cuidados e linda arquitetura. Alguns poucos turistas aqui e ali, gente de mais idade, que já sabe apreciar os delicados prazeres da vida com mais vagar (espero que o Kuc um dia chegue lá, ah, ah, ah!).

Chegar a Oslo foi fácil, já encontrar um hotel que coubesse em nosso orçamento, já foi um outro assunto, bem mais complicado, porque... estamos morrendo de fome, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio  



Oslo, 22 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Chegamos à Noruega carregados de informações, um guia, que compramos em Portugal, em alguma de nossas viagens por lá; muitos folhetos no Centro de Informações Turísticas da estrada, logo na entrada do país; e várias pesquisas de sites de outros turistas, entre eles, o de um casal de viajantes que se parece muito com a gente, quando tínhamos uns vinte anos menos (ah, ah, ah!) (http://retratoserelatos.com/noruega-entre-fiordes-e-vikings/).

A Noruega é uma monarquia constitucional, com democracia parlamentar, que já pertenceu à Dinamarca e à Suécia, tornou-se independente em 1905. Um país rico, em virtude do petróleo retirado do Mar do Norte. Mais da metade do país está acima do Circulo Polar Ártico. É o país mais desenvolvido do mundo, com o mais alto índice de desenvolvimento humano.
Tomamos um baile para encontrar hotel porque os preços são realmente caros e, diferentemente do que imaginávamos, que ninguém viria gastar seu verão no frio, a cidade estava cheia de gente para o final de semana. Não tínhamos reserva, então fomos tentando a lista que havíamos feito e alguns hotéis de nosso guia.  Alguns lotados, outros caros demais e outros nem sequer existiam. Nada!

Perdemos um, bem central, por acreditar que seu custo estava muito elevado, cerca de 120 euros, pelo pouco que oferecia, pois não tinha café da manhã, mas tinha uma micro cozinha, e teríamos que pagar estacionamento, cerca de 20 euros o dia; quando resolvemos voltar, o quarto já estava ocupado; mas fica a dica (www.cochspensjonat.no), pois, finalmente, para quem está à pé, é uma boa opção para ficar bem no centro da cidade e economizar cozinhando.  Estávamos cansados, embora tenhamos chegado cedo, já começava a cair a noite.

Decidimos, então, passar no B&B Villa Grogner,  (www.bedandbreakfast.no), que vimos na internet que estava lotado, afinal perguntar não ofende. Realmente estava lotadíssimo, gente dormindo até no escritório. Mas como Deus é bom e não nos desampara nunca, o dono era muito atencioso e ligou para alguns hotéis e nos encontrou um (www.voksenaasen.no).Há 10km, na montanha, próximo ao Holmenkollen, um complexo com uma enorme rampa para salto de esqui, onde se realizam competições. Ele nos garantiu que tinha uma vista maravilhosa para a cidade e para o fiorde Oslo e que o preço estava excelente. A principio a coisa nos pareceu uma roubada, mas precisávamos dormir naquela noite e, afinal, estávamos de carro, depois resolveríamos.

Na verdade era um hotel 4 estrelas, com piscina (só para inglês ver com o frio que faz aqui ah, ah, ah!)) sauna, pianos para todos os lados, lareira e um café da manhã bem legal. A diária é 130 euros, caríssimo para nosso orçamento, mas considerando que não se encontra nada decente na cidade por menos de 100 euros, exceto Albergue da Juventude, que não encaramos. Pesamos a qualidade do hotel; que não pagaríamos estacionamento; que poderíamos ir para o centro de carro e deixá-lo em alguma das ruas próximas do castelo, onde não se cobra estacionamento; que a localização era sensacional, em um bosque na montanha, cujos vizinhos eram vilas de típicas e formosas casas de madeira norueguesas, cobertas de terra, onde cresce grama, que serve como isolamento e onde, no interior, cabras pastam, aqui na capital parece que era só para dar charme. Resolvemos ficar as três noites nele mesmo, pois a vista, desde nossa cama,  do fiorde e da cidade, entre pinheiros, quando o dia começava a amanhecer sobre a cidade, banhando tudo de um tom azul enevoado, que ressaltava as luzes como pequenos pontinhos diamante muito brilhantes, era algo de muito valor.

O grande agito da cidade fica na  Karl Johans Gate (uma rua), que tem em uma ponta o Palácio Real, Slottet, muito sem graça, se não dissessem nem acreditaríamos, exceto pelos militares, que montam guarda à sua frente, ouvimos dizer que a troca de guarda (não descobrimos o horário), só os vimos fazendo alguns exercícios; e visitas guiadas em inglês e norueguês, não nos interessaram muito ao palácio. Ele fica no meio de um parque que vale o passeio.

Na outra ponta, fica a estação de trem e, no meio dos dois quase tudo. O Teatro Nacional, em estilo barroco, foi construído em tijolo, em 1899 e lembra um pouco o estilo de arquitetura que temos em grandes edifícios construídos, no mesmo período, aí no Brasil, teatros e estações ferroviárias de grandes cidades, à sua volta estátuas, que fazem alusão a peças teatrais e jardins.

Em frente a ele, a Universidade de Oslo, um imenso edifício em estilo neoclássico, de 1852.

A rua vai seguindo, entre fontes, alamedas arborizadas, estátuas, restaurantes, mesas sob guarda-sóis, onde alguns já se arriscavam em um almoço leve, lojas elegantes, artistas de rua. Tivemos que parar, assim como metade dos demais transeuntes, para observar um homem levitando, incrível!

Mais adiante, o Parlamento, Stortinget, inaugurado em 1866, ele sim tem cara de palácio, pode ser visitado aos sábados.

E a rua segue passando pelo mercado de flores e por nuvens de espanhóis, quase nos acreditamos na Rambla, não fossem os preços. Chegamos à majestosa catedral, Oslo Domkirke, cuja construção se iniciou em 1694, ficamos devendo a visita, pois nas duas vezes que lá passamos estava fechada.

A rua é um charme só, a maioria dos locais parece que vai para ver e ser visto, talvez arriscar umas comprinhas, pois as roupas, aparentemente, são mais baratas que a comida e não existe nenhum tipo comida de rua, um sorveteirozinho ou um vendedor de cachorro quente, deve ser por isso que as lindas norueguesas loiríssimas são tão magrinhas, sem nem cheiro de celulite. No final da rua está a estação de trem, onde é possível trocar dinheiro, na Forex-Bank pois a Noruega não usa o euro, nem está na União Européia, não quiseram, pois são milhonários, nadam no petróleo do mar do norte, eles usam o NOK.

E quando já deixávamos a  Karl Johans Gate e nos viramos para um último olhar, um último adeus, ela estava coroada por um arco-íris, do pote de ouro, claro, não vimos nem o cheiro,  pois os noruegueses já devem tê-lo encontrado e enterrado no quintal de suas casas (ah, ah, ah!).

Vamos deixar um pouquinho para manhã porque hoje já exageramos.

Beijos,

Sayo e Claudio



Bygdoy, 23 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Aqui não dá para contar com um dia completo de sol, ou de chuva, o clima muda com uma rapidez surpreendente, seguramente não dá para sair sem guarda-chuva e casaco, se possível até um cachecol e galochas, eles usam muito, umas versões bem elegantes.

Há um cartão, chamado Oslo Pass, que pode ser adquirido inclusive nos hotéis, e dá direito a entradas grátis e muitos museus, uso de transporte público, inclusive ferry, desconto em lojas e restaurantes etc; o válido para 24 horas, custa cerca de 150 reais, analisamos os custos dos museus que queríamos ver e, como estávamos de carro, achamos que não compensaria. Em vários locais, inclusive hotéis, é possível encontrar uma revistinha chamada Oslo – Guide, tem em várias línguas, inclusive espanhol, dá para ver o preço dos museus e os que são gratuitos, assim ninguém fica sem ter o que fazer na cidade. Os museus têm um preço médio de 40 reais, é bom estudar bem o custo benefício.

Perto da estação de trem fica a Oslo Ópera House, edifício concluído em 2008, revestido de mármore branco, que foi construído como lugar de encontro para eventos culturais, recreação e passagem de pessoas.

Nas imediações da Karl Johans Gate está a prefeitura, Radhuset, de tijolos, modernista e com cara dos edifícios construídos no período do comunismo, um caixote ser charme (nos perdoem os que gostam). Nele se realiza, anualmente, a entrega do Prêmio Nobel da Paz.  

Perto da prefeitura, visitamos o Centro Nobel da Paz, numa antiga estação de trem, mas foi uma furada, não recomendamos, pois é caro, as exposições são interativas, em norueguês e inglês, não dá para brincar nessas línguas, tem que ser na nossa ou em espanhol, mas o último não é muito usado por aqui. De qualquer modo deixamos nossa mensagem para propagação da paz e democracia.

Perto do Centro Nobel, no porto Arker Brygge, fica a Fortaleza de Akersus, construída em 1299, pelo Rei Hákon V, para defender a cidade de invasões  pelo mar.

Um dos passeios imperdíveis da cidade, Vigeland Park, com mais de 200 esculturas do artista Gustav Vigelang. Fica a alguns quarteirões para trás do Palácio, a entrada é grátis e o pessoal local aproveita o delicioso parque para prática de esportes (http://www.vigeland.museum.no/en/vigeland-park). As estátuas estão dispostas ao longo do eixo central do parque, são em bronze e apresentam aquele tom esverdeado, de que se reveste o material, quando exposto ao tempo; representam o homem nos diversos momentos de sua vida e em seus diversos humores.

A cidade tem museus a dar com pau, como os preços impedem a visita de todos, escolhemos os que mais nos interessavam. Na península de Bygdoy, que já foi uma ilha, estão os vários deles. Inclusive o Museu do Barco Viking, que é um dos pontos altos da visita à Oslo. Ele foi construído próximo ao local onde foram encontrados enterrados, na segunda metade do século XIX, por fazendeiros que trabalhavam na terra, três navios  vikings do séc. IX, em muito bom estado de conservação. Achados históricos de valor incalculável, pois permitiram conhecer muito dos hábitos do povo viking, que habitou o país. Oseberg,  Gokstad e Tune são seus nomes. Eles serviram como urna funerária, motivo pelo qual estavam praticamente intactos.

Os vikings usavam barcos rápidos, o que facilitava fugas e ataques, e tinha, à frente, esculpida a cabeça de um animal, motivo pelo qual receberam o nome de “drakkars” (dragão). Foi com esses barcos à vela que eles foram os primeiros europeus a chegar à América do Norte, não tem nada de Cristovão Colombo. Acreditavam em deuses que, assim como os humanos, eram bons e maus, realizavam cultos e adivinhavam o futuro através das hunas. A morte era festejada, enterravam as pessoas importantes mais ou menos como os egípcios, com seus pertences, animais, escravos e até, no caso dos homens, enterravam sua mulher predileta viva. Dizem que o uso do capacete com dois chifres, para evitar que o céu viesse a cair em suas cabeças é, na verdade, uma crença celta, não nórdica; assim que os vikings usavam um capacete cônico, sem nada de chifres, o resto é invencionice artística das óperas, que tentavam dar-lhes uma imagem bárbara e reforçar o nacionalismo, no século.

Ainda em Bygdoy, visitamos o Museu Kon-Tiki, que conta a realização dos sonhos e viagens do explorador Thor Heyerdahl, que queria provar sua teoria da possibilidade de viajar do novo ao velho mundo, em barcos simples, cruzando oceanos; o que explicaria a similaridade de estátuas encontradas no Egito e na Bolívia. Sua viagem mais famosa foi a realizada na jangada, em 1947, a Kon-Tiki, durante 101 dias e foi do Peru à Polinésia, pelo Pacífico.Mas ele realizou outras, como a de Marrocos a Barbado (1970), em um barco de papiro.

Mas foi quando deixamos o primeiro museu, que nos deparamos com uma cena inusitada, que somente acreditávamos existir em desenhos animados, ou em filmes antigos. Ela justificou e valeu toda a nossa viagem à Noruega, bem em frente a uma das elegantes casas... precisamos para umas fotos, temos que aproveitar que a chuva deu uma folga e o sol até apareceu.

Beijos,

Sayo e Claudio

PS – Caro Amigo, estamos um pouco atrasados em enviar as notícias, atente para a data em que foram escritas.



Geilo, 24 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Logo atrás da Galeria Nacional, onde está “Grito”, o quadro de Edvard Munch, um dos mais famosos pintores do país, fica o Museu Histórico, o último que visitamos em Oslo, que abriga uma câmara com moedas, o maior tesouro em ouro da Noruega; além de exposições  da America, China. Ártico, povos indígenas e Oriente médio.

Mas voltemos ao que vimos nas proximidades do Museu dos Vikings, sentadinhos em frente à casa em que moravam, junto a uma branquinha mesa, onde se viam decorados cupcakes, copos e uma garrafa de limonada; dois anjinhos de cabelos muito clarinhos, assim como seus olhos, que nem chegavam aos sete anos, tentavam angariar dinheiro para alguma de suas travessuras, vendendo os quitutes (a coisa não está boa nem para criança aqui, ah, ah, ah!). E os danados falam até inglês, divergiram um pouco quanto à quantidade de suco a colocar no copo, mas acabaram se entendendo, porque, lógico, compramos algo, era impossível não fazê-lo, mesmo com preços noruegueses. Mas eles teriam enriquecido se vendessem simplesmente o direito à foto, pois não havia quem passasse que não parasse, risse e tirasse uma foto, tal a formosura e docilidade da cena (ah, ah, ah!). 

Em virtude de nossa decisão de ir ao Circulo Polar Ártico, tínhamos pensado em abrir mão de uma região, Lillehammer e Hamar, no centro do país, mas nos escreveu a Cara Amiga, Aldina, que esteve a pouco na região, recomendando a região, assim, fizemos uma nova alteração no roteiro e deixamos Oslo em direção a Lillehammer, no centro do país na beira do Lago Mjosa, o maior da Noruega.

Paradas de descanso (as estradas aqui sempre têm, com banheiro, papel, água quente e sabonete) de frente para espelhos transformados em lagos, que refletiam os pinheiros que os circundavam e davam repouso a pequenos veleiros. Assim seguiu a estrada, um espelho de água aqui, outro ali e chegamos a Hama. Metade da cidade estava em obras, mas por onde conseguimos passar, só vimos casas de madeira cuidadas com todo esmero, macieiras carregadas (aqui dá mais maçã que chuchu na serra, ah, ah, ah!) e flores. Mas chovia cântaros e fazia 12 graus, não arriscamos descer para visitar o museu Hedmarksmusset, com mais de 50 edifícios e jardim aromático, vamos ficar imaginando o cheirinho.

Fomos seguindo em direção a Lillehammer, que sediou as Olimpiadas de Inverno de 1994, namorando o lago e as paradas  para piquenique, uma mais graciosa que a outra e com vistas espetaculares dos muitos lagos.  A cidade, que parece inspirou Liliput, das Viagens de Gúliver,parece interessante,  mas como era domingo, estava praticamente tudo fechado e quase ninguém na rua.

Deixamos o entorno do lago, e entramos em montanhas e florestas de pinheiros, salpicadas de lagos e de gorduchos carneirinhos dorminhocos, que, após alguma curva, encontrávamos cochilando no meio da estrada. Quando avistamos nossa primeira igreja de madeiras, perdida na estreita estrada, em meio a pinheiros, uma das muitas que povoam o país e são um de seus cartões postais. Mas não era uma daquelas 1000, que foram construídas pelos anos 1100 e 1300, e das quais só restam 28, chamadas Stavkirke, que são as que estamos caçando, ainda assim, era bem simpática, qualquer hora encontraremos as nossas.  

Na Noruega, aparentemente, não se encontra hotel por menos de 400 reais, por isso o país é lotado de campings e de cabanas. Paramos, na estrada, para ver o preço de uma delas, realmente é uma economia considerável, custa cerca de 150 reais, com beliches e cozinha, mas o banheiro é fora. Chovia muito e a temperatura andava por volta de 10 graus. Como bem sabe a Cara Amiga, mulheres menopausadas têm calores, levantam várias vezes durante à noite para beber água ou ir ao banheiro; a economia poderia ser boa, mas achei que o crime não compensaria, deixei para experimentá-las quando o tempo estiver um pouquinho melhor. Dizem até que existem umas cabanas que funcionam na base da confiança, o indivíduo encontra a chave na porta, usa, deixa tudo em ordem, o dinheiro numa caixinha e vai embora; vamos procurar ah, ah, ah!). 

Chegamos a Geilo, uma muito falada cidade, que era nosso destino para aquela noite. Uma grade furada porque ... vamos preparar nosso piquenique noturno, estamos famintos, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Eidfjord, 25 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

 O trajeto até aqui foi maravilhoso, mas a cidade foi uma roubada porque parecia uma cidade fantasma, é a principal e mais famosa estação de esqui do país, mas no verão e em um domingo chuvoso é um horror. Nos lembrou Las Leñas, a maioria dos hotéis fechados, assim como o comércio, e uns poucos loucos vagueando pela solidão. Não nos pareceu pitoresca no verão como ouvimos dizer.

Por sorte não encontramos nenhum “troll”, uns horríveis duendes escandinavos, que aparem à noite e transformam-se em pedra durante o dia. Há quem diga que eles são malvados e horrosos seres mitológicos, que raptam princesas para fins libidinosos (acho que não preciso ter medo, já passei da idade de correr esse risco e nem princesa sou, ah, ah, ah!). Outros dizem que eles são uns pobres feiosinhos, discriminados por todos, e que não são piores que qualquer ser humano (os tempos mudam, ah, ah, ah!). Vamos investigar! Quem sabe encontremos um para o Stut, nosso mascote de viagem, que coleciona bichinhos perdidos na rua por crianças descuidadas, recolhendo-os para que não vivam sujos e sofrendo, pisados por transeuntes.

De qualquer modo valeu porque na saída da cidade, encontramos um hotel muito simpático (www.ektegeilo.no), todo construído de madeira, a um estilo que parece chamar-se “laft”, que utiliza troncos empilhados, que, após assentarem-se, acabam fazendo com que as construções tenham um pé direito um pouco mais baixo. O hotel é muito agradável, assim como seus donos, muito limpo e cuidado, com cortinas xadrez, feitas do mesmo tecido das cúpulas dos abajures e arandelas. Um grande salão dividido em diversos ambientes menores, decorados com móveis de madeira robusta, estofados macios e mantas para afugentar o frio; para que famílias e amigos pudessem confraternizar. Nos sentamos em um deles para nosso piquenique; bem próximo um casal tomava chá; o pai lia historinhas para suas pequenas filhas, que riam copiosamente. Que pena que não entendíamos uma palavra!

No caminho para a cidade de Eidfjord, há cerca de 80km, passamos pelo Hardangervidda, um Parque Nacional,uma área de preservação ambiental, que nos lembrou a travessia dos Andes, encontramos até pedras empilhadas (Pacha Mama, oferendas à mãe terra, que vimos no norte da Argentina, parece que a teoria de Thor Heyerdahl, do Kon-Tiki) pois a vegetação torna-se rasteira, aparece um terreno pedregoso e surgem alguns restos de neve, os lagos continuam sendo uma tônica no caminho preservação. O sexto maior glaciar da Noruega fica no parque, o Hardangerjokulen. Tem a maior população de renas selvagens da Europa, não encontramos nenhuma. Mas encontramos casas, estilo iglu, feitas de pedras e cobertas de vegetação, bem interessantes.

É a região do maior e mais alto planaldo da Europa,  de 1100 a 1400m. Pelas indicações da estrada, deve nevar toneladas.  Vários rios de degelo nascem franzinos, correndo estreitos e tortuosos, até formar a Catarata Voringsfossen, de 180m de altura, e outros rios caudalosos da região. Túneis esculpidos em pedras maciças, gigantescos paredões de rocha. Apesar do frio de 8 graus, em certos momentos, o sol brilhou o caminho todo e pudemos desfrutar tudo e chegar ao Eidfjord (Eidfiord) o nosso primeiro fiorde, de água verde esmeralda e com cachoeiras que escorregam das altas montanhas, cheias de pinheiros, para alimentá-lo.

O país temuma área de cerca de 330.000 km² (um pouco menor que o estado de Goiás) e somente 5 milhões de habitantes, que se concentram na parte sul do país. Apesar de bem menor que o Brasil, tem uma extensão costeira de quase duas vezes e meia a nossa, 25.000 km de costa, um litoral muito peculiar por ser todo recortado pelos fiordes (fjordes), que são escavações feitas nas montanhas, há milhares e milhares de anos, pelo derretimento de geleiras na era glacial, que originaram fissuras, fendas, que foram preenchidas pela água do mar. São imensos paredões de rocha, cânions que se estreitam e alargam, preenchidos de água do mar, cujas cores vão do azul ao verde, de acordo com sua diluição em água doce, proveniente de chuva e de degelo; que chegam a avançar dezenas de quilômetros a dentro do país e com alturas que chegam a 1.500m e chegam a ter profundidades superiores a 400m. Algo meio parecido com as ria, que vimos na Espanha, mas em uma escala muito, muito superior. Eles são uma das maiores razões do turismo na Noruega.

Seguimos para Lofthus, justamente margeando o Eidfjorde e o Hardangerfjord, por uma estrada muito estreita, por onde mal passavam dois carros. De um lado fiorde, do outro pomares, plantações de frutas se sucediam. Em pequenos quiosques, idosas senhoras vendiam as frutas que colheram. Contam que o Hotel Ullensvag era um dos lugares favoritos de Edvard Greig, local onde ele se inspirou para compor suas imortais obras musicais e, até hoje, celebridades e famílias reais escandinavas visitam o hotel para apreciar a bela vista da Geleira Folgefonna, com seus 1600m sobre o fiorde Hardanger.

Por um complexo conjunto de túnel/ponte/túnel, que tem, inclusive, rotatória em seu interior, localizado entre Eidfjord e Lofthus, atravessamos o fiorde e as montanhas para seguir em direção a Bergen pela E 07, pela beira do Hardangerfjord, que tem 180 km de extensão e 500 metros de profundidade.

A quantidade de túneis e pontes que formam a intrigada rede viária do litoral da Noruega, para torná-lo transitável, é uma coisa assustadora. E há, ainda, todo um sistema de ferrys, que cruzam os fiordes, tornando a viagem mais prazerosa, mas não sabemos exatamente quão mais cara. Por isso não nos preocupamos em programar nenhum cruzeiro pelos fiordes, pois lemos que, viajando de carro, fatalmente, teríamos que realizar alguma travessia em um dos milhares de ferrys; assim que faríamos nosso cruzeiro.

Nosso destino final era Bergen, na costa. Não se preocupe, Caro Amigo, era simplesmente o destino final do dia, ainda temos muito que viajar (ah, ah, ah!). Onde pretendíamos chegar cedo, ainda, com tempo para, calmamente, escolher hotel; mas não foi bem o que aconteceu, pois é humanamente impossível não parar a cada minuto para apreciar melhor a paisagem e tirar uma foto. Chegamos no final da tarde, com a lista de alguns hotéis; embora seja a segunda maior cidade do país, não é assim tão grande e o trânsito estava tranqüilo. Imaginávamos que não teríamos muito dificuldade, o que não foi bem verdade, pois parece que todo o universo resolveu conhecer a Noruega em agosto, nunca mais viajaremos nesse mês, voltaremos ao nosso querido junho. E para completar, quando estamos em uma movimentada rua do centro, um doido pula, repentinamente, na frente do nosso carro, nosso coração parou, não atinávamos o que havia acontecido, se havíamos feito alguma “M” (com letra maiúscula), transgredido alguma lei, ou se o tal homem tivera um surto, quando voltamos a respirar e a raciocinar... encontramos uns espanhóis, vamos parar para trocar umas palavrinhas, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio 




Bergen, 27 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

O que aconteceu, pasme, foi que o retardado do homem coleciona placas de veículos. Então, o doido varrido pulou na frente de nosso carro por temos uma placa diferente, que é vermelha, o que não é comum na Europa, pois é um leasing. O amalucado começou a se sacudir, puxou sua máquina de fotografias e fotografou nossa placa, sempre gesticulando e se explicando. E não é que, no dia seguinte, vimos o talzinho fotografando placas no estacionamento de nosso hotel.  Não da vontade de atropelar um infeliz desses, e ainda dar ré para ter certeza que ele está bem mortinho (ah, ah, ah!).

Os hotéis mais econômicos estavam lotados, entenda-se por econômico algo em torno de 400 reais, uma verdadeira loucura. E foi isso que pagamos para ficar em uma Hostelling (www.hihostels.no), em uma das oito montanhas que rodeiam Bergen, há 5 km do centro. Pelo menos o quarto era para dois e tinha banheiro, tudo muito simples, sem TV e tínhamos que fazer a cama, com lençóis que pagamos o aluguel. Pagamos basicamente o mesmo preço do hotel de Oslo, porque Bergen é muito mais turística, é a entrada para os fiordes. Aqui também tem a revistinha com as informações da cidade e o cartão Bergen Pass, para entradas em museus e desconto em diversos lugares, mas, como em Oslo, achamos que não compensaria, até porque não tínhamos a indicação de nenhum museu que fosse excepcional.
Mas, afinal, gostamos muito, pois como continuamos fazendo economia de guerra (senão não tem viagem em dezembro ah, ah, ah!), a grande cozinha nos serviu para preparar o jantar, observar hábitos de outros povos (bisbilhotar, adoramos, ah, ah, ah!); e conhecer um monte de gente legal, como é o caso do casal Manoel, espanhol (?), e Elizabete, argentina (adoramos encontrar uma hermana, ah, ah, ah!); e de Ximena, chilena, que era voluntária no Hostelling, um programa de intercâmbio montado por um brasileiro. Além disso eles realizavam atividades para confraternização, café à tarde, caminhadas, visitas guiadas à cidade; tudo “free”, como todo mundo que estava lá precisava.

Agora vamos a Bergen (já fofocamos muito) a cidade que olha diretamente para o oceano, que trás correntes marítimas, que ajudam a amenizar as baixas temperaturas e de onde, anos atrás, pequenos barcos chegavam cheios de peixes  para transformar a cidade em um dos mais movimentados portos de pescado do mundo. Hoje, os barcos já não chegam de profusão, mas ainda existe o Mercado de Peixes, que se transformou em algo para turistas, cujos comerciantes fala até em português.

Logo ao lado está Bryggen, um conjunto de antigos armazéns, feitos em madeira encaixada, com tábuas sobrepostas, conhecido por Cais Alemão que foi declarado, pela UNESCO, Patrimônio da Humanidade. Em verdade elas não são originais, pois foram todas queimadas em um incêndio, em 1702, mas sua reconstrução foi exatamente aos moldes das casas originais.
Conhecemos a cidade em um tour guiado, gratuito, que o Hostelling organiza todas as terças. No final, tem até cafezinho com bolacha à beira mar. Não subimos de teleférico para olhar a vista da cidade, porque também já o fazíamos dos jardins do hotel. Se o Caro Amigo quiser se hospedar lá pode ir de ônibus, mas compre o bilhete antes, em máquinas ou até supermercados, pois direto com o motorista é bem mais caro (se é possível ser mais, pois já custa cerca de 15 reais só uma viagem), é só tomar o ônibus 12, para Montana, no em frente ao coreto, ou pérgula, uma das coisas mais graciosas que já vimos, com sua cúpula esverdeada, esguias colunas brancas encimadas por arcos ornamentados com rendilhados, de onde pendem vasos cheios de flores.

O Festplassem, Parque da Cidade, circunda um lago artificial, seu gramado verdinho convida a um descanso ou rápida parada para admirar suas flores amarelas. É, seguramente, uma das cidades mais simpáticas e fotogênicas que conhecemos. É uma cidade para descobrir a cada passo.

Se o Caro Amigo tiver apenas poucas horas na cidade, aconselhamos um passeio por Nordness, um bairro onde o tempo parou, que não foi destruído em bombardeios da 2ª Guerra e as ruas seguem muito estreitas, com casas de madeira colorida coladas umas as outras, jardineiras e vasos de flores espalhados pelo cenário.

Até tentamos visitar a Catedral, mas estava fechada. Assim como a nossa primeira Starvkirkje, toda em madeira, cheia de pequenas torres pontudas, como um pequeno castelo; de qualquer modo, pudemos apreciar a riqueza de detalhes de seu exterior,

Por aqui o pessoal parece não comer muito doce, no café da manhã as únicas coisas doces são iogurte e geléia. Mas eles comem um queijo muito estranho, pense o Caro Amigo em um doce de leite em barra, como um tijolo, escurinho, macio para cortar em fatias; agora tire praticamente todo o açúcar e ponha uma pitada de sal, pois é isso.  Indagamos a uma argentina (afinal eles são os reis do doce de leite), ela nos disse que amou, nós ainda estamos inseguros para opinar, continuaremos provando (ah, ah, ah!). O gravlax (salmão curado), já comemos de montão, é muito bom. Os smorbrods também já provamos de vários sabores, são deliciosos, mas um pouco complicados para comer, pois falta a fatia de pão da parte de cima do sanduíche (deve ser para economizar, já que aqui tudo é muito caro ah, ah, ah1!), justamente a que evita sujar as mãos e ajuda a apertar o recheio para morder. No café da manhã não faltam pepino e beterraba em conserva, além de variações de arenque em conserva, salmão e sardinha.

Beijos,

Sayo e Claudio



Fjaerland, 28 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

Deixamos Bergen pegando o caminho até Voss, pela E16, a cidade é uma estação de esqui, dedicada à prática de vários esportes, mas não era o que buscávamos, então seguimos adiante. Cruzamos com dezenas de ônibus de excursão, trailers e turistas em automóvel e moto, todos procurando o que a Noruega tem para dar e vender, natureza intocada, paisagens deslumbrantes de tirar o fôlego, calma e tranqüilidade. O custo é alto, mas vale muito à pena pagar. Por isso a população ama tanto a prática de esportes ao ar livre. Ainda seguindo a E16, chegamos ao Naeroyfjorden, (Vestnorsk fjordlandskap), Patrimônio da Humanidade, declarado pela Unesco, é o fiorde mais estreito país, passando pelo  Stalheim Canyon, que o ladeia. Fascinante!

Casas coloridas de madeira repousando em tapetes de grama verde. Paredões de pedra, montanhas com restinhos de neve e muitos pinheiros. Céu azul com algumas poucas nuvens brancas, outras sentadas entre as montanhas e pinheiros verdes. Espelhos d’água de transparentemente esverdeados ou azulados, lagos ou fiordes, onde toda paisagem está refletida. Corredeiras e cachoeiras espalhando seus véus brancos por longos e pedregosos caminhos. Campings com pequenos chalés de madeira para aluguel, localizados justamente nas mais lindas curvas dos pequenos riachos. Era a paisagem que encontrávamos a cada curva.  Sol agradável, beirando os vinte graus.

De Guddvangen seguimos em direção de Bakka, para acompanhar o Naeroyfjorden  um pouquinho mais e ver uma grande embarcação chegando, navegando solitário pelo fiorde, porque não havia qualquer outra embarcação em suas águas. Atravessamos dois túneis, mais de 15 km, e estávamos em Flam, de frente para dois enormes transatlânticos que fazem cruzeiros pelos fiordes, os mesmo que, no verão vão ao Brasil.
Estávamos um pouco preocupados quanto aos horários dos ferries, para os trechos que, obrigatoriamente teríamos que cruzar os fiordes neles. Por sorte, no Centro de Informações Turísticas de Flam, trabalha um brasileiro, que nos deu informações sobre os horários que, agora, no verão, são praticamente a cada hora. Também nos falou sobre a famosa viagem de trem entre Myrdal e Flam, disse que, para quem está de carro não acrescenta nada, é na verdade meio que uma daquelas furadas que criam fama e pelas quais os turistas acabam pagando.
Seguimos, então, para Laerdal, pelo Laerdalstunnelen, de 24,5km, que, em certos trechos tem uma iluminação azul, lembrando o fundo do mar e parece ainda ser o maior do mundo.  No final dele pegamos a E5, passamos por Laerdal e cruzamos o Naeroyfjord, em ferry, até Kaupanger, foi nosso primeiro passeio em águas de fiorde, para sermos bem sinceros: é lindo, mas de carro é mais bonito. O ferry é confortável como um barco, com cafeteria, mesas e poltronas confortáveis.
Encontramos outra Starvkirkje, perdemos duas no caminho, mas estava fechada, ainda não foi dessa vez que visitamos uma. Aliás, os horários das igrejas são um pouco estranhos, estão quase sempre fechadas, parece que eles aqui não têm muito a pedir a Deus, também, com tanta beleza, é melhor deixar Ele para os mais necessitados (ah, ah, ah!).
É bastante perceptível que um país tem uma densidade demográfica muito baixa, pois cruzamos, até aqui, exceto Bergen e Oslo, somente vilarejos e pequenos aglomerados de casas, nos quais, não se vê ninguém na rua, sequer em alguma janela, por vezes dá impressão de ser somente um cenário para um novo filme. Os cachorros não latem, as crianças não gritam; talvez, só talvez, os adolescentes tenham um pequeno, quase imperceptível traço rebelde. Tudo parece funcionar dentro da mais perfeita ordem.
E assim chegamos ao Sognefjord (Fiorde dos Sonhos), que figura como o maior do planeta, o Rei dos Fiordes, com seus 204 km de cumprimento e 1.308 metros de profundidade. E daí subimos, pela E5, para o Parque Nacional de Jostadelsbreen, onde está o maior glacial da Europa,  para, justamente, ver-lo.
Na verdade já era tarde, quase seis, e já não havia tantos hotéis e campings como no restante do trajeto. Perguntamos em dois, os chalés estavam lotados; os hotéis estavam pela hora da morte, algo em torno de 600 reais. O jeito era seguir, por falta de opção melhor. Já pensávamos em dormir em alguma parada de descanso, afinal tinham banheiro (com água quentinha), sabonete e papel. Um banho de toalhinha não faz mal a ninguém. Comida para piquenique tínhamos, assim como vinho e alguma cobertinha. O sol ia até as nove o país é seguríssimo, tudo sairia bem, não se preocupe o Caro Amigo, você está com a CRKtour (ah, ah, ah!).
Mas... chegamos ao glacial, parada para foto contamos depois.
Beijos,
Sayo e Claudio

Dalsnibba,  29 de agosto de 2014.
Caro Amigo,
Não foi essa vez que dormimos na rua, quando chegávamos a Fjaerland, que dizem ser a cidade dos livros, gente vem de longe para comprar e trocar livros antigos, avistamos a placa de camping. Meio desanimados fomos perguntar; o solícito senhor nos disse que não tinha cabanas, mas sim quartos, com banheiro e cozinha compartilhados, embora o preço houvesse caído muito, era algo em torno de 200 reais. Ele nos sugeriu que víssemos os quartos, pois eram muito pequenos. E realmente era, mas estavam em uma daquelas casinhas de madeira com gramado no telhado e o camping tinha fundos para o glacial e frente para um imóvel lago profundo, não perderíamos. Pagamos mais coisa de 70 reais pelos lençóis descartáveis e a toalhas forneciam.
Ao final foi muito divertido, já havia uma família hospedada, dois médicos com um casal de filhos pré-adolescentes. Depois de nos debulharmos em cumprimentos e conjeturas em inglês, descobrimos que eram espanhóis, de Sevilha. Então, entre reclamações quanto aos preços das coisas e elogios à beleza do local, dividimos nossas comidas, e bebidas,  e nos divertimos muito. A casinha tinha todo equipamento de coxinha, microondas, fogão, geladeira, panelas, pratos , copos, talheres etc. Uma banheiro era para os homens, outro para mulheres; o chuveiro era pago, era possível escolher banho de 5 (três minutos) ou de 10 coroas.
A primeira entrada, que tomamos, ao  Glacial Jostedalsbreen  foi Supphellebreen . No adiantado do verão, o glacial chorava e suas lágrimas se transformaram em uma cachoeira, que escorreu para algum rio, que chegou ao oceano; pouca coisa restou. Seguramente é mais interessante no inverno.
Na entrada seguinte, Boyabreen, da azulada língua de gelo, que escorre pela encosta da montanha até a beira de um lago, pouco restava; se desfazia em mais uma cachoeira, como tantas a sua volta. Temperatura: 9 graus. Sol e céu azulíssimo.
Atravessamos o túnel Fjareland, de 6km, para nos deparamos com mais uma das cinematográficas cenas de tirar o fôlego, com montanhas pedregosas, resquícios de neve, lago espelhado, gramado lisinho, pinheiros verde esmeralda e minúsculas casinhas coloridas. Como já estamos nos tronando repetitivos, sempre que falarmos em cena cinematográfica fica combinado que o Caro Amigo saberá que é a isso que estaremos nos referindo, pois é o que aqui se vê sempre, a cada palmo do caminho. Estávamos na região do Nordjfjord, trocamos a E5 pela E39. Depois, em Byrkjelo, tomamos a 60, para Stryn.
Está meio chatinho esse detalhamento de estradas, mas foi essa uma das nossas grandes dúvidas nessa viagem, que estrada tomar entre tantas maravilhosas, em muitos sites que pesquisamos as pessoas comentam os locais, mas não informam a estrada, o que dificulta muito localizar a informação ou escolher, em meio ao intrincado emaranhado de túneis, ferries e estradas que povoam a região, que caminho tomar. Pois apesar de nossa relação com Eva Maria ter se tornado, na medida do possível, algo bem cordial, seguimos adorando mapas e, principalmente, ter domínio e uma visão detalhada do que estamos fazendo, fornecendo a ela apenas trechos pequenos, para que não enverede pelo caminho que não queremos seguir.
Cruzamos uma região de montanha,  Briksdal, provavelmente, no inverno, há muita neve, mas agora somente resquícios. Logo baixamos e a estrada, muito estreita, beirando um dos braços do Nordjfjord; por vezes, é necessário parar e dar passagem ao carro que vem em direção contrária. Ainda margeando o braço, passamos por Loen, mais uma daquelas cidades de conto de fadas, de cenários cinematográficos. Agora atravessamos montanhas, pela 15, em direção a Geiranger. No alto das montanhas, após uma sucessão de túneis, voltamos a encontrar uma geografia parecida com a do cruzamento dos Andes, mas com pequenas cachoeiras, formadas de água de degelo, que acabam em lagoas. Tomamos a estrada 63 e uma placa indica mais um Patrimônio da Humanidade: Geirangerfjorden
Encontramos outros empilhamentos de pedra, mas agora já acreditamos que são “trolls”, apreciando a paisagem, pois como o sol brilha radiante, eles estão petrificados. Pensávamos em não levar nenhuma lembrança da Noruega, exceto as que trazemos em nosso coração, pois os preços são proibitivos, pensamos melhor e nos demos conta de que será muito barato levar alguns “trolls”, basta esperar que virem pedra, se der excesso de bagagem não há problema, no Brasil é baratinho (ah, ah, ah!).
Estamos na Estrada da Àguia, ou Dourada, e avistamos Dalsnibba, a mais alta vista de fiordes a partir de uma estrada (Toll Road), 1500m acima do mar, é acessada por um desvio à esquerda, paga-se cerca de 50 reais para subir pela pavimentada estrada que sai de frente de um azul lago. Sobe-se ao topo, bem juntinho a um branco tapete de neve, para, lá no fundo, ter a primeira visão do Geirangerfjorden.
Na descida até a cidade, Geiranger, mais umas paradas para apreciar o fiorde, que é Patrimônio da Humanidade, que tem forma de “S”. Chegamos cedo à cidade, maneira de dizer, ao pequeno vilarejo, a partir do qual faríamos o nosso mais longo passeio por um fiorde.
Bem sabemos que o Caro Amigo já deve estar preocupado, indagando: Que horas serão?  Onde dormirá essa noite? Para dizer a verdade, nós também, mas resolvemos relaxar, pois Deus proverá.
Beijos,
Sayo e Claudio

Geiranger, 28 de agosto de 2014.
Caro Amigo,
E Deus realmente proveu. E ficamos numa adorável casinha (www.marak.no), bem de frente para o fiorde Geirander e de sua janela, quando comíamos um quentinho (pois só andávamos a sanduíche e petiscos, economia de guerra ah, ah, ah!) Macarrão ao Pesto, que cozinhei, avistamos o transatlântico, todo iluminado, sumir lá no fundo do fiorde, deixando o mágico cenário na santa paz de Deus.
O preço não era lá muito barato (aqui só o marido da barata ah, ah, ah!), cerca de 300 reais, mas nos apaixonamos, pois além de ela ser lindinha e limpinha, ter uma linda vista para o fiorde, era graciosamente decorada, tinha equipamentos e louças de primeira, além de estar situada em um pomar de macieiras, todo gramado, que o dono cuidava como quem cuida de um bebe, com todo mimo. A tal casinha era realmente um doce, sala conjugada com cozinha, quarto de casal, quarto para as crianças e, sobre o banheiro, em uma espécie de mezanino, dois colchões de solteiro.
Como chegamos cedo e nos hospedamos com rapidez, tivemos a oportunidade de assistir um concerto de música folclórica, na igreja da cidade. Não havia muita gente, uma pena, pois era algo beneficente, e quem não foi perdeu a oportunidade de desfrutar uns momentos agradáveis, pois o interior da igreja valia a visita. O concerto, embora curto, foi bonito, teve piano, trompete (nos corrijam os mais conhecedores), órgão e um instrumento típico da Noruega, cujo nome não conseguimos entender, com som que lembra um berrante. E foi muito divertido ver o pastor, homenzarão loiro, todo tímido, explicando detalhes da igreja e das músicas.
Fizemos a travessia do fiorde Geiranger em ferry, um verdadeiro cruzeiro de mais de uma hora, pois, como já dissemos, eles são super confortáveis. O custo foi de aproximadamente 240 reais, o valor do carro inclui o motorista e foi cobrado mais uma pessoa. Durante a viagem eles dão informações sobre os pontos turísticos do percurso, que também são apresentadas em uma grande tela de teve. Há ferry a cada hora e meia, a partir das oito (www.fjord1.no). Tomamos o ferry das nove e meia, o frio era cruel, então fiquei (Sayo), sentadinha vendo tudo de dentro, enquanto o Kuc ia para lá e para cá, feito criança, como bem pode imaginar o Caro Amigo.
Passamos por um vilarejo que só tem acesso por uma estrada em forma de zig-zag. Cruzamos outros barcos em as calmas águas verdes esmeralda do fiorde, com o sol batendo no topo dos paredões de pedra, que as circundam, nos quais se observa rastros deixados pelas águas que escorreram no degelo, dos quais alguns ainda vertem água, em forma de cachoeiras, maiores ou menores. A mais famosa é a Sete Irmãs, há 1000m de altura. Avistamos  minúsculos produtores de maçã, que produzem toneladas, mesmo em condições tão adversas. Esta segunda experiência, navegando em um fiorde, foi bem mais interessante, mas, ainda assim, preferimos fazer o passeio de carro e parar, onde nos aprouver, para admirá-los.  
E, em uma hora e dez minutos, estávamos em Hellesylt, com grandes intenções de chegar, ainda hoje, em Alesund, se os duzentos milhões de fotos imprescindíveis, que o Kuc tira, deixarem. Tomamos a direção de Stranda, pela 60. Não quero desanimar o Caro Amigo, mas, no passo que vai, não sairemos da Noruega nos próximos trinta dias, assim é melhor ir esquecendo Suécia e Dinamarca, ficarão para outra ocasião (ah, ah, ah!).
Em Stranda, um novo ferry nos esperava, para Llabygda, exatamente quando chegamos, onze e trinta, mas o trajeto é curtíssimo, custo de cerca de 45 reais, dez minutos de percurso. Tomamos a 63, em direção Andalsnes, passando pelas passarelas de Gudbrandsjuvet, sobre o rio Valldola, que permitem caminhar sobre erosões subterrâneas, como corredeiras, com a água escavando seu caminho nas rochas.

Vagarosamente a estrada sobe às montanhas, volta à vegetação árida, chegamos à  Trollstigen (paredão de Troll), a maior parede vertical de toda a Europa, que chega à 1800m, estamos na Estrada dos Trolls. No meio do caminho há um conjunto de miradores, justamente antes da estrada começar a descer em zig-zag até a cidade de Andalsnes.

Daí partimos, pela 136 (E39), já passando das três da tarde, beirando o fiorde Romsdals, na tentativa de vencer os pouco mais de 100 km, que nos separavam de Alesund, ainda hoje. E chegamos, mesmo com algumas paradas, inclusive para conhecer uma grande rede de mercados, algo como o Atacadão, chamada Rema 1000, há preços pouca coisa melhores, principalmente nos produtos que têm o rótulo deles. O dinheiro norueguês chama-se Coroa Norueguesa, NOK para os mais íntimos.

Como chegamos antes das seis da tarde, passamos no centro de informações turísticas e conseguimos, em um camping (www.volsdalencamping.no) uma pequena quitinete, por cerca de 300 reais o dia, sem lençol  (já tínhamos o quase descartáveis, de TNT do outro hotel) e sem toalha (sempre trazemos algo para emergências). Os chalezinhos são mais legais, e baratos, pois estão de frente para o fiorde, junto com as barracas e trailers, porém o banheiros deles é fora, junto com os campistas. Ele fica há 2,5 km da cidade, é perto, e o dono gosta muito de brasileiros, nos deu um desconto de 20%.

Só nos restava dormir e sonhar com o que Alesund tem de melhor e que é um dos pratos prediletos do brasileiro, principalmente do santista, que, se o custo permitir (ah, ah, ah!), iremos provar amanhã. Só para constar, um café expresso custa 15 reais. Até amanhã!

Beijos,

Sayo e Claudio



Alesund, 31 de agosto de 2014.

Caro Amigo,

A cidade tem vários títulos como o de Capital do Bacalhau ou de Veneza Nórdica. O primeiro deve-se ao fato de viver da pesca, principalmente do bacalhau, são responsáveis por quase três quartos da exportação de bacalhau seco do mundo. Já o segundo, é por estar em um arquipélago, com quatorze (há divergências) ilhas, e possui canais, tudo interligado por pontes, túneis submarinos e ferry.

Mas, principalmente, falar de Alesund é falar de seu conjunto de casa construídas em estilo art nouveau, que lhe rendeu o título de Patrimônio da Humanidade, dado pela UNESCO. Contam que, em janeiro1904, um terrível incêndio destruiu 850 edifícios, deixando mais de dez mil pessoas sem casa; então, mestre e arquitetos de todo o país vieram e reconstruíram a cidade em somente três anos, dando a ela a mais harmoniosa arquitetura modernista do mundo.

Uma das coisas que nos chama a atenção, no país, é o pequeno número de habitantes, que torna os locais quase desertos. As casas parecem sempre vazias; lindas, limpas e arrumadas, mas sem moradores. Nas fazendas raramente se vê alguém trabalhando. As obras estão, quase sempre, paradas. Nos perguntamos: onde eles estão? Os noruegueses são discretos, silenciosos, até um pouco frios, mas muito educados e solícitos, basta verem a gente com mapa na mão, e cara de dúvida, para prontamente oferecerem ajuda, mesmo sem solicitação; são muito patriotas, é muito comum hastearem bandeiras nas casas. Aparentemente, não são muito religiosos, pois são poucas as igrejas e quase sempre estão fechadas. O que o país tem de melhor, que vem atraindo turistas do mundo todo, é a natureza quase intocada, Embelezada pelos fiordes.

Subimos de carro ao Monte Aksla, ao mirador Fjellstua, para ter uma visão da cidade e ilhas que a formam. É possível subir caminhando, mais de 400 degraus, ou com aqueles ônibus que fazem os pontos turísticos das cidades, com explicações em várias línguas, todas as cidades turísticas daqui têm.

Depois saímos a caminhar pela cidade, com uma paradinha na rua Apotekergata, para observar uma pequena praça e a arquitetura de seu entorno e os pequenos iates ancorados em seu porto, ao lado de barcos, que vendiam seu peixe (literalmente) e dividiam a atenção dos transeuntes.

Era sábado e a Kongens Gate estava cheia de gente todos vieram à feira gastronômica, o grande evento da cidade; que, além dos muitos quitutes (salmão, carne de baleia, doces, wafles, queijos, geléias, pães, arenque, sucos, sorvetes etc ) para comprar e provar, teve até desfile de bandas, aula de culinária e mágico.

No mais foi caminhar pelas ruas e observar a linda arquitetura das casas coloridas, em estilo art nouveau, principalmente as da Rua Apotetekergata.
Já no final da tarde, saímos para um passeio de carro nos arredores, queríamos conhecer os túneis submarinos, que chegam a 150m de profundidade. E foi como chegamos, a pouquíssimos minutos do centro, a paisagens que conjugavam fiorde e cenas rurais, com gramados verdes, pinheiros, vaquinhas pastando, enormes rolos de grama aparada, que alimentaria, no inverno, as vaquinhas e os cavalos, que por lá pastavam, ao lado das românticas casas de madeira, cada vez mais delicadamente cuidadas, enfeitadas e floridas.

O consumo de álcool não é incentivado, os mercados vendem cerveja de baixo teor alcoólico, as demais bebidas alcoólicas são vendidas em lojas do governo, com impostos altos, chamadas “vinmonopolet”, que fecham à noite e não abrem aos domingos. Nos pareceu que o hábito de comer em restaurantes também não é muito comum, não se vê um grande número deles, como em outros países, e os que existem são fechados nada daquelas adoráveis mesas ao ar livre (talvez o frio?); são mais comuns comidas tipo fast food, como kebab, pizza (a qualquer hora), massas e comida mexicana.. 
E não ficamos sem nosso bacalhau! Passamos no mercado e compramos ele fresco, que já vem em uma assadeira, é só temperar e colocar no forno; para acompanhar brócolis.  Não faltaram cerveja e vinho,  trouxemos da Alemanha (ah, ah, ah!).

E deixamos Alesund pela 136, até Andalsnes, onde tomamos a 64, direção Afames; a 660, direção Stuboen; a 62 e a 70, quando deixamos os fiordes por monótonas paisagens de montanhas e pinheiros; até  a E6, que nos levou a Trondheim e nos levaria a quilômetros e quilômetros de belezas e mistérios, já que os nossos plano original não incluía os dois próximos destinos, mas resolvemos mudá-lo, acrescentando, aos 4.000Km que já rodamos,  mais uns 4.000 somente para conhecê-los. Um deles é Tromso que, como já sabe o Caro Amigo, foi recomendação de Paul, nosso amigo da França; o outro, um destino paradisíaco, que Ártico e praia, nos foi recomendado pelo casal de médicos espanhóis, Silvia e Iñego, é o... estamos morrendo de fome, vamos parar par um piquenique, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



 Trondheim, 01 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Não é difícil fazer a mala para Noruega, não há necessidade de roupa formal, pois eles são muito descontraídos e adoram usar roupa para prática de esporte; dizem que elas estão entre os únicos produtos baratos no país, fizemos uma pesquisa e elas não são realmente muito caras. Lógico que algo, um pouquinho menos formal sempre tem que vir, vai que o Caro Amigo seja convidado a participar de algum evento (ah, ah, ah!). 
A cidade de Trondheim é uma graça, é pouco comentada, pois, acreditamos, como está mais afastada do eixo das excursões, o povo acaba não vindo até aqui. Uma pena! Nem parece Noruega, as ruas cheias de gente jovem (deve ser cidade universitária) passeando, conversando; um montão de restaurantes com mesinhas na rua. Uma cidade cheia de vida, rodeada pelo fiorde de mesmo nome e pelo rio .

Nossa intenção era só passar por ela para trocar dinheiro, pois nas cidades menores não se encontra onde fazê-lo. Em Alesund só era possível trocar no Centro e Informações Turísticas, mas a cotação era péssima e acreditamos que quanto mais ao norte, mais difícil ficará fazê-lo. É possível sacar dinheiro diretamente em caixas eletrônicos, no meio da rua, mas é uma prática que não nos agrada, pois no Brasil nunca se sabe quanto se pagará pela comodidade; estávamos na Argentina quando o dólar, de um dia para outro, dobrou de preço, imagine como foi pagar o dobro por tudo que se gastou, sem falar nos impostos. Também da para pagar tudo com cartão, até os parquímetros de estacionamento na rua. Como era domingo, a Forex, que fica dentro da estação ferroviária, estava fechada. Assim, de muito bom grado, acabamos ficando na cidade, num hotel da rede P, norueguesa.

Também é uma cidade de peregrinação, tem um caminho que parte do sul do país, Caminho de Santo Olav, com 643 Km, no mesmo estilo de Santiago de Compostela, na Espanha. Foi a primeira igreja católica apostólica romana que encontramos no país, as outras eram luteranas, Catedral Nidarosdomen, consagrada a Santo Olav, um rei morto em batalha em 1030, sobre qual túmulo foi construída, no ano de 1320, conjugando estilos normando, românico e gótico, sendo a maior construção medieval do país. Realmente ela é grandiosa, com seus 102m de comprimento e 50m de largura.   Sua fachada tem uma rosácea e, a seu lado, dezenas de estátuas, de santos, alinhas; ao longo do tempo sobre vários incêndios, logo se percebe, mas nem por isso perde sua beleza e imponência. Em seu interior estão guardadas as jóias da coroa norueguesa, inclusive as próprias coroas. Beirando às cinco da tarde, já não foi possível visitar seu interior, mas pudemos, junto com os demais turistas que enchiam a praça em frente à catedral, escutar o concerto do sino, que toca quase dez minutos, anunciando cinco horas.

A região do Bryggen, armazéns, está um show, não deve nada a de Bergen em graça, pois os armazéns estão restaurados,  muitos transformaram-se em apartamentos, e seus coloridos fortes dão mais vida ao rio que defronte deles.

As casas de madeira, encontradas as dezenas, por vezes, têm um arzinho de faroeste; outras vezes, cara de casa de boneca. A mais suntuosa delas, Stiftsgarden, tornou-se uma das residências reais e pode ser visitada. Mas a cidade também tem construções em vários outros estilos, não menos belos, que podem ser apreciados num passeio informal pelo centro.

Deixamos a cidade, passava um pouquinho das oito, após troca dinheiro. Nada tem vida até das dez da manhã, não sendo nada diferente no domingo. Assim, se o Caro Amigo quiser encarar a estrada cedo vai rodar quilômetros, subir e descer montanhas, sem ver viva alma, exceto próximo às cidades maiores. Policiais são coisa rara, mas dizem que eles observam tudo por câmeras, então é bom andar na linha. As estradas são boas, mais cansativas, pista única, duas mãos, com velocidade, em geral, de 70Km/h.
Dá para viajar acampando por todo país, pois a rede de campings é imensa. Quem vem de trailer nada de braçada. Também é possível encontrar muitas cabanas para alugar, os cartazes indicam “hytter”, ”ledgi”, “rom” ou algo assim. Ao que concluímos, das várias redes de hotel, as de melhor preço a PI (www.p-hotels.no) (ficamos em um é básico, mas legal, o café é deixado numa sacolinha) e a City (www.cityliving.no) (não ficamos, estão quase sempre cheios), mas nem pensar em achar algo por menos de trezentos reais.

Já íamos esquecendo de contar sobre o nosso segundo novo destino aqui na Noruega, o tal destino paradisíaco, é Lofoten, um arquipélago, que, nos disseram, tem paisagens de raríssima beleza, conjugando praia e ártico. E foi quando consultávamos os mapas, para decidir como deixaríamos o país, após conhecer Lofoten e Tromso, que nos deparamos com algo interessante, que ainda não nos havíamos dado conta, o Stut armou o maior beiço, disse que já sentia cheiro de Natal, bateu pé, chorou, fez a maior birra, disse que nem amarrado voltava para casa sem passar por lá. É ... parece que teremos que incluir mais uma visitinha ao nosso incumprível  roteiro; decidimos, de última hora, passar também na ... vamos ao supermercado, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio


Saltfjellt,  02 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Céu e pinheiro são, praticamente, só o que vimos depois que deixamos Trondhein; algum lago ou rio, que bordeávamos, com alguma ilhota no meio. Amargamos um pouco, como que seguindo fila de enterro, atrás de algum trator ou trailer; mas sobrevivemos. Subimos montanhas com estações de esqui e voltamos para beira dos fiordes, sempre acompanhados por paradas para descanso em locais com visual de tirar o fôlego, campings e pequenas cabanas de aluguel.

Foi na E6, um pouco à frente de Mo I Rana, dentro do Parque Nacional Saltfjellet, com  temperatura de 15 graus, que cruzamos o Círculo Polar Ártico, infelizmente o sol, que nos acompanhou até aqui, perdeu-se entre um montão de nuvens. Não encontramos, no Pólo, os ursos brancos, nem os icebergs, tão pouco as malévolas rainhas de gelo, coisas que povoam o inconsciente de quase toda coletividade humana, um lindo sonho romântico de alguma história infantil. Nem foi tão emocionante, pois o local não está sinalizado com toda a pompa que julgamos merecer, parece que para eles é algo que não tem tanta importância, mas para nós, que vivemos bem abaixo da linha do Equador, é um marco, uma viagem (ah, ah, ah!). Mas quem sabe encontremos alguma rena, ainda procuramos por elas e os cartazes indicam que elas realmente existem.

Dormimos em um hotel junto ao centro de informações do Parque Saltfjellt, ao lado de um posto de gasolina e um camping com chalés. O local é simples e os preços como de toda Noruega, mais de 400 reais, mas o ovo frito com bacon, servido no café da manhã, foi de babar, como todo o resto. Dizem que, quando não se tem fome, a goiaba tem bicho; por outro lado, quando se está economizando, ovo frito é banquete (ah, ah, ah!). 

Junto com a entrada no Círculo Polar Ártico, voltou o tempo nublado e frio, 13 graus, apesar de jamais ter feito um calor muito grande nessa viagem, a temperatura nunca passou de 22 graus; somente na tarde que passamos em  Trondhein consegui colocar um vestido com um casaquinho nas costas. E para piorar, a previsão do tempo indicava chuva e frio para os próximos dias. Nossa idéia era ir a Lofoten primeiro e depois Tromso, mas curtir praia com esse tempo seria um horror. E as maravilhosas fotos que o Kuc pretendia tirar? E como veríamos o Sol da Meia Noite e a Aurora Boreal? Decidimos, logo cedo, fazer uma troca de planos, seguir primeiro para Tromso e, depois, ir a Lofoten, quando já estivéssemos baixando, antes de  entrarmos na Suécia.

Outro fenômeno óptico muito famoso na Noruega, e outras regiões polares, é a Aurora Boreal, luzes coloridas que dançam no céu, que ocorre em virtude do contato de partículas de vento solar e poeira espacial com o campo magnético do planeta. Ela é mais comum nos meses de setembro e outubro (estamos com sorte, quem sabe?), março e abril. O fenômeno foi batizado por Galileu Galilei, em alusão a deusa do amanhecer, Aurora, e seu filho, Bóreas.  Tromso  e Lofoten são um ótimo lugar para caçá-la, dizem que basta pegar uma estradinha e se afastar das luzes da cidade. Mas com esse tempo tão nublado? É terrível chegar até aqui e voltar para casa de mão abanando!

Pegamos novamente a estrada, não tão cedo quanto pretendíamos, deixando as altas montanhas do parque e baixando para Saltfjorden. Tempo nubladíssimo, alguma chuva, mas ainda assim lindo.  Há trem fazendo todo esse roteiro, deve ser bem legal, pois segue junto à estrada e, por vezes, passa em locais até mais interessantes que ela, como a beirinha dos fiordes.

Na região próxima a Bodo, há uma grande quantidade te túneis, sendo pequena a distância entre eles e, ao sair-se de cada um dos escuros túneis, tem-se uma mais grata visão das enormes montanhas circundadas por fiorde, já que realçadas pelo contrate do olho acostumado com a penumbra. O outono, próximo, já tinge algumas folhas de amarelo e marrom. Na água, outro tom de azul começa a aparecer, mais claro, cor de piscina.

Em Bognes, mais um ferry, para Skarberget, agora da empresa Torgatten Nord (www.thn.no), cerca de sessenta reais, por trinta minutos de travessia. Mais um belo fiorde a atravessar, pena que chovia e estava tudo cinza, monocromático. Era, literalmente, um banho em todos os nossos planos, não tem nada pior para um viajante que chuva, acompanhada de frio então... ninguém merece. E, para piorar, o que já não está bom, a previsão dizia que, nos próximos três dias, pelo menos, nada de melhora; mais ou menos o tempo que ainda ficaríamos na Noruega. Bye bye Sol da Meia Noite. Bye Bye Aurora Boreal.

A menos de uma hora de Tromso, mudamos E8, parece que os altos picos estão mais próximos, com o resto de neve ao alcance da mão. A chuva parou um pouco. Com a proximidade da noite as águas do fiorde vão sumindo na penumbra da paisagem, as nuvens, estacionadas no topo das montanhas, chegavam a dar a impressão de que nevava.

Uma vez mais, descumprimos uma de nossas principais regras, chegamos a uma nova cidade quando já havia escurecido. Um problema para olhar mapas, placas e numeração de ruas; afinal, não temos 20 anos, nem 30 e nem 40 anos, os olhos já não são a mesma coisa (ah, ah, ah!). Por sorte, pelo menos tínhamos mapas e guias da cidade, que conseguimos em Alesund. Na estrada, havíamos analisado a lista hotéis, para tentar encontrar algo de preço razoável (ah, ah, ah!), próximo ao centro e com estacionamento, afinal, ainda acreditamos em Papai Noel.

E por falar nisso, é ele que decidimos visitar na Suécia, por muita insistência do Stut, que quer entregar sua cartinha, ao Papai Noel, pessoalmente. Por isso, incluímos a Lapônia no nosso roteiro. Mas voltemos à busca do hotel, pelo menos tínhamos a Eva Maria (GPS) e fé em Deus (que é Pai e não nos desampara nunca) e, assim, iniciamos nossa caça. No primeiro que paramos... vamos tomar café, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Tromso,  03  de setembro de 2014.

Caro Amigo,

No primeiro hotel que paramos, ficamos. A senhora que nos atendeu era amabilíssima, admirou-se muito de ver brasileiros no hotel, nos deu um desconto é até esboçou algumas palavras de consolo quanto ao fatídico jogo contra a Alemanha. O hotel era gracioso; tinha, pasme o Caro Amigo, café quentinho e cookies, como cortesia, à disposição dos hóspedes. E eu que estava babando por um naquela noite fria, pois para pagar quinze reais por uma minúscula xicarazinha precisa ter muito peito, principalmente porque sirvo um dos mais saborosos da cidade, de graça, para Deus e o mundo (se o Caro Amigo ainda não provou, passe lá em casa, será um prazer), já que sou do país onde ele é servido como sinal de hospitalidade  aos visitantes, tenho meus princípios (ah, ah,ah!).

Vamos combinar que não era tão baratinho não, chegava perto dos quinhentos reais, mas, por aqui, isso já virou pechincha, foi mais ou menos o que pagamos para ficar no albergue da juventude em  Bergen, com bem menos conforto e afastado do centro, e no hotel da estrada, na noite passada. E eu ainda poderia ficar negrinha de tanto tomar café (era a conversa da minha mãe para não dar café para criança, acho que herdei a criatividade dela, ou será a maluquice? Ah, ah, ah!) e me deliciar com as caras engraçadas da simpática senhora (ah, ah, ah!). Agora era só rezar para o tempo melhorar um bocadinho que fosse.

Chegar até aqui, em tão curto espaço de tempo foi puxado. Não pela quilometragem, que tiramos de letra, mas pelas condições climáticas e pela questão das dificuldades da estrada, que, embora bem pavimentadas, têm muitas subidas e descidas, curvas, limites de velocidade, radares, túneis, pontes, balsa e dificuldade de ultrapassagem, pois é de mão dubla, sem acostamento e não muito larga. É para ser percorrida vagarosamente, namorando paisagem, tirando mil fotos; o que não fizemos, pois a pressa em chegar e o clima não nos permitiram. O ideal é levar três dias para o percurso Trodehim/Tromso, cerca de 1200km. Fica a dica para o Caro Amigo.

Tromso é a Capital Mundial da Aurora Boreal, situa-se entre fiordes, no Mar do Norte. Já fomos ao fim do mundo, em Ushuaia, Argentina, agora estávamos na latitude 69, nosso ponto mais ao norte. O centro não é grande, tem as simpáticas casas de madeira, juntamente com edifícios de arquitetura sem muita definição, não é feio. Tem muitas lojas e supermercados, percebe-se que se trata de um local muito procurado pelos turistas. Há também vários restaurantes e, por incrível que pareça, o mais recomendado foi uma pizzaria, Pepe’s. Aparentemente, tudo funciona a mil de julho a agosto, verão, depois, os horários e algumas coisas fecham até o próximo verão.
Visitamos a Polaria, um aquário, que apresenta dois filmes interessantes, um sobre a Aurora Boreal e outro sobre a geografia, flora e fauna da região. Há túnel envidraçado, a partir do qual se vê as focas brincando e um pequeno show com  elas, 12:00 horas. A arquitetura do edifício simula blocos de gelo caindo.

Tentamos visitar a Catedral do Ártico, Ishavskatedralen, com arquitetura moderna, forma triangular, seu talhado simboliza a aurora boreal. Ela tem interessantes vitrais, mas vimos de longe, pois estava fechada.
Caminhamos pelo centro e encontramos a Catedral aberta, ela é pequena, não tem nada de muito especial. No Centro de Informações Turísticas, descobrimos que havia previsão para possível visualização da Aurora Boreal, por volta da meia noite, em dois pontos,  cerca 50km distantes da cidade;  sexta-feira seria o melhor dia, mas ainda era quarta, não ficaríamos, pois o tempo estava péssimo, chovia de balde e estava um gelo. Assim, tentaríamos essa noite.
Ainda tentamos dar um passeio de carro por  Kvaloya, uma furada com chuva. Existem outros museus, teleférico e shopping, mas acabamos voltando para o hotel, afinal ele era bem quentinho e tínhamos que adiantar as coisas para, às dez da noite, sairmos à caça da Aurora e de seu filho Boreas.

No horário previsto, vestimos tudo que tínhamos, e que conseguisse afastar o frio, como diz a Cara Amiga Rosana: estávamos como cebola. Ainda se via algum movimento na cidade, os retardatários, que ficaram tomando mais um traguinho. A estrada, deserta, só escuridão e escuridão. Nas proximidades de Breivikeidet, casas de madeira com os abajures, um dos tantos adornos colocados nas janelas, acessos, não que houvesse alguém acordado, parece ser um costume para que, mesmo à noite, se possa admirar a decoração. Fomos até o local de saída do ferry, 45km mais ou menos, só deserto. Parece que só estes dois malucos, resolveram sair para procurar a Aurora Boreal. Escolhemos um lugar bem escuro e estacionamos, onze horas. E parece que ia escurecendo cada vez mais e chovendo cada vez mais. Medo de ladrão? Não tínhamos, isso parece impossível na Noruega, era mais fácil sermos abduzidos por um ET.

Tentávamos fazer a hora passar, mas ela fazia questão de caminhar segundo por segundo, sem saltar nenhum milímetro. Mas medo de que alguém nos visse, nos achasse estranhos (imagine, ah, ah, ah!) e chamasse a polícia; a isso sim, nos preocupava. Mas lemos que por aqui ou pela Suécia, ou ambos, há leis que garantem o direito das pessoas caminharem por todos os locais, mesmo propriedades particulares, como um direito de ir e vir aperfeiçoado, desde que não causem prejuízos ou transgridam outras leis; por isso não há muros, nem portões. Mas o nosso grande medo mesmo é que aparecesse algum Troll malvado (ah, ah, ah!). E voltamos para o hotel, dois bocós, sem Aurora Boreal, sem Luzes do Norte, como chamam aqui.

Hoje começamos nossa volta, deixamos as frias terras da latitude 69. O sol parece que, até de propósito, resolveu brincar de esconde-esconde, aparecendo, lá e cá, entre uma nuvem e outro. Continuamos acompanhando as previsões do tempo e, tudo indica, amanhã teremos um dia de sol, em Lofoten, nossos desejos parecem que serão atendidos, quem sabe até a Aurorinha venha nos visitar esta noite, a esperaremos com uma taça de vinho e um jantar caprichado, em alguma casinha de pescador, em alguma minúscula aldeia, lá em Lofoten. Como é bom sonhar!

Beijos,

Sayo e Claudio



Fredvang,  (Lofoten) 04 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Partimos de Tromso com o tempo pouquinha coisa melhor, algumas frestas de céu azul apareciam entre as nuvens, até o sol arriscava-se. Pegamos a mesma E8 que nos trouxe à cidade, ao menos dessa vez podíamos, como era manhã, divisar o contrate das corres da paisagem, o outono chegando, os restos de neve que à distância, pareciam pequenos flocos.

Temos que confessar que, chegando ao fim de nosso passeio na Noruega, em coisa de dois ou três dias, sentimos uma pontinha de tristeza, pois adoramos o país, ele é lindíssimo e vale cada centavo de seu custo. E, devo confessar, para a Cara Amiga, que me compreenderá muito bem, que foi um aprendizado, saio do país sem ter comprado absolutamente nada, exceto um adesivo com o brasão (colecionamos dos países que visitamos) e alguma coisinha que nos faltou das provisões que trouxemos da Alemanha, basicamente pão; mas sobrevivi, sem nem sofrer tanto como imaginava que sofreria, pois sou uma compradora inveterada. De qualquer modo ainda preciso comprar uma xícara para minha coleção, o resto deixo para comprar na Alemanha, é bem mais barato (ah, ah, ah!).

Quanto àquele queijo marrom, muito típico do país, finalmente, depois de muito prová-lo, concluímos que, em verdade, é doce de leite, com quase nada de açúcar e uma pitada de sal. Outra coisa que eles comem muito por aqui é algo que apelidamos de “parede”, porque, em geral, tem o mesmo gosto, já conhecíamos algo similar no Brasil; não é bolacha, é algo que seria mais saudável, para natureba, com fibra e com gosto duvidoso, entre parede e algo pior, as daqui não são tão ruins, principalmente se encher de geléia, arenque, queijo etc (ah, ah, ah!).

Para economizar fica mais uma dica, um cachorro quente vendido em pequenas lojas, que vendem revistas, guloseimas e outras besteiras (parecidas com os “quiosquos” argentinos).  Ele não é pequeno, é feito na hora, com pão prensado, quentinho, e dá para cobrir de uma cebola crocante deliciosa, além de maionese, mostarda e catchup. O preço é 20 NOKs, pouco menos de dez reais. Se o Caro Amigo tomar um café da manhã legal e eles são bem servidos, mesmo nos hotéis mais baratos (baratos? Ah, ah, ah!), que foram os que ficamos, dá para comer um cachorro quente no almoço e só jantar, algo que comprou no mercado, pois é bem mais barato, embora ainda caro.

Nós mudamos nossa rotina de viagem, deixamos de jantar em restaurantes, se estamos em casas, cozinhamos algo; em hotéis, tomamos lanche. Temos aproveitado mais o dia, admirando as belezas naturais que o país tem para dar e vender. Por esse motivo temos chegado sempre tarde para procurar hotel. Essa nova rotina tem funcionado legal por aqui, pois as noites já estão bem frias e dá um pouco de preguiça sair, depois de um banho quentinho. Assim, tomamos nossos santos copinhos de vinho e cerveja, conversamos, comemos algo gostoso, mandamos nossa cartinha para o Caro Amigo e vamos dormir felizes da vida.

Lofoten é um arquipélago, formado pelas ilhas Austvagoy, Ginsoy, Vestvagoy, Flakstadoy, Moskenesoy, Vaeroy e Rosty que, hoje, encontram-se interligadas, exceto as duas últimas, por pontes e túneis, num total de  mais de 300km,  portanto podem ser percorridas de carro em coisa de quatro ou cinco horas, teoricamente, por que, em verdade, é possível ficar semanas, ou meses, desfrutando as belezas do local. Há ônibus ligando uma ponta à outra, entre Narvik e A, o percurso leva oito horas, ele faz várias paradas.

A medida que íamos para o sul, o tempo piorava terrivelmente. A chuva engrossava, o céu escureceu e uma neblina ia se apoderando de tudo. Ao menos aqui não tem comboio (ah, ah, ah!) Temperatura de onze graus. Atravessaríamos o arquipélago todo pela E 10, tomando a 185, no seu pequeno trecho, para beirar o mar, voltando à E10, pois decidimos seguir diretamente para “A”, cidade na última ilha interligada por rodovia, na esperança de que o tempo melhorasse um pouco no dia seguinte, para que pudéssemos aproveitar melhor as maravilhas de Lofoten.

Era o que pensávamos estar decidido, mas não foi o que aconteceu. Aproximadamente 25 km antes de “A”, na ponta do arquipélago, um túnel interrompido, homens trabalhando e uma pequena fila. Pensamos: coisa de dez minutos. Pois aqui tudo funciona com uma presteza incrível. Aí observamos um veículo, da obra, vir, em direção à fila, e para conversar com cada motorista. Já logo concluímos que o pior estava por vir. Já passava das sete e o loiro rapaz, quando se aproximou de nosso carro, informou-nos que a estrada estava interrompida e que talvez, frisou bem o “maybe”, conseguisse liberá-la por volta das dez.

Esperar por algo que podia nem acontecer, embaixo de um frio daqueles, com o vento começando a uivar e sem nem saber onde dormiríamos do outro lado? Nem a pau Juvenal (ah, ah, ah!). Demos a volta e fomos voltando em cima do rastro, procurando um lugar para dormir. Lugarzinhos encontramos muitos, mas com o número do telefone na porta e nos nem trazemos celular em viagem. Encontramos até um com um montão de bacalhau pendurado secando (ai que vontade, mas a da picanha é maior ah, ah, ah!). Resolvemos atravessar a fantástica ponte e chegar até Fredvang, um vilarejo um pouco maior.

Na primeira tentativa, um local cheio de gente, banheiro coletivo, não deu. Aí fomos atrás da placa de uma tal Mila. A mulher nos atendeu quase de pijamas, pois era sua casa,  e reclamando mais do frio que nós, perguntamos sobre quarto e ela nos mostrou ... está na hora do café, o dia nos aguarda, contamos depois.

Beijos

Sayo e Claudio



Lofoten, 05  de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Perguntamos sobre o quarto e ela nos mostrou uma agradável casinha, cheia de quadros de pintura em seda (lembramos das Caras Amigas Rosa e Fátima, fotografamos tudo) feitos por ela, enquanto já ia ligando o aquecedor, entregando a lenha para a lareira, mostrando a cozinha equipada e perguntando se tínhamos café. Não deu, nem dava para não ficar, pois o preço era pouco menos de trezentos reais, um dos menores que já pagamos aqui e a Casa da Mila deliciosa (bros@online.no). O tempo só permitia fantasma vagar pela rua, nada de procurar a Aurora, acho que vamos ter que voltar em outras férias, por enquanto sonharemos com a foto que alguém tirou (ah, ah, ah!).

Os lugares são como as pessoas, uns são horríveis, cheios de defeitos, não que não tenham nada de aproveitável, mas, simplesmente, são difíceis de conhecer; outros são insossos, passam pela vida sem sequer serem percebidos; outros, ainda, nasceram privilegiados, têm mais beleza e qualidades que todas as contas de um rosário. 

Lofoten está entre os últimos, conseguiu agregar às belezas da Noruega, que já enumeramos tantas vezes, que nos tornamos cansativos, mas preferimos ser redundantes a cometer o pecado da omissão. O arquipélago tem cordilheiras montanhas rochosas, com restos de neve; vegetação exuberante, pinheiros, por onde escorrem brancas cachoeiras, riscos de giz sobre o quadro verde, que deságuam em algum dos muitos fiordes ou formam um sem número de lagos, berços de pequenas ilhas; salpicando a paisagem, repousando em gramados, aparecem as casinhas de madeira, telhados pontudos, flores nos vasos, cortinas de renda nas janelas, que refletem suas cálidas imagens em espelhos imóveis de água, nos quais, vez por outra, desfila algum barquinho.  

Aí, no arquipélago, o mar também chegou, trazendo areia fininha, água azul cor de piscina, espuma branca e o vai e vem das ondas, para embalar todo o cenário, que já sente a proximidade do outono e seus tons amarelados. E chegaram também os pescadores de bacalhau com seus pequenos barcos, para alimentar os que, famintos, chegavam às ilhas, dando-lhes abrigo em suas pequenas casas vermelhas (rorbu/rorbuer).

Conseguimos a foto aérea, que está acima em um site.

A paisagem rural não deixou de comparecer, com gorduchas ovelhas, vacas bem marronzinhas e cabras, que garantem uma famosa produção de queijos e embutidos.

Lofoten é também um paraíso para os mais diversos esportes, surf, trekking, ciclismo ou simples caminhadas; sem falar em pesca, vela ou caiaque. Aves marinhas encontraram nessas ilhas um local seguro para fazerem seus ninhos e muito pescado para seu sustento.

O bacalhau seco daqui está entre um dos melhores do mundo, ele é pescado entre março e abril, ficando 4 meses secando, pendurados em armações de madeira. Por todo canto é possível ver armações de madeira usadas para secá-lo, os vilarejos até cheiram a bacalhau. Paramos numa charmosa delicatesse e cafeteria, arriscamos até comprar um pedacinho de bacalhau e uns snacks do bicho, uma delicia e bem mais saudável que batatinha frita.
Há pontes de todos os tamanhos e modelos, assim como túneis, cada um deles ligando uma coisa agradável à outra ainda melhor. O sol, infelizmente, não deu as caras, ele poderia ter transformado o lindo em maravilhoso, mesmo assim o lugar é um escândalo de bonito.
A partir de “A”, fomos vagarosamente voltando pela E10, entrando em pequenas estradas vicinais, para espiar algum minúsculo lugarejo. Não vimos muito movimento de turistas, moradores ou pescadores, talvez a época do ano, boa parte de negócios estavam fechados. E quando pensamos que já vimos tudo, encontramos três doidos viajando em uma bicicleta e dois skates, nada como ser jovem e destemido.

No final da tarde, o sol nos brindou um pequeno sorriso, as nuvens foram se dissipando um bocadinho, o azul do céu apareceu até mostrou algumas nuances, do mesmo modo como os contrates entre as cores da paisagem. Estávamos ainda nas proximidades de Leknes, a maior cidade, um pouco moderna demais para o cenário de Lofoten. Havia uma festa Country, metade da cidade estava de chapéu de cowboy, nada haver.

Decidimos que passearíamos por mais uma hora, iríamos até Unstad, uma praia de surfistas, e procuraríamos um lugar para dormir. Estávamos a coisa de 70km da casinha da noite passada, bateu até uma vontade de voltar para dormir lá, mas se tínhamos avançado tão pouco, voltar poderia nos atrasar mais ainda. Estávamos um pouco frustrados, não vimos o sol da meia noite, pois chegamos tarde à Europa, voltar sem ver a Aurora Boreal era frustrante, afinal era um de nossos propósitos, por isso encaramos o inverno no verão, inclusive foi um dos nomes cogitados para essa expedição.
Bem pertinho da praia encontramos chalés e quartos para alugar, mas nada haver com a gente, point de surfistas, já nos tínhamos deparado com um peladão na praia, vestindo sua roupa de neopreme (ou será noeprene? Não sabemos como escreve). Imagine o Caro Amigo o que rolava nos chalés, o lago positivo é que eles são todos louros, jovens,, bonitos e sarados (ah, ah, ah!).

Um pouco adiante, uma placa, “rorbu”, casinha vermelha de pescador para alugar. Era uma ótima pedida! O local parecia mesmo ser um local de pescador, uma casa grande (provavelmente a do dono), um armazém (para guardar coisas de pesca), píer com barcos (um veleiro bem legal)  e um edifício, de dois andares vermelho, a casa de pescador que estava para alugar, bem na beira do fiorde. O dono vinha justamente carregando umas madeiras, perguntamos e ele respondeu que tinha e que o custo era coisa de 350 reais. Pedimos para ver, suspeitamos, e ele nos mostrou o andar superior da casinha (casona!) vermelha (r.krong@live.no, não tem site).

Bem se via que esse pescador não era do Brasil, quisera eu ter uma casinha dessas em qualquer lugar do mundo. Ela era graciosa, dois quartos, sala, cozinha e banheiro. E para completar tinha máquina de lavar roupa e louça, TV de led, microondas que grelha, louça de primeira, freezer imenso (pensamos até em pescar, mas os peixes não chegam perto, pois o Kuc não consegue ficar mais de um minuto parado ah, ah, ah!) etc etc etc... E uma vista, que parecíamos estar em um barco navegando. Tratamos para uma noite e o dono, que estava apressado, disse que voltaria mais tarde para receber.

Casa arrumada, fomos cuidar do bacalhau para o jantar, já o estávamos dessalgando durante o dia (nosso pequeno kit de emergência sempre inclui uma tigela com tampa. Viu com serve, ah, ah, ah!). Vinho tínhamos, entrada de caviar branco e queijo Goda e Bacalhoada à Sayo, com o especialíssimo bacalhau de local, que é menos salgado e mais firme, substancioso. Quando o dono passou para receber, perguntamos sobre a Aurora Boreal, ele respondeu que seria praticamente impossível. Mesmo assim, não resistimos, resolvemos ficar duas noites, tirar um dia de féria em Lofoten não nos cairia mal, se não der para cumprir o roteiro original, certamente o Caro Amigo nos perdoará, afinal não é todo dia que se está em Lofoten (ah, ah, ah!), além do mais, a previsão era de sol para o dia seguinte.

E, pouco depois das onze da noite, quando aproveitávamos para escrever para o Caro Amigo, nosso senhorio bateu, muito afoito, no vidro do nosso quarto. Que teria acontecido, foi o que nos perguntamos? Adivinhe, Caro Amigo? Por essa nem nós esperávamos,  ele veio nos avisar que... vamos ao supermercado, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio  



Mervoll (Lofoten), 06 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Ele veio nos avisar que havia Aurora Boreal. Juramos! Saímos que nem doidos, enrolamos cobertores por cima do pijama e fomos curtir as Luzes Polares. Ela estava bem lá no alto do céu, não próximo à linha do horizonte, como vimos em muitas fotos. Parece que alguém foi percorrendo o céu, de um lado a outro, deixando um rastro de areia que escorre pela mão. A cada instante o rastro tinha um formato diferente. Às vezes, uma linha mais estreita, outras se alargava; então fazia uma curva, para voltar a se alongar.

Parecia brincar com a gente, quando nos virávamos para um lado, para olhá-la tão linda, ela fazia um desenho ainda mais interessante do outro lado. Nas fotos ela aparece esverdeada, não sabemos explicar o motivo, mas ela é esbranquiçada. Havíamos lido várias dicas sobre como fotografá-la, mas o que funcionou para a gente foi SCN (Cena noturna sem tripé) A nossa máquina é uma Cannon, Power Shot, SX50HS.

O ideal é vê-la de um lugar escuro, longe das luzes da cidade. Maervoll, onde estávamos, como alguns dos vilarejos de Lofoten,  não podem nem ser chamados de vilarejos, pois são ainda menores, por vezes não chegam a uma dúzia de casas; portanto não tínhamos tanta luz, somente umas poucas, do próprio local onde estávamos,  e outras de três ou quatro vizinhos, um pouco afastados, que ainda estavam acordados.

Ainda em Lofoten, no nosso dia de férias (ah, ah, ah!), um sábado, levantamos cedo, junto com o lindo sol e caímos na estrada, para conhecer todos os outros pontos de interesse do arquipélago que estavam marcados com uma florzinha em nosso mapa. Muitos deles são pontos de visualização de belas paisagens, outros são monumentos ou museus.

Não encontramos, na viagem, aquelas tais cabanas perdidas, cujo uso é feito na base da confiança, deixando o pagamento em uma caixa. Em Eggun, encontramos algo parecido, para visitar as ruínas de uma fortificação, construída, pelos alemães, na II Guerra, para colocação de um radar, e um monumento, com uma escultura, um rosto que aparece de modo diferente dos quatro ângulos que se olhe; para fazer a visitação. Há um cartaz que indica que a importância de 20NOKs deve ser colocada em uma caixa,  só na Noruega mesmo (ah, ah, ah!).

A estrada para Henningsvaer (816) é show, rodeia uma encosta rochosa, enquanto no mar aparecem dezenas de ilhotas que não passam de montes de pedras. Duas pontes levam ao pequeno vilarejo. Vale muito a visita, principalmente para observar os edifícios, em forma de elegantes palafitas, sobre o canal ladeado de barcos.

Svolvaer, a capital, é até charmosa, mas sábado, à tarde, estava morta, esperávamos um montão de turistas, alguma feira, mas nada. O que não é de se estranhar em termos de Noruega, parece que eles passam o fim de semana escondindinhos dentro de casa, fazendo tricô (eles amam) ou lendo, pois eles são um dos povos que mais lêem no mundo. O povo sumiu, mas as vaquinhas foram aproveitar a praia fria (ah, ah, ah!).

Quando já voltávamos para casa, encontramos uma tímida loirinha vendendo “maffins”, sob a supervisão de seu orgulhoso pai, que lhe traduzia o que falávamos. Parece que eles incentivam as crianças a lutarem por seus objetivos. Aproveitamos para comprar uns bolinhos para o café, que eu amo, como sabe o Caro Amigo, quiser me agradar é só convidar para o café com bolo.

À noite, após o jantar, que teve entrada de caviar branco e carne de baleia (não comi não, fiquei com pena, mas o Kuc não dispensou) e Penne com Mexilão, ficamos curtindo a casa até as onze.  Ui, já ia me esquecendo, tenho que contar esta para a Cara Amiga! Sabe qual é a nova do Kuc? A idéia de fazermos as viagens de bicicleta, por pequenos vilarejos, ele deixou para quando(?) estivermos (mais) velhinhos, escapei por sorte! Agora, o bonito me veio com a história de que gostou da nossa nova rotina de cozinhar nas viagens, usando produtos locais, inclusive como fazem muitos “chefs” famosos. É bem verdade que, modéstias à parte, sou uma boa cozinheira, como a Cara Amiga bem sabe, mas já imaginou eu passando minhas férias com a barriga no fogão e, depois, ainda lavando a louça. É!  Porque ele fala nossa nova rotina, mas quem arca com o ônus sou euzinha, enquanto o bonito fica lendo a cartinha para o Caro Amigo e selecionando as fotos. Dessa vez acho que ele viajou demais, deve ser algo na água, acho que não lhe caiu bem (ah, ah, ah!).

Mas como íamos contando, lá pelas onze, começamos a vigiar o céu, quem sabe! Havia mais nuvens e as casas estavam mais iluminadas. Mesmo assim a Aurora Boreal apareceu, embora tímida. E pudemos nos despedir, com chave de ouro, desse encantador país e da encantadora Lofoten.

Beijos,

Sayo e Claudio




Abisko (Suécia), 07 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

A Noruega vai deixar saudades. Oh país danado de tranqüilo. Cruzamos, pela última vez, boa parte da ilha, pois estávamos próximo a Unstad, como era cedo e o sol brilhava, apesar da névoa azulada que parecia envolver tudo, ainda pudemos desfrutar da magnífica paisagem por mais uns 200km, até encontrar, muito rapidamente, uma família de alces que cruzou a estrada, eram três, mas não deu tempo de fotografar. Fica para a próxima
Atravessamos para Suécia pela própria E10, por uma região de grandes altitudes e baixa temperatura, estação de esqui. Um lugar um pouco estranho, as árvores dão a impressão de terem sido queimadas, resta o caule e os galhos secos, a maioria não tem folhas, ação do frio, área muito rochosa, árida. Apesar disso, há muitas casas de madeira e muitos carros ao redor. Aparentemente, é local de casa de final de semana e prática de esportes. Um tanto inóspito para o nosso gosto, mas, em fim, gosto não se discute.

Na fronteira não há qualquer trâmite, passasse livremente. Assim chegamos à Suécia, em busca à Casa do Papai Noel e a de mais um dos Patrimônios da Humanidade, a Laponia. Paramos no vilarejo de Abisko, que dizem ser um dos melhores lugares para ver a Arurora Boreal, por ter um micro-clima único. O fato é que, no início de setembro, como é o caso, o local é horrível, quase tudo fechado, inclusive hotéis. Encontramos um hotel de nome bonito, Abisko Montain Lodge (www.abiskomountainlodge.se), mas em termos de custo benefício, o que pagamos mais por muito menos serviço prestado. Custou cerca de trezentos e cinqüenta reais, por um quarto que era um ovo, onde mal conseguimos entrar com as malas, sem TV, sem secador. Às oito da noite todo mundo vai embora e ponto.  Para completar, nada de Aurora, talvez só o seu perfume, ao longe, e um frio de cinco graus. Pode até ser que na alta temporada a coisa seja melhor, mas, pelas dúvidas, melhor que o Caro Amigo vá se encontrar com a Aurora em Lofoten, que ganha disparado em tudo preço, beleza e temperatura.   

A Laponia Sueca, (também há na Finlândia) Patrimônio da Humanidade, é uma região de florestas intocadas, onde vivem os Sami, indígenas europeus, que aqui vivem há mais de dez mil anos, muito antes que a Escandinávia estivesse dividida nas atuais fronteiras. Como a maioria dos povos indígenas do mundo, os samis sofreram extermínio generalizado, restando atualmente, na Suécia, cerca de vinte mil, que se dedica ao pastoreio de renas, alces, seguindo as manadas em busca de pasto.

Até Estocolmo, temos cerca de 1.200 km, temos dois mapas do país e algumas indicações, que recebemos no Centro de Informações Turísticas de Gotemburgo, de lugares interessantes que estão localizados do centro do país para o sul. Assim que nos restava decidir o que fazer na parte norte, pois quando planejamos a viagem não pensávamos chegar até aqui. Finalmente decidimos fazer um roteiro conhecendo os locais declarados Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, pois o país tem quinze.  Como deve se lembrar o Caro Amigo, já estivemos em um, antes de chegar a Noruega, as gravuras rupestre de Tanun. Para tanto, parte da viagem será pelo leste do país, junto ao Golfo de Botnia, Mar Báltico, e outra parte pelo centro.

A paisagem continua estranha, aquelas árvores com cara de queimadas e folhas amarelecidas, pedras e alguns riachos. Estrada boa, sem viva alma, se notamos a baixa densidade demográfica na Noruega, aqui, na Lapônia, a percebemos bem mais, quilômetros e quilômetros sem cruzar com um só carro. Nada de camping ou cabanas para alugar, teremos que ter mais atenção quanto ao local. Isso não tem cara de terra de Papai Noel, ele deve ter se mudado para Noruega e nem deixou o endereço (ah, h, ah!).

Passamos por Kiruna, uma cidade um pouco maior para trocar euro por coroa sueca (SEK), antes de seguir, pois nas cidades pequenas é mais difícil. Não há nada que justifique uma estada maior, então partimos para a vilarejo de Jukkasjarvi, menos de 20km.

O pequeno vilarejo abriga uma das grandes atrações do país. O Ice Hotel, Hotel de Gelo, com 65 quartos, o primeiro e maior do mundo, em cuja construção trabalham, anualmente,  sim porque ele é reconstruído todos os anos, em catorze semanas, utilizando mil  toneladas de gelo e quarenta artistas, que realizam esculturas em gelo.  Quando chegamos, já não havia a parte de gelo, mas sobra uma estrutura de hotel normal com cabanas, cuja diária é um tiquinho mais barata do que a que pagamos ontem.

Seguimos para Pajala, pela 395, quase na fronteira com a Finlândia, para conhecer o Arco Geodésico de Struves, Struves Meridianbage, Patrimônio da Humanidade.
Agora começamos a entender o que chamam de “depressão outonal”, muito comum aqui na Europa, quando a tristeza dos dias cinza muda o humor das pessoas. Hoje parece que tudo está feio e triste, não passa de 10º, o dia parece que nem amanheceu e já está escurecendo. Talvez saudades da Noruega, lá já estávamos super bem adaptados, compreendíamos as placas e cartazes, e, até, já admirávamos o modo de ser daquele povo pacato, discreto e amistoso, enfim, já nos sentíamos em casa.  Deve estar na hora de comer um chocolate.

Mas a melhor o Caro Amigo ainda não sabe, chegamos ao local do tal Struves Meridianbage, muito bem sinalizado por placas enormes, indicando ser Patrimônio da Humanidade. Ele ficava numa saída da estrada principal, um local super deserto, a própria estrada já o era! Chegamos a uma pequena clareira, com cartazes e um placa indicando um caminho de um quilômetro, que deveria ser percorrido à pé. Em verdade era uma picada,  entre pinheiros da floresta, seguramente era o caminho de João e Maria, estava na cara, notamos por suas pequenas pegadas, pelas casas de sapos (ou seriam cogumelos), pela profusão de cores que se derramava pelo chão, não eram flores, não, eram as próprias folhas que, inexplicavelmente, tinham colorido de flores, vermelhas, amarelas e brancas.

Iniciamos o lindo caminho e ele transformou-se em uma subida íngreme, enquanto a neblina baixava uma neblina e tudo tomava um ar tenebroso. Aí nos demos conta de que havíamos subido sem nossas bolsas, tudo havia ficado no carro, mas já percorrido mais da metade do caminho, não íamos voltar. E se roubassem o carro? Não tínhamos nenhum documento conosco. Não, não íamos voltar, afinal o país é seguro. Continuamos seguindo as sinalizações que indicavam Patrimônio da Humanidade, como João e Maria seguiam as pedrinhas do caminho.

Então chegamos ao Struves Meridianbage, que para sermos sinceros não tínhamos muita certeza do que seria, pois vimos somente uma foto que alguém postou na internet, que era a seguinte:

Esperávamos descobrir tudo sobre ele no local, que pensávamos seria um museu, ou algo parecido. E quando chegamos lá, pasme o Caro Amigo, encontramos ... temos que parar para fotografar umas renas do Papai Noel, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Lulea, 09 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

E quando chegamos lá, depois de tantas placas, encontramos o que o Caro Amigo pode ver na foto abaixo, que nem vou gastar palavreado para descrever.

Ao menos, a casa da bruxa estava destruída e demos muita risada, no caminho de volta, das besteiras que turista faz (ah, ah, ah!). É como sempre dizemos, não acredite em tudo que lê (ah, ah, ah!). E no caminho de volta, tivemos a sorte de encontrar algumas renas brancas (nem sabíamos que existia), comemos nosso chocolate e cruzamos de volta do Circulo Polar Ártico; foi quando tudo começou a melhorar.

E para não ficarmos com cara de bestas, pesquisamos e descobrimos que Georg Wilhelm Von Struve foi que demonstrou, pela primeira vez, que a terra é achatada nos pólos, através de uma série de vértices, repartidos em dez países da Europa, para medições geodésicas e triangulações. Elas foram realizadas em 265 pontos, entre o oceano Ártico e o Mar Negro. Então, o que fomos visitar foi um desses pontos, para dizer a verdade, descobrimos que, nessa mesma viagem passamos ao lado de vários desses pontos que, provavelmente, têm aquele lindo monumento, que mostramos inicialmente. Agora por que foram indicar como Patrimônio da Humanidade somente aquele raio-que-o-parta? Não temos a menor idéia, vai ver que foi para por emoção em nosso dia.

E fomos parar em Lulea para dormir, pois lá estava nosso próximo ponto de visitação Gammelstaden, no Golfo de Botnia. Aplicando o que havíamos aprendido na Noruega, ao nos aproximarmos da cidade, prestamos atenção nas placas de camping e cabanas. Dito e feito! Apareceram duas, no primeiro, a recepção fechava às cinco. Há que se ter cuidado ao viajar para a Escandinávia, parece que tudo funciona em junho, julho e agosto, no resto do ano a coisa é de rosca. Já no segundo, fomos muito bem atendidos por uma loirinha (redundante, aqui todas são ah, ah, ah!), eles tinham camping, cabanas e hotel. O local é bem agradável, com mini golf, sauna, cadeiras de massagem, além de chá, café e biscoitos de cortesia (nos apaixonamos por eles, ah, ah, ah!). O preço também estava bem legal, mas sempre considerando que a Suécia também não é muito barata. Ficamos no hotel (www.ornviken.se).
Chegamos a Lulea pela E4, estrada legal, mas o Caro Amigo pode esquecer aquelas paradas para descanso, com banheiro e água quentinha, o pipi é no matinho, porque quase não tem posto de gasolina e eles não costumam oferecer banheiro de cortesia, como no Brasil. A cidade é bem simpática, fica em um arquipélago, portanto há várias opções de passeios de barco, mas não foi atrás disso que viemos.

Na linda manhã de sol, fomos visitar a aldeia paroquial Gammelstaden, deixamos o caminho de João e Maria e fomos visitar as casinhas dos Anõezinhos e da Branca de Neve. Contam que, há muitos e muitos anos atrás, quando o Brasil nem tinha sido descoberto, lá pelo século XV, as pessoas, aqui na Suécia, eram obrigadas, por lei, a participar do culto, porém, a maioria, vivia no campo, em suas fazendas, e a lei dizia que os que morassem até 10km deveriam vir toda semana e os que morassem até 20km deveriam vir a cada duas semanas. Assim, muitos fazendeiros resolveram construir nos “Kyrkstads” (vilarejo da igreja), uma pequenina casa, ao redor da igreja, para dormirem, com suas famílias, pois, naquela época, um percurso de 20km levava horas e horas. Elas não tinham, em geral, mais que um cômodo, um pequeno hall de entrada, para conter o frio, e um minúsculo depósito de lenha; não possuíam banheiro.

E essa maravilha de conjunto de mais de quatrocentas casas de anõezinhos, a aldeia paroquial Gammelstaden, foi declarada, pela UNESCO, com justíssima razão, Patrimônio da Humanidade. A igreja, Mederluleakyrka, de pedra, tem uma beleza singular, sua nave é revestida por pintura mural, cujas cores tênues demonstram serem originais. Os púlpitos são sempre um show a parte, talvez porque seja deles que os protestantes fazem suas pregações, esse trazia os apóstolos, à volta de Jesus, entre colunas adornadas por cachos de uva, uma demonstração de abundância. No altar, um retábulo, com pinturas nas portas e corpo em madeira entalhada, para qual não se poupou ouro, alguns poucos detalhes coloridos, rostos, barbas, algum pequeno detalhe dos trajes, em tom azulado. Como somos sortudos, tinha alguém tocando o imponente órgão.

As pequenas casas, todas vermelhas com portas e janelas brancas, estão dispostas pela aldeia de forma irregular. Sua decoração, fica a critério do bom gosto do proprietário. Sim, porque elas são privadas, algumas ainda pertencem a fazendeiros, sendo usadas com a mesma finalidade inicial. Outras são usadas como casas de veraneio. Por ali encontramos o carteiro, fazendo entregas em um pequeno carro, com direção do lado direito, assim ele não precisava descer do veículo para entregar a correspondência, bastava parar em frente a caixinha e depositar nela as cartas.

Espiamos um montão, sim, porque a grande maioria é mantida com as janelas abertas, assim que se pode espiar pelo vidro. Se o dono não pretendia isso, deveria trancar a janela, mas muito pelo contrário, os malvados colocam cada enfeitinho, cada luminária, cada cortininha, cada vaso de flor, que nos sentimos tentados, como naqueles desenhos que o cheirinho gostoso vem, como uma fumacinha dançante, e vai carregando o pateta flutuando. Foi bem como nos sentimos. A princípio, tentamos até manter a compostura, espiando rapidamente.  Depois, como percebendo que não havia ninguém nas casas, pois o verão acabou e era dia de semana, perdemos o pudor e começamos a babar nas janelas.

E nada de criticar, pois bem sabemos que o Caro Amigo está doidinho para saber o que víamos.  Em geral, se vê o ... hora do jantar, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio




Örnsköldsvik , 10 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Em geral, se vê o tal cômodo, que não é grande e costuma ter uma cama de madeira, tipo armário (mandamos fotos em outras viagens), muito usada antigamente, ou tipo um grande sofá de  madeira. Há uma mesa, que costuma ser daquele modelo que tem abas que se levantam, aumentando-a para receber toda a família. Sempre há uma lareira, muitas são usadas como fogão também. Em quase nenhuma observamos uma cozinha, então acreditamos que a pia deve estar no pequeno hall que havia, já que hoje, com os novos sistemas de vedação de porta, ele deixou de ser tão importante. Também não vimos nenhum banheiro, imaginamos que esteja no pequeno depósito de lenha. E nem pensar em eletrodoméstico, não vimos não.

Agora quando às decorações, daria para escrever um tratado, desde o revestimento das paredes, fotos de família, quadros pintados ou bordados, por vezes com papel de parede; aos tecidos estampados que revestem os sofás, as almofadas das cadeiras ou cobre as mesas. Sem falar nas pequenas lembranças de família que estão sobre os móveis, porta retratos, bibelôs, prataria ou porcelana, finamente decorada. E quanto aos trabalhos de agulha, crochê que cobre as luminárias ou adorna a mesa sob um pequeno vaso de amor perfeito. Partimos com tristeza, pois ficaríamos até o dia que chegasse alguém e nos convidasse para um café com bolo, seria uma pequena visita ao paraíso.

Voltamos a estrada para mais uns bons quilômetros rumo ao sul, para dormir em nas proximidades do nosso próximo destino. A Costa Alta (Höga Kusten), uma região de ilhas rochosas e escarpados de granito, lugar de maior elevação tectônica de todo mundo, que foi declarada Patrimônio da Humanidade, pela UNESCO, justamente por suas pitorescas e únicas paisagens terrestres e marinhas, assim como seus maciços rochosos e falésias de granito vermelho de Nordigrä. 

Vínhamos na esperança de encontrar um daqueles agradáveis campings, com cabanas, para nem termos que entrar nas cidades maiores, assim curtiríamos mais a natureza. A Costa Alta estende-se de Örnsköldsvik (norte) a Härnösand (sul), cerca de 100km,  e mais ou menos a mesma  distância de leste para oeste, do mar, onde estão as ilhas, para o interior. Mas não foi bem o que aconteceu, pois os campings que passamos, muito bem estruturados, estavam fechados. Alguns hotéis estavam com a portaria fechada, plena seis da tarde, quem está hospedado tem chave, quem não está precisa ligar. Mais um hotel, Scandic, uma grande rede, estava lotado.

Aí fomos parar em um hotel/restaurante, para os lados da estrada e nem queira saber o Caro Amigo o que se passou. Já desconfiamos de cara, pois o rapaz não falava uma palavra em inglês (é impossível entre os suecos) e também não era loirinho. Ele veio gesticulando, mostrando uma tabela, multiplicando o valor por dois e apresentando um valor igual ao do hotel que ficamos em Abisko, um assalto à mão desarmada, e o lugar, aparentemente, era algo pior, bem pior, que o outro. Ele deve ter bem notado nossos olhos pularem da cara, pois foi rapidamente lá para dentro, falar com alguém, aí tivemos certeza que o fulano era “brima”. Logo volta o dito, com uma conversa de Ali Babá, já nos concedendo um desconto de 25%. Muito desconfiada, pedi para ver o quarto. Foi por Deus, porque o danado me mostrou um quarto que, seguramente era onde eles dormiam, eram três camas, com os lençóis tão amassados e puídos que, provavelmente, até Maomé deve ter dormido neles (ah, ah, ah!). Fui rapidinho para o rumo da escada, agradeci e sebo nas canelas, enquanto ele gesticulava indicando qualquer coisa, mas nem sob tortura dormiria lá. Pelo menos conseguimos pegar um mapa da cidade, na portaria, e demos muita risada da falante “brima”, que deve estar, até agora, procurando onde fomos parar (ah, ah, ah!).

No mapa de Örnsköldsvik, havia uma lista de hotéis da cidade e conseguimos um hotel legal (www.hotellfocus.se), para passarmos uma noite calma, sem sonhar com os quarenta ladrões (ah, ah, ah!). Pela manhã passeamos pela cidade, bem graciosa, que ainda mantinha, penduradas nas ruas do centro, as bandeiras dos participantes da Copa do Mundo. Muito simpático.   

Skuleberget foi nossa primeira parada, é à beira de um lago, um teleférico para subir até o monte rochoso, mas estava fechado. Parece que, como na Noruega, as coisas só funcionam por aqui entre junho e agosto, no verão, ou na alta temporada de inverso, lá por dezembro, quando esquiam. Deve ser por isso que tudo é tão caro, para custear os meses que eles não trabalham e fecham os enormes complexo turísticos, que devem ter custado uma fábula para serem construídos.

Dizem que uma das coisas que a Suécia tem de melhor é a qualidade de sua luz, que torna tudo mais bonito, não vamos dizer que não, pois o dia estava particularmente agradável, principalmente para percorrer as estradinhas que margeavam lagos, entre pinheiros verdes e céu azul. Vez por outra um vilarejo florido, como Nordingrä e Mjällom. As pequenas estradas seguem, como os dedos de uma mão, até o mar, que, apesar da proximidade, nem sempre é visto, pois fica escondido pelos altos pinheiros.

No meio de caminho encontramos a segunda maior ponte pêncil da Escandinávia, com o comprimento de 1867 metros, a Ponte Höga Kusten, sobre o Rio Angermanälven.

E ficamos passeando pela Costa Alta até chegar Härnösand, por volta das cinco, a cidade não é grande, mas é muito elegante, com pequenos palacetes e muitos vasos de flores pelas ruas. Fica à beira em uma espécie de ilha, portanto é cortada por canais e pontes.

Mas, infelizmente, também não encontramos aqueles hotéis românticos, em edifícios de madeira, com uma pequena cozinha para nos divertimos. Eles existiam, mas estavam lotados ou havia que ligar, pois, por incrível que pareça, aqui é comum não manter recepção aberta ou fechá-la às oito da noite, o hóspede fica com a chave do quarto e da porta de entrada do hotel.
Acabamos dormindo em um hotel que ficava em um restaurante, na entrada da cidade, na região do centro comercial. Era imitação de um antigo posto de gasolina, de alguma estrada americana. Foi o melhor preço que encontramos e o local era algo divertido, nos sentimos em “Grease, nos Tempos da Brilhantina”, tomando milkshake em uma lanchonete. O proprietário deve adorar cinema, então o hotel é decorado à Hollywood, com cartazes de filmes por todos os lados e cada quarto é dedicado a um ator, cujos pôsteres lotam suas paredes.

E foi em Härnösand que experimentamos nosso primeiro “Systembolaget” sueco e, como bem sabe o Caro Amigo, a primeira vez a gente nunca esquece, é algo um tanto estranho porque parece que ... mas tratamos de dormir cedo, pois levamos um dia para percorrer 100km, nesse passo só chegaremos ao Brasil em 2020 (ah, ah, ah!), contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio




Järvsö, 11 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Ir a um “systembolaget”, aqui na Suécia, é como ir a um Vinmonopolet (www.vinmonopolet.no), na Noruega, é o local onde se pode comprar bebida alcoólica, parece que a gente está cometendo alguma contravenção, que todo mundo está olhando para gente. Como parece que esta viagem versará sobre histórias e filmes, nos sentimos naqueles filmes de Al Capone, na época da lei seca, que a bebida era comprada às escondidas (ah, ah, ah!). Os systembolagets funcionam das 10:00 às 19:00, das 10:00 às 15:00 nos sábados, domingos e feriados não abre.

Compramos uma lata de um famoso petisco sueco, arenque fermentado que, contam, é pescado na primavera, no mar Báltico, quando é salgado e deixado para fermentar, sem nenhuma pressa, para só então ser enlatado, um mês antes de ir para a prateleira dos supermercados. Dizem, ainda, que ele continua fermentando dentro da lata, que seu cheiro é acre (deve ser um fedor danado) e que o gosto é forte, picante e ácido. É coisa para o Kuc, que é destemido, acho que vou passar, nem gosto muito de arenque, depois... imagine o bafo de foca que deve dar (ah, ah, ah!). O nome da coisa é “surströmming”.

Saímos cedo, na medida do possível, não sem antes passar no systembolaget, pois nosso vinho estava nas últimas, jantar em casa e com água ninguém merece! Nossa meta era encontrar o próximo Patrimônio da Humanidade, Hälsingegardarna, segundo nosso mapa, mas algo não conferia, pois tentamos encontrar no Google, e mesmo no site oficial do país, mas não obtivemos resposta, assim que fomos meio ressabiados, a coisa estava para lá de suspeita, lembramos de nossa primeira experiência, o Arco Geodésico (ah, ah, ah!). Mas vimos alguma menção quando visitamos Gammelstaden e onde há fumaça há fogo. Como não havia estrada de tijolos amarelos a seguir, seguimos a estrada de pinheiros verdes.

Deixamos o litoral e nos dirigimos para o centro do país. Num dado momento, lá pelas imediações do local indicado pelo mapa, uma área rural, entre fazendas, mas não no local exato, encontramos uma placa, onde estava escrito: Hälsingegardar. Não era exatamente o que procurávamos, nem havia placa da UNESCO, mas era uma placa marrom com uma florzinha, indicação de local de interesse turístico. Resolvemos segui-la... deu em nada! Alguns casarões vermelhos de madeira, janelas e portas brancas, num deles uma indicação de cafeteria, mas tudo fechado, pois o verão acabou e na Suécia, depois de 30 de agosto, tudo fecha.

Voltamos à estrada e continuamos em direção ao ponto indicado no mapa. Agora ainda mais desconfiados. Então, por encanto, no ponto indicado, apareceu a placa da UNESCO indicando uma fazenda, à entrada de Järvsö, uma minúscula cidade. Estava quase tudo fechado, alguns operários trabalhavam na reforma do teatro; jardineiros cuidavam das plantas, com primor, do lindo jardim.

A casa principal destoava da arquitetura local, descobrimos que o proprietário, diferentemente dos demais fazendeiros, havia contratado técnicos e arquitetos para sua construção, dando-lhe um estilo neoclássico, com influência urbana. Na fazenda, que foi transformada em um centro cultural, havia um centro de informações turísticas, que funcionava das 11:00 às 15:00, e nele encontramos explicações do que era exatamente o Patrimônio Humanidade. Desde o séculos XVI, fazendeiros costumavam decorar salas, com pinturas especiais em suas paredes, para festividades, como casamentos e batizados. Por vezes, uma única fazenda, chegava a ter quinze salas decoradas, que não eram usadas no dia a dia, mas sim em festividades.  A região de Hälsingland tem as maiores salas e mais delas que no resto do mundo. 

Todas que tentamos visitar estavam fechadas, mas no centro de informações, havia alguns prospectos e a montagem de parte de uma das casas, que nos possibilitaram visualizar como eram as casas. Se o Caro Amigo quiser conhecer tudo pessoalmente, não esqueça de ir de junho a agosto, porque depois, só dá para ver por fora.

E voltamos à estrada de pinheiros verdes, para procurar onde dormir, antes de nossa próxima aventura, quem sabe a Casa dos Três Ursinhos? “...Após comer o mingau, Cachinhos Dourados foi em direção à sala. Lá encontrou três cadeiras, como estava muito cansada, resolveu sentar-se. 
Achou a primeira cadeira muito grande
...”. Eles seguramente moram por aqui (ah, ah, ah!).

Beijos,

Sayo e Claudio




Falun, 12 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Não dormimos, infelizmente, na casa dos Três Ursinhos, mas encontramos um local bem legal. Como já estamos ressabiados com a história das portarias fecharem muito cedo, aparentemente todo mundo para de trabalhar lá pelas quatro, embora o inverno não tenha chegado, parece que eles já estão se adaptando; quando foi dando cinco horas já começamos a observar a placas de hotéis e foi assim que encontramos o Kungshaga Hotell (www.kungshaga.se), numa região rural, ao lado de uma fazenda de criação de gado e cavalos, bem à beira de um lago salpicado de ilhas desabitadas, ou melhor, habitadas por pinheiros. O hotel lembra aqueles pavilhões ou castelos de caça de que tanto se houve falar na Europa, um edifício imponente e sóbrio. Da janela do nosso quarto, uma vista do pôr do sol de fazer inveja a qualquer cidade praiana.

Como era cedo, fomos dar uma voltinha em Mora, uma das cidades que nos foi indicada em Gotemburgo, pelo rapaz da Informação Turística. Incrivelmente, o comércio estava aberto e a rua cheia de gente. A cidade é bem graciosa, florida e, como quase todas por aqui, fica a beira de um lago, o que a trona ainda mais simpática. Aqui viveu o mais ilustre pintor sueco Anders Zorn.

Observando o mapa da Suécia, assim como o da Noruega, observa-se que eles não têm qualquer problema quanto à água, pois rios e lagos estão espalhados por todos os lados, de modo assombroso, somente na região de Värmland, no interior do país, informam existirem mais de dez mil lagos.  Aliás, ela é ótima de sabor, enquanto na maioria da Europa ela é salobra, e eles divulgam que a água da torneira pode ser bebida sem nenhuma preocupação. Observamos que, enquanto na Noruega as paisagens são abertas, com grande amplitude visual, na Suécia, quase tudo é cercado por florestas de pinheiros, que tornam a visualização do horizonte reduzida, impossibilitando, inclusive, a percepção dos lagos e rios ao redor.

Estamos em uma região chamada Dalarna, que dizem ser a mais sueca de todas, por preservar os costumes, as tradições e o artesanato, que se pode admirar nos “dalahäst”, estátuas de um cavalinho colorido, e nos “tällberg”, trajes folclóricos. Sobre tudo no entorno do lago Siljan, onde está a cidade de Mora e a de Rättivk. É daqui a famosa corrida de esqui, Vasaloppet, com 90 km e 15.000 participantes ocorre entre Sälen e Mora. Nós, pessoalmente, adoramos a região, o litoral é uma maravilha, certamente, mas o interior do país nos cativou mais.
Contam também que a famosa cor vermelha, que cobre as paredes de metade cabanas e casas suecas, e se denomina “faluröd” ou vermelho Falun, justamente porque provem do  cobre produzido nas Minas de Falun, capital da Dalarna, o nosso próximo Patrimônio da Humanidade.   Dela saiu o cobre que se transformou no telhado da maioria das igrejas e castelos da Europa. A mina teve enorme influência no desenvolvimento técnico, econômico, social e político da Suécia. Em 1992, ela  foi desativada, mas segue a fabricação da tinta vermelha característica das casas suecas, com os restos da mina. O Kuc, mais destemido, foi encarar o frio de cinco graus, lá no fundo da mina, eu preferi ficar pelo museu, dez graus já me bastavam.

Passando por Hedemora, um pequeno vilarejo, parece que estamos meio redundantes nessa viagem, todos os locais são lindos, os vilarejos são pequenos, os jardins são floridos, as casas de madeira são graciosas, as macieiras carregadas etc, tudo é realmente assim por aqui, nós é que precisamos incrementar nosso vocabulário, para contar de modo diferente, vamos procurar um dicionário de adjetivos, se é que existe (ah, ah, ah!). Mas voltando a Hedemora, quando passamos pela cidade, perto das três da tarde, vimos uma feira. Uma novidade nesta viagem, pois, como bem notou o Caro Amigo, ainda não havíamos encontrado nenhuma, tudo aqui é meio diferente quanto a costumes e horários, ao menos depois do verão (?). Paramos, lógico,  ela não era grande (trocamos o pequena ah, ah, ah!) e artesãos, produtores rurais e caseiros vendiam suas mercadorias. Havia um cantor, de música country, algumas mesinhas, onde o pessoal tomava um lanchinho e batia papo.

Até nós batemos papo, pois um dos senhores veio conversar com a gente, ficou curioso quanto ao fato de turistas brasileiros estarem por lá. Mas o melhor da feira foi um bolo de maçã que compramos, daqueles que mais amo, feitos especialmente para tomar com uma xícara do bom café lá de casa (pena que não vai durar até lá), ele é fofinho, tem fatias de maça e um perfume, de alguma erva que não conseguimos identificar, que vai ficar na nossa lembrança por muito tempo. Que bom que temos o capuccino, que fizemos no Brasil, para tomar com ele quando chegarmos no próximo hotel! A gente nem precisa de tanta coisa para ser feliz, não é Caro Amigo?

De Dalarna passamos para  Engelsbergs Bruk, nosso próximo Patrimônio da Humanidade, um conjunto bem preservado de edifícios industriais, dos séculos XVIII e XIX,  onde se produzia aço de alta qualidade. Chegamos lá só para fotografar por fora, estava fechado, antes das quatro horas. Havia um cartaz que indicava visita guiada às onze. Fazer o que? Seguir.

Já estávamos perto de Estocolmo, pouco menos de 200 km, mas chegar à noite, não seria uma boa opção, então resolvemos dormir em uma das cidades que estava no nosso roteiro original Uppsala, assim seguiríamos para a capital pela manhã, com tempo para achar o Centro de Informações Turísticas aberto e encontrar um lugar legal para ficar, pois, provavelmente ficaríamos umas três noites. Chegamos justamente no horário que o pessoal estava saindo do trabalho, era bicicleta para todo lado. Meio minuto antes das seis e ainda fomos atendidos com sorrisos no Centro de Informações Turísticas, recebemos mapas e informações sobre hotéis e sobre a Noite Cultural, que ocorreria no sábado. E saímos a caça de mais um hotel, o que não foi tão fácil, porque ... vamos parar para um lanchinho em um comício político (descobrimos outro jeito de economizar,  ah, ah, ah!), contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Uppsala, 13 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Não foi tão fácil encontrar hotel porque estávamos na quarta maior cidade do país, uma cidade universitária, às vésperas de uma virada cultural, o que tornava os hotéis centrais caros e com problemas de estacionamento.

Acabamos dormindo no Scandic (www.scandichotels.com), uma grade rede da Escandinávia, com hotéis, geralmente, caros, quatro estrelas, porém o que ficamos estava há 2,5 Km do centro e tinha um preço bem legal. Eles oferecem algo similar ao Ibis, aí do Brasil, mas com maior qualidade, pois o quarto é espaçoso, tem secador de cabelo,  ferro de passar (não quero nem imaginar para que, ah, ah, ah!) e espelho de aumento no banheiro. O café da manhã também é nota 10, tem até feijão (deve vir do gosto dos suecos pela comida mexicana).

Na melancólica manhã de sábado, o dia parecia não querer despertar. No verde escuro rio, marrecos faziam círculos, mergulhando em busca de algum alimento. Escuras grades de ferro, encimadas por pinhas, seguiam todo curso sinuoso do rio e, ao lado delas, um sem fim de bicicletas, de todas as cores, marcas e modelos, nem elas queriam andar naquela preguiçosa manhã. Sobre o rio, pontes singulares, cada uma com sua beleza, assim como diferente era a embarcação, que nele flutuava, um caixote embalado pelo som da sanfona. Apesar disso, a florida cidade preparava-se para o dia de festa. 

Adoramos a cidade, nem pense, Caro Amigo, em ir a Estocolmo sem dar uma passadinha, ainda que rápida, em Uppsala e visitar a catedral, Domkyrka, a maior e mais alta igreja da Escandinávia, com seus tijolos cor de terra, túmulos de reis e maravilhar-se com todo o charme da cidade.

Partimos para Estocolmo perto da hora do almoço e levamos cerca de uma hora para chegar. Nossa idéia era aproveitar a tarde de sábado e o trânsito tranqüilo. Assim poderíamos passar no Centro de Informações Turísticas e, calmamente, escolher um hotel. Ledo engano! O Trânsito estava um caos, milhões de carros nas ruas, um montão de obras bloqueando túneis e pontes, que interligam as ilhas, e, para completar, havia uma corrida, uma maratona,  interrompendo o trânsito em boa parte do centro. E, como desgraça pouco é bobagem, era véspera de eleição.

A moça das informações turísticas já sofria da síndrome que acomete os moradores das grandes cidades turísticas, portanto queria que os turistas se explodissem. Assim, não foi muito útil na localização de um hotel legal; as sugestões dela deram em nada. No final saímos olhando uma lista que tínhamos conseguido no Tripadvisor, o grande problema é que, como compramos a Eva Maria de última hora, não sabemos manejá-la muito bem, não sabemos colocar vários endereços para ela ordená-los e depois seguirmos. Resumo da história, íamos endereço por endereço, tendo que enfrentar todo aquele trânsito e, por vezes, cruzar pela terceira vez o mesmo túnel.

Não que a cidade não tenha muitos hotéis, o problema é que são muito caros; os mais baratos nem sempre têm banheiro privado e, muitos deles, não tinham vaga para o sábado. A noite já se aproximava, eu já pensava em voltar para dormir em Uppsala e vir todos os dias a Estocolmo, pois lá o hotel estava com um excelente preço, a economia pagaria as despesas da viagem. Então pensamos tentaremos o último e desistiremos, iremos para fora do centro ou para outra cidade.

Fomos a caça de um tal Reimersholme Hotel, voltamos a um túnel que já havíamos cruzado “n” vezes, o mais congestionado da cidade, já não era um bom sinal. Quase lá perto duas entradas interditadas pela corrida. Eva Maria estava quase louca, só repetindo desvio de rota, recalcular a rota. No segundo bloqueio, há 1 km do hotel, um dos senhores nos deu um mapa da corrida e explicou como chegarmos a Reimers-Holme, que é uma das menores ilhas do arquipélago, onde se situa a cidade de Estocolmo, o hotel ficava nela.

Primeira batalha vencida, chegamos lá. A ilhota é uma graça, cheia de barcos ancorados e muito verde. O hotel também nos pareceu simpático, ficava logo após o arco de entrada na ilha, tinha um pátio com mesinhas e guarda-sóis, vasos com gerânios vermelhos. Tudo que precisávamos! Era hora de resolver o mais importante, encontrar um quarto para dormir... a menina da recepção era morena, tinha o cabelo bem pretinho e até uma aparência meio árabe, era muito simpática e prestativa. Ela olhava que olhava a tela do computador com cara de preocupação, precisávamos de três noites em um quarto com banheiro, aí ela nos disse que, infelizmente ... estamos muito atrasados, temos que ir ao mercado, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Estocolmo/ Djurgärden, 14 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Ela nos disse que, infelizmente, para aquela noite, só poderia nos oferecer um quarto com banheiro compartilhado e, no dia seguinte, poderíamos mudar para um com banheiro privado. Aceitamos! Não tínhamos mais forças e a localização era excelente, afinal, seria só por uma noite. O hotel (www.reimersholmehotel.se) ocupa dois edifícios distintos, não é lá aquelas coisas, lembra um albergue, tem um monte de estrangeiros, principalmente turcos, inclusive famílias, que moraram nele, aparentemente por motivo de trabalho. O edifício onde fica a recepção parece ser o melhor em termos de hotel, no outro há mais moradores, foi lá que ficamos. É um hotel meio surreal, lembra uma pensão. Enfim, é ficável, mas meio confuso; doido de carteirinha só tinha mesmo um polonês, que punha bilhetes no armário da cozinha para que não mexessem nas coisas dele; ele babava, mas não mordia, então nos divertimos, com a cara dele e, principalmente, espiando os quitutes que nossa vizinha, aparentemente turca, cozinhava para sua família, uns panelões enormes, fervilhantes e cheirosos (ah, ah, ah!).  E, apesar de tudo, ainda conseguimos fazer nosso piquenique nas mesas do pátio, sob um guarda-sol, apreciando as belezas da pequena ilha.

Quando pensarmos em Estocolmo, em nossas mentes sempre estarão os lindos edifícios de tijolo marrom e os vários formatos das suas tantas torres, em contrates com seus telhados azinhavrados pela oxidação do metal que os reveste, puro verde, nos quais, vez por outra, brilha o dourado do polimento. Tudo estampado no céu azul. E ainda tem o mar, que vai entrando ao redor das ilhas, e trazendo várias embarcações, que ficam ancoradas, observando a cidade e completando a beleza do cenário.

Tudo que ouvimos ou lemos, não chegou nem perto de dar à cidade o lugar de destaque que ela merece, ela é linda de morrer e de matar. Nem a confusão do trânsito, as dezenas de placas ou os tapumes de desvio conseguiram se quer ofuscar o brilho da pérola que se espalha em catorze ilhas sobre o Báltico, no Arquipélago de Estocolmo. Ela é suntuosa, elegante, fotogênica, parece um encontro de castelos  de contos de fadas. Ela mantém o glamour que a maioria das capitais européias tinham e perderam. Ela não é nenhuma mocinha, foi fundada em 1252 e sua localização, espalhada entre catorze ilhas, reudeu-lhe os títulos de Rainha das Águas e Veneza do Norte.

Refeitos da chegada, resolvemos aproveitar o domingo, com menos engarrafamento, em verdade a cidade não tem trânsito, parece que aquele sábado foi algo atípico. Então, resolvemos aproveitar o domingo para conhecer as coisas mais afastadas. Assim fomos à ilha Djurgärden, no coração da cidade, que já foi campo de caça de reis e, hoje,  abriga um grande parque, vários canais e vários dos melhores museus, além de fornecer belos ângulos para fotos da linda  Estocolmo.

Nossa primeira parada foi o Museu Vasa, um dos mais famosos da cidade, pois abriga um luxuoso galeão de guerra, que seria o maior da frota sueca e afundou em sua primeira viagem, em 1628, ficando no fundo do mar por trezentos anos, até ser  resgatado e recuperado. Foram cinco anos de trabalho para retirá-lo das águas e sua recuperação segue até hoje, embora, visto no museu, ele pareça perfeito. O Vasa é um verdadeiro tesouro artístico, pois possui mais de 700 esculturas entalhadas. No museu, é apresentado um filme contando toda a história do galeão; há sessões em várias línguas, demos sorte de chegar na hora que começava uma em espanhol com legenda em inglês. Contam que ele afundou porque tinha pouco lastro para seu peso e tamanho.

Quanto aos ingressos dos museus, tudo aqui é caro, nada costuma custar menos de 50 reais. O transporte também está pela hora da morte, por volta de 11 reais. A hora do estacionamento, cerca de 15 reais. Há aqueles cartões que são comprados e dão direito a transporte público gratuito (ônibus, metrô e balsa) e entradas em museus; mas é bom prestar atenção, pois não é aceito em todas as atrações e o de 24 horas não dá tempo para conhecer muita coisa, seria preferível o de 48 ou 72 horas. As revistinhas sobre a cidade, fornecidas nos Centros de Informações Turísticas e hotéis, onde os tais cartões também são vendidos, informam os preços das atrações, o ideal é analisar o que realmente vale à pena e fazer a conta. O centro pode ser feito todo caminhando em um mesmo dia, com dois bilhetes de metrô, ida e volta para o hotel. Há ainda a opção daqueles ônibus vermelhos que fazem os pontos turísticos e se pode subir e descer.
 
Ainda na ilha Djurgärden, fomos ao Skansen, um museu a céu aberto, dizem que é algo para crianças, mais observamos que os adultos se divertem tanto quanto. Ele foi fundado em 1891, tem mais de 150 construções, casas, fazendas e negócios, mostrando exemplares de diversas regiões do país, de onde foram trazidas. Muitas são abertas à visitação e, no seu interior, se pode observar mobília e louça originais, além de pessoas nas atividades cotidianas, que vão explicando, ao público, como as coisas eram feitas antigamente. O parque representa, de forma lúdica, cinco séculos da história sueca. Tem ainda um pequeno zoológico, com animais do norte do país. É bem legal para levar um piquenique e ficar o dia todo, mas turista não pode se dar a esse luxo (ah, ah, ah!), pelo menos umas três horas é bom reservar.

Demos uma voltinha pela cidade, nas proximidades da Teatro Dramático e resolvemos ir até Tantoluden, que fica em Södermalm, uma ilha vizinha à nossa. Já comentamos com o Caro Amigo, em outras viagens, sobre umas pequenas casas, localizadas nas periferias em meios a jardins, que parecem uns pequenos loteamentos. As vimos na Espanha e na Alemanha, mas não sabíamos exatamente como era o funcionamento da coisa. Contam que os loteamentos de jardim surgiram para que os trabalhadores urbanos, que não tinham uma casa de campo, pudessem desfrutar de uma vida campestre, o de Estocolmo data de 1919 e tem 115 lotes. São pequenos lotes, imaginamos que 10x5m aproximadamente, arrendados para população, para que neles façam jardins e pomares. Cada proprietário decide como fazê-lo e se quer construir algo. A imensa maioria tem uma pequena casa, quase uma casinha de boneca, e, em seus pequenos quintais, são espalhados mimos, comedores para passarinhos, cata-ventos ou estatuazinhas, e plantadas árvores frutíferas e flores de tudo quanto é cor e tamanho. Mesas, com toalhas xadrez, esperam deliciosos almoços em família; e cadeiras esperam corpos cansados para um merecido repouso acompanhado por uma xícara de chá quentinho, enquanto se observa os jardins ao redor.

Nos chamou a atenção a grande quantidade de estrangeiros, africanos e do oriente médio, aparentemente os suecos se preocupam com trabalho humanitário e  concedem asilo político; mas, em geral, não vimos essa população estrangeira parada nas praças, sem fazer nada, como em muitos países, inclusive, agora, no Brasil; a grande maioria trabalha e está integrada à sociedade. Já havíamos lido que não é difícil conseguir visto de trabalho na Suécia, há que se conseguir o trabalho e, em o tendo, o visto é concedido.

Aí, toda bela e formosa, resolvi cozinhar uma noite, aproveitar a cozinha do hotel e mostrar, aos vizinhos, que o brasileiros também sabem cozinhar. Lá em Lofoten, na loja que compramos o bacalhau e os snacks de bacalhau, compramos um pacotinho, cuja foto está abaixo. No nosso já ótimo norueguês, tratava-se de sopa de bacalhau, que imaginávamos tomar em uma noite bem fria. Então pensamos, no pacotinho deve ter lasquinhas de bacalhau e temperos. O abrimos e foi o que enxergamos. Então preparamos um arroz, daqueles de saquinho e pensamos em usar o conteúdo do saquinho, mais uns tomates e algumas outras coisinhas, juntar o arroz e fazer um risoto de bacalhau. Despejamos todo o conteúdo do  pacote na panela e o Caro Amigo nem pode imaginar o que aconteceu, nele ... chegamos ao hotel, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Estocolmo/Prefeitura/Gamla Stan, 15 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Nele, no tal pacote, só tinha tempero, e bem apimentado, não tinha nada de sopa de pescado ou bacalhau, acabamos comendo risoto de atum, pois tínhamos uma lata no carro. Teremos que melhorar nosso norueguês para a próxima visita (ah, ah, ah!).

Mas voltando ao nosso hotel e ao que fomos observando de seus habitantes, agora já não tão estranhos. Em verdade, os poloneses eram quatro jovens trabalhadores, que saiam super cedo e voltam à noite, cozinham algo rápido e depois passam horas no celular, falando com a família. Já a nossa vizinha, que cozinha super bem, o marido não vimos, só os cinco filhos, duas meninas pré-adolescentes, um rapaz adolescente e um casal de jovens, não descobrimos exatamente quem trabalha da família, provavelmente o pai e os dois jovens; descobrimos que  não são da Turquia, são do Afeganistão, conversamos com eles. Há um senhor solitário, que usa uns chapéus diferentes, adora umas biritas e fica andando por todo lado, o apelidamos de xerife; pela manhã ele está sóbrio, banhado e arrumadinho para trabalhar. Gostamos da experiência de ter ficado nesse hotel!

Nossa primeira parada do dia foi na prefeitura, Stadshuset, onde ocorre o banquete da entregues os prêmios Nobel, exceto o da Paz, que é em Oslo. O enorme edifício de tijolo marrom escuro tem pouco mais de oitenta anos, mas foi construído com a intenção de aparentar mais, talvez para que não destoasse do resto do conjunto da cidade. Seu Salão Azul nunca chegou a ser azul, contam que assim constou no projeto e era essa a intenção, mas foi tão bonito o resultado em tijolos que desistiram de pintá-lo; nele tem-se a impressão de estar no exterior, olhando para janelas e balcão de edifícios,seu órgão é segundo maior órgão da Escandinávia. O Salão Dourado, é todo de mosaicos, uma fina lâmina de ouro 23 quilates os reveste, dizem que é o salão mais lindo do mundo, suas paredes contam a história do país e uma deusa, representando a cidade de Estocolmo, destaca-se ao meio ladeada por representações de países do oeste e do leste.  Todas as visitas são guiadas e duram 50 minutos. Ao meio dia e às 6 da tarde, é possível ver São Jorge, e outras imagens, no relógio da torre.

Saindo da Prefeitura, caminhamos por um canal, passamos pelo Parlamento até alcançar o Kungsträdgarden,  um parque urbano, ponto de encontro e local de banho de sol e de almoço de boa parte da população, que se espalha por ele com seus lanches e saladas. Parte dele tem ares de uma praça tradicional, com bancos e canteiros de flores; a outra parte é mais moderna, com mais concreto.

Daí seguimos para Gamla Stan, a cidade velha, para o Stockholms Slott, o Palácio Real, nele ficam os gabinetes administrativos da Corte Real da Suécia e usado, pelo rei, para fins administrativos, como chefe de Estado, pois a família real vive em outro castelo, há poucos quilômetros da cidade.  Há troca de guarda às 12 horas, aos domingos é às 13:00. Infelizmente, como não abre às segundas, só o vimos de fora o imponente edifício, reconstruído em 1754,  que, dizem,  possui suntuosas salas.

Ao lado do Palácio fica a Catedral, Storkyrkan, nela se realizam coroações e casamento reais. Tem altar de prata e assentos reais, mas não podemos dizer que foi a que mais gostamos, nos pareceu um tanto sóbria demais.

Próxima da Catedral está a Tyskakyekan, uma igreja que nos atraiu mais, principalmente pelo colorido de seus trabalhados vitrais.

Uma das melhores coisas a se fazer na cidade é caminhar pelas ruelas de Gamla Stan, observando as velhas construções em tons pastéis, que hoje abrigam dezenas de lojas e restaurantes, que são a paixão dos turistas, que lotam suas ruas e praças num burburinho sem fim. É o coração da cidade, uma das cidades medievais maiores e mais bem conservadas da Europa.

E para descansar os pés, pois os olhos não se cansam nunca de admirar, fizemos um passeio de barco, chamado Canal Real, que pegamos próximo ao Parlamento (Riksdag) e circunda a Djurgarden. Assim pudemos ver a cidade de outro ângulo e apreciar, calmamente, a beleza de suas formas. A empresa (www...), tem várias opções de passeios diferentes, escolhemos um que tinha áudio-guide em espanhol, algumas tem só em inglês. Há também opções em outras empresas, inclusive com refeições a bordo. 

O país tem cerca de nove milhões e quinhentos mil habitantes, foi o primeiro país a legalizar o casamento entre homossexuais, tem uma das melhores qualidades de vida e um povo que se considera muito feliz. O que notamos aqui é que eles são super tranqüilos, vivem numa paz de dar gosto e amam a natureza; os jovens casais têm vários filhos, dois ou três, com idades muito próximas; é grande o número de adoções, notam-se muitas crianças de origem asiática e africana. Os pedintes já chegaram ao país, vê-se ciganos nas portas das igrejas e dos mercados.

E íamos ficar três noites na cidade e seguiríamos para o sul, rumo à Mälmo e à Dinamarca. Esse era o plano original, mas parece que essa foi a viagem de mudança de planos. Acontece que, quando passávamos por uma avenida à beira mar , o Kuc viu uns navios e descobriu que... vamos visitar um castelo, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Estocolmo/Castelos Gripsholm e Drottningholm, 16 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Acontece que, quando passávamos por uma avenida à beira mar , o Kuc viu uns navios e descobriu que era um hotel, sabíamos que existia um albergue em um barco, mas com banheiro coletivo, então nem procuramos. Agora ele havia encontrado um hotel, na verdade são vários, um ao lado do outro. Sempre sou eu quem sai atrás dos hotéis, ele faz corpo mole, diz que seu inglês é pior que o meu, inventa mil motivos e fica no carro esperando que eu resolva tudo. Dessa vez ele parou o carro, com uma conversa de que iria tirar uma foto e foi logo lá, descobriu tudo, e voltou com cara de criança que quer brinquedo.  Até parece que ele nunca andou de navio. Se já é chato com ele andando, imagine o Caro Amigo como deve ser chato parado (ah, ah, ah!). Mas como eu sou uma santa (ah, ah, ah!), sugeri, que alterássemos uma vez mais o roteiro e ficássemos mais uma noite em Estocolmo, para dormir no navio hotel (www.rygerfjord.se), numa cabine com janela, para namorar a vista à noite, afinal gostamos tanto dela.  E, assim,  visitaríamos o que planejamos fazer fora da cidade e voltaríamos à noite.

A Suécia não é famosa pela culinária, que parece que começa a despontar agora, mais é muito famosa na área de designer, por suas idéias inovadoras e desenhos modernos e arrojados. A famosa loja IKEA, que vende de um tudo para casa, dizem que até  parede, é daqui. Fomos dar uma espiadinha e nos pareceu igual à que existe em São Paulo.

Há 60km de Estocolmo, fica a cidade de  Mariefred, onde está o Castelo Gripsholm, à beira do lago Mälaren. Fomos de carro, mas é possível ir de barco e deve ser ainda mais maravilhoso. Seja de barco, de trem, de ônibus ou mesmo de bicicleta, o que o Caro Amigo não pode é deixar de ir, pois foi o castelo que mais gostamos. A cidade já é uma delícia, com suas casas de madeira e cara de que o mundo parou por lá. Ela, por si só, é um lindo museu.

Nossa primeira vista do castelo foi a partir do lago, desfilando, a sua frente, uma família de cisnes, um ângulo de visão que não poderia ser mais perfeito. Ele é marrom, quase querendo ser vermelho falun (agora o Caro Amigo já sabe sobre essa cor que, embora não seja o azul ou o amarelo da bandeira, é tão sueca), seus telhados são negros, duas cores tão austeras para as formas tão arredondas e sexuais do castelo, mas até isso parece combinar perfeitamente com o cenário e a cor do céu. Seu interior não desmerece sua beleza exterior em nada. Ele foi construído em 1380, pertencendo à família Jonsson, passando, posteriormente, por confisco, para mãos do rei e sofrendo várias renovações e usos, inclusive como prisão.

Hoje, ele é um museu, no qual 65 salas podem ser apreciadas. Elas contem fartos mobiliários, objetos de decoração, tetos ricamente trabalhados e paredes finamente pintadas; mas o principal é que o Castelo abriga a maior parte da Coleção Nacional de Retratos (Statens Porträttsamlingar), excelentes pinturas lotam as paredes de todas as salas, possibilitando observar costumes, vestuário e rostos de séculos de história. O teatro, no interior do castelo, é magnífico, espelhado, com imponentes colunas e, no palco, há todo um aparato de cenários de ficar de boca aberta.

 Fomos primeiro ao Castelo de Gripsholm, que era mais distante de Estocolmo, e deixamos o Drottningholm, para o final, pois estava mais próximo da capital, 11 km, e tínhamos maiores  expectativas quanto a ele, pois é Patrimônio da Humanidade. Mas, em resumo, não fizemos um bom negócio, visitamos a cidade de Mariefred muito rapidamente, pois a visitação do segundo castelo encerrava às 16:30 horas e, no fim das contas, não o achamos tudo aquilo, pelo menos o que pode ser visitado, pois, por ser residência dos reis da Suécia, não é tão grande a parte aberta ao público.

O Castelo de Drottningholm (Ilha da Rainha) é uma construção do século XVII, em estilo barroco francês e com inspiração no Palácio de Versailles, é suntuoso e tem salas finamente decoradas, temos que admitir, mas nada que já não tivéssemos visto igual ou parecido. Ainda fomos cair na besteira de comprar uma visita guiada.

Eu (Sayo) vinha toda feliz e satisfeita com meu inglês (apesar de tupiniquim e meia boca, bem sei, ah, ah, ah!), pois vinha até me saindo bem por toda viagem, mas quando nosso guia, um senhorzinho, abriu a boca pensei: estou com problema de audição, tenho que ir com urgência ao médico, ou pegamos a excursão errada, deve ser em javanês (ah, ah, ah!). Só entendia uma coisa “fourteen”, “sixteen”  e não sei mais que “teen”, não era possível! Quando a mocinha fez as apresentações e dividiu os dois grupos, inglês e sueco, eu havia entendido tudo, o que estaria acontecendo? O senhor parecia falar com uma batata quente na boca! Perguntei ao Kuc: tá entendendo alguma coisa? Ele respondeu que ia me fazer a mesma pergunta. Começamos a olhar em volta, umas suecas, que acompanhavam um casal de amigos estrangeiros, parece que entendiam tudo; um casal de ingleses também, ou, ao menos, fingiam; já um casalzinho ucraniano, estava como nós, mais perdido que cego em tiroteio.

Decidimos sair à francesa, mas não queríamos passar por mal educados; também não poderíamos agüentar mais quarenta minutos daquilo; tão-pouco poderíamos falar diretamente com o senhor, pois não entenderíamos nada do que ele iria nos responder e pagaríamos o maior mico em público. Então ficamos para o final da fila e pedimos as suecas para transmitirem nosso pedido de desculpas. Elas, aparentemente, não nos entenderam muito bem, pensaram que não estávamos gostando, que estávamos achando uma chatice, pois argumentaram que ele estava contando a história do país, nos desculpamos e repetimos que não o compreendíamos uma frase completa do que ele falava e, novamente, sebo nas canelas. O pobre senhor deve estar procurando a gente até agora, nós bem que adoramos histórias, o Caro Amigo bem sabe, mas temos que, pelo menos, entender parte dela para poder inventar o resto e contar ao Caro Amigo (ah, ah, ah!).

Foi a nossa sorte, porque compramos as entradas conjugadas com o Pavilhão Chinês, pois é mais barato, mas não sabíamos que ele fechava uma hora mais cedo, às 15:30. Assim que, se tivéssemos seguido a visita guiada, não teríamos visto o pavilhão, pois ele está a uma boa caminhada do Castelo, teríamos jogado cerca de sessenta reais pelo ralo. É bom atentar para esses detalhes, pois na hora da venda dos bilhetes conjugados eles não nos informaram.

O pavilhão não atendeu as nossas expectativas, o que ele tem de mais bonito é o edifício, pode ser visto de graça dos jardins. A coleção de objetos de seu interior nos pareceu fraca para tanto custo. Não visitamos o teatro, pois tivemos poucas referências dele, então achamos que o alto custo não compensaria.

Quanto aos jardins, são bonitos, muito gramado, estátuas, pontes, lagos, mas não tem flores. Jardim sem flor é como feijoada sem caipirinha, é boa, mas não é perfeita.

Fim do dia, voltamos a Estocolmo, para dormir no barco.  Como sou muito prevenida, preparei, na noite anterior, ... contamos depois, está na hora de procurar novo hotel.

Beijos,

Sayo e Claudio




Malmo, 18 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Como sou muito prevenida, preparei uma pequena bolsa, com as coisas essenciais, que precisaríamos para dormir uma noite, pois imaginei que a cabine seria pequena. Dito e feito, era um ovo, mal cabia a gente e o Stut. O hotel funciona em três barcos, tem albergue e restaurante, com mesas internas e externa, na popa e no cais.

Na frente, há uma enorme sala de estar, com  TV e   diferentes mesinhas entre pares de poltronas, postas justamente lado de janelas, para que se possa apreciar, bem do outro lado da baia, o edifício da Prefeitura, com sua torre quadrada adornada pelas três coroas, e o resto da cidade. Pegamos nossos copinhos de vinho e cerveja, algo para beliscar e nos sentamos num par dessas poltronas, para escrever, espiar e vigiar a noite chegar, bem devagarzinho, desde a posta do sol até o aparecimento das luzes cintilantes. Outros casais foram chegando e se sentando, com livros e xícaras de chá; alguns se embrulhavam nas mantas e até tiravam um cochilo, embalados pelo balançar, que se originava  das marolas feitas pelos navios que circulavam. A cidade não podia estar mais linda.

Do centro para o sul do país as florestas de pinheiros não são tão densas, surgem grandes áreas de agricultura e pastoreio. As cidades continuam com suas casas de madeira, como o restante do país. Lagos e rios estão por todos os lados. Saímos cedo, pois queríamos passar em mais um Patrimônio da Humanidade, o Porto Naval de Karlkrona, construído em 1680, com uma eficiente estrutura de proteção. No local funciona, até hoje, uma base naval, então a visitação não é aberta ao público, mas há um museu naval interessante.

Passamos em Lund, para conhecer sua famosa catedral, mas não rolou hotel com bom preço. Então seguimos para Mälmo, há 20km, quem sabe teríamos mais sorte. O horário não era muito propício, já passava das oito, pois foram mais de seiscentos quilômetros percorridos e com parada para visita. Se temos algo a reclamar  nesta viagem é o horário  de fechamento das coisas. É a nossa primeira vez na Europa em setembro, não sabemos se é assim em todo continente ou só coisa da Escandinávia; o fato é que, quatro da tarde, tudo quanto museu fecha, o pessoal para de trabalhar e as ruas lotam de carros. Cinco horas, está todo mundo jantando, porque os restaurantes também fecham cedo; até portaria de hotel fecha, em geral, antes das oito. Isso encurta muito o dia, a gente só tem das 10:00 às 16:00 horas para visitar as coisas, se elas abrirem às dez, algumas só abrem à tarde  e, muitas  fecham por todo o outono/inverno. Ainda bem que paisagem não fecha nunca, elas são das melhores coisas que existem aqui, na Escandinávia (ah, ah, ah!).

Em Mälmo, encontramos um hostel com preço razoável, o proprietário era super solícito, ia mostrando tudo e deixando a gente bem à vontade. O quarto era legal, bem claro, as instalações da cozinha também. Acabamos ficando, mesmo com  o banheiro compartilhado,  estávamos cansados, morrendo de fome e passaríamos só aquela noite, pois pretendíamos chegar a Copenhague cedo. Não valia a pena perder mais tempo procurando, já se aproximava das oito da noite.

A região Mälmo/Lund era Dinamarca, nota-se bem na arquitetura, não se observam as casas de madeira, pintadas de vermelho falun. Surgiram as casas de alvenaria, telhado triangular, bem pontudo, em material metálico. Lund é um excelente local para observá-las. É uma das mais antigas do país, data de anos novecentos, época dos vikings, tem muita história para contar .

Nossa intenção era conhecer a catedral, Domkyrkan, chegamos dez segundos depois do meio dia, portanto só tivemos tempo de ver o final do concerto do relógio astronômico e espiá-la rapidamente, pois se iniciou o culto. Notamos seus tons pastéis e sua sobriedade, é mais impactante vista de fora. É possível assistir o concerto do relógio, com bonequinhos que dançam, às 12:00 e 18:00 horas.

Tivemos que deixar a Suécia sem ter visto tudo de interessante que o país tem para mostrar, principalmente Gotlands, que, nos contou um Caro Amigo, é maravilhosa, mas o tempo está segurando nossos pés, aproxima-se a hora de voltar para casa, ficarão para uma próxima visita.Torramos nossas últimas coroas suecas no Lidl e seguimos para o momento mais esperado do nosso dia, que era a travessia do Canal de Oresund, através da ponte que liga a Suécia à Dinamarca, uma grandiosa obra de engenharia, a maior ponte rodo-ferroviária da Europa. Ela foi inaugurada em 2000, seu comprimento total é 7845 m, na verdade não se trata só de uma ponte, mas sim via de comunicação, que engloba ponte e túnel, para permitir a passagem de navios, num total de 16km, que levaram nove anos para serem construídos, sendo terminada  três meses antes do previsto. A única coisa não muito legal nela é o preço da travessia, 46 euros.

Cruzando a ponte chegamos a Kobenhav (Copenhague), na Dinamarca. Novo país, nova língua, novo dinheiro e, principalmente, novo hotel em uma grande cidade. Chegamos cedo, no princípio da tarde, assim acreditávamos que não seria tão complicada a tarefa.

Quando chegávamos à cidade, vimos um “guest house”, até paramos, mas achamos a coisa meio devagar. Como tínhamos   perspectivas de  encontrar várias opções de hotéis, não sabíamos se estávamos longe do centro, que  imaginávamos caro,  mas não um assalto, nem chegamos a falar com os proprietário, seguimos.

Bem... mas se a Noruega é o país mais caro do mundo, Copenhage deve ter os hotéis mais caros do mundo. Só para que o Caro Amigo tenha uma vaga idéia, o Albergue da Juventude custa, em setembro, que já é baixa temporada, 500 reais a diária, sem lençóis e toalha de banho, que são alugados, e sem vaga para aquela noite, só para o dia seguinte. Está certo que é às barbas do Tivoli e que o imenso prédio é novinho, mas assim já era demais, só dava para pagar isso se fosse para dormir no quarto da rainha, Margrete II, (ah, ah, ah!). Pesquisamos, no Brasil o preço de vários hotéis, sabíamos que não seriam baratos, mas acreditamos que, pessoalmente, pudéssemos encontrar algo mais simples e com preços mais acessíveis.

No Centro de Informações Turísticas, o rapaz, de poucas falas e muita má vontade, estava mais preocupado em vender algo ou fazer reservas de hotéis, pois cobravam uma comissão, do que, na verdade, nos ajudar a encontrar um local legal, que atendesse às nossas necessidades, ele realmente não estava lá para dar qualquer informação alguma. Não admira que o local estivesse vazio, com só ele para atender o público, numa cidade imensa e com tantas atrações, aparentemente os turistas perceberam que é melhor se informar em outro lugar. Ao menos aproveitamos, nas proximidades, para trocar dinheiro na Estação Central, na Forex, que nos pareceu a melhor opção em toda a Escandinávia.

E para complicar, a cidade é uma cratera, buraco para todo lado, parece que vão fazer um metro até o Japão (ah, ah, ah!), o que torna muito difícil circular de carro. Depois de mais de três horas procurando hotel, o que encontramos de mais barato chegava aos 700 reais. Não, Caro Amigo, não é a semana não, é só um dia! Decidimos sair pegar a estrada e procurar algo nos arredores da cidade. No caminho, na verdade a pouco mais de 3 km do Parque Tívoli, o grande coração pulsante da cidade, o Caro Amigo nem imagina o que encontramos... temos que preparar o café, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Copenhague (Kobenhavn)/ Castelos, 19 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

No caminho, encontramos aquele “guest house”, o da chegada à cidade. Agora nos animamos a tocar a campainha e perguntar. Um homem atendeu o interfone e pediu que esperássemos. Ele deve ter ido tomar banho, fazer a barba e cortar o cabelo, depois de alguns minutos que pareceram uma eternidade, aparece um senhor muito gentil, mas muito atrapalhado, daquele tipo que, a Cara Amiga bem conhece, diz que tudo quem sabe direitinho é a mulher dele. Mas, ao final, ficamos com um quarto, por menos da metade do preço do albergue.

O La Villa (www.lavilla.dk) fica no andar inferior de um sobrado, onde residem seus proprietários, são cinco quartos. Há cozinha, sala de jantar e uma área externa que, em dias quentes, dá para curtir um jantarzinho legal. É um local simpático, embora os proprietários não sejam um exemplo de organização. Ao lado, tem um mercadinho, pizzaria e kebaberia, para quem não quer cozinhar. Sua localização é ótima, com ônibus ou metrô (três estações) para o centro, quem gosta de andar pode ir caminhando. O transporte público funciona da mesma forma que na Suécia, bilhete válido por uma hora, que pode ser comprado na estação, com moeda ou cartão de crédito, ou em quiosques; para quem vai usar muito, é mais econômico comprar dez bilhetes .

A Dinamarca é uma grande península, a Jutlândia e centenas de ilhas, como a Zelândia, onde fica a capital,  Funen, Falster e Bornholm, motivo pelo qual, muitas vezes, é chamada de Arquipélago Dinamarquês. É uma monarquia constitucional, com sistema parlamentar de governo. É membro da OTAN e da União Européia, embora não tenha aderido ao euro, sua moeda é coroa dinamarquesa (dkk). Assim como Noruega (nok) e Suécia (sek), com as quais já formou um único reino, tem altos níveis de bem-estar  e igualdade de divisão de riquezas, alicerçados em normas de saúde, assistência social e educação. É considerado um dos países mais pacíficos e menos corruptos do mundo. 

Copenhague, a capital, fica ao leste da ilha Zelândia, é uma cidade encantadora, cosmopolita, com gente que consegue ficar elegante, ou melhor, charmosa até em suas bicicletas, com cestas enfeitadas com flores, que desfilam pelos mais de 300 km de ciclovias, entre canais e edifícios futuristas, como o Den Sorte Diamant, o Diamante Negro, um edifício de vidro e mármore negro, a Biblioteca Real, e castelos renascentistas, que convivem pacificamente. Tem inclusive um bairro hippie, Cristiania, onde, até poucos anos, era vendida maconha livremente. Estivemos por lá e detestamos, é algo deplorável, fede a xixi, é sujo, pichado e com pessoas com cara muito estranha; dizem que não é perigoso, mas se o Caro Amigo estiver em Copenhague, poupe-se do trabalho de ir até lá, a cidade tem coisas maravilhosas para conhecer, dedique-se a elas.

Embora seja possível fazer tudo caminhando, compramos um pacote que incluía dois roteiros de ônibus e um de barco, naqueles ônibus que se pode descer e subir à vontade, Hop On Hop Off (www.stromma.dk), com validade de 48 horas, então poderíamos fazer tudo com calma e ainda havia desconto em várias atrações. O preço era interessante, cerca de 110 reais, principalmente pelo passeio de barco, de uma hora e meia. Descobrimos, depois, que existe um tour free, já usamos o serviço em outros países, em Berlim e em Coimbra, é muito interessante porque, em geral, são estudantes que guiam o tour e eles dão uma verdadeira aula de história; no final aceitam gorjetas, mas é algo voluntário, sem qualquer pressão. Fica a dica, quando o Caro Amigo estiver viajando, verifique se não há o serviço (www.neweuropetour.eu) ou pergunte no centro de informações turísticas.  
Nossa primeira parada foi o Palácio Real Amalienborg, onde, ao meio dia, é possível assistir a troca de guarda. Trata-se de um conjunto de quatro edifícios, datados de 1760, estilo rococó, construídos em volta de uma praça. 

Apesar de ser a atual residência oficial da família real, a rainha Margrete II e seu marido, príncipe Henrik, ele não tem estereótipo de palácio, com o qual as crianças sonham, onde vivem princesas e príncipes; ele é austero, lembra mais um museu. Não são muitas as salas que podem ser visitadas, justamente por ser uma residência, mas as que vimos são abarrotadas de pequenas lembranças e porta-retratos, algo bem divertido. Gostamos, especialmente, da sala da Rainha Loise, por sua decoração e estofados em capitonê; do escritório Frederik VIII, vermelho e dourado; da coleção de compoteiras de cristal e de presentes, com muitas jóias em diamantes e pérolas.

Ao fundo fica a Igreja de Mármore, decorada com mosaico e sem imagens. Somente uma cúpula, a maior da Escandinávia. Em todos os palácios e igrejas, que visitamos na cidade, é permitido fotografar, achamos ótimo. Os dinamarqueses são mais descontraídos que os suecos e noruegueses, parecem viver mais despreocupadamente. Há carrinhos vendendo comida na rua, até crepe, e as bebidas alcoólicas são vendidas como no Brasil, em qualquer lugar.

O Rosemborg Palace foi construído, entre 1606 e 1634, como castelo de verão, por Christian IV, um dos mais famosos reis da Dinamarca, patrono das artes e construtor de muitos dos  mais significantes edifícios de Copenhague.  Após a construção do Palácio  Frederiksberg, em 1710, Rosemborg passou a ser usado  para guardar heranças familiares , tronos e insígnias reais, vindo, em 1838, a ser aberto ao público como museu, com a intenção de representar a história do país a partir da história da própria casa real, com exposição organizada em ordem cronológica, não por tema, até o último rei morto. Para quem gosta de palácio com toda pompa e circunstância, como é o nosso caso, ele é imperdível, não só por suas tapeçarias, como pelos painéis pintados de suas paredes e, principalmente, pelos seus trabalhos em estuque, branquinho glacê de bolo decorando tetos. 

Ele é um pouco escuro, em virtude do sistema de iluminação, o que lhe confere um ar de mistério. Nos calabouços estão as mais valiosas jóias do reino, inclusive a própria coroa da rainha Margrethe II. Os jardins, que não desmerecem o castelo, são um ótimo local de descanso.

O rei Christian IV, em uma viagem à Holanda, apaixonou-se por seus canais, e quis fazer, em sua cidade, uma cópia deles. Em 1618, o rei doou terrenos a comerciantes que quisessem construir, à beira do canal, edifícios similares aos holandeses, assim chegaram muitos comerciantes alemães e assim nasceu Christianhavn,  um dos canais por onde pulsa o agitado sangue da cidade, onde, hoje, estão museus, cafés e restaurantes, como o famoso restaurante Noma, de comida nórdica,  um dos melhores do mundo, e até  a famosa torre barroca, em forma de  espiral, da Vor Frelsers Kirke, que foi incluída, por Jules Verne, no livro a Jornada ao Centro da Terra, pode ser vista a partir dele.

Outro famoso porto da cidade é o Nyhavn, com suas pitorescas casas e apelidado de o maior restaurante do mundo, pela sucessão de bares e restaurantes que se instalaram ao longo do canal, perto do qual está a casa onde viveu Hans Christian Andersen. É um local para caminhar, tomar uma cerveja e provar um smorrebrod, aqueles sanduíches abertos.
E admirando a Pequena Sereia, que sofre por seu príncipe encantado, nos despedimos por hoje, pois até o Caro Amigo deve estar cansado, deixaremos um pouquinho para amanhã.

Beijos,

Sayo e Claudio



Copenhague/Carlsberg /Tivoli, 20 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

A Dinamarca, de tradição viking, é um país moderno, que legalizou o aborto e o casamento entre homossexuais, com população inferior a da cidade de São Paulo, gente feliz, que se preocupa com o meio ambiente, com a emissão de carbono e que lota os bares, nos finais de tarde, para conversar com os amigos e rir muito. É a terra da Pequena Sereia e do Patinho Feio, da famosa poltrona Egg, de destacados nomes da arquitetura e do design, como Verner Panton e Arne Jacobsen, e de castelos fantásticos. Os dinamarqueses definem seu design como funcional, elegante e atemporamente simples, nos parece que assim também se pode definir o espírito deste povo, é assim que eles vivem nesta linda Capital. O país tem muito a oferecer ao turista que quiser se aventurar por aqui.

Aproveitamos a manhã para uma visita à Cervejaria da Carlsberg (www.visitcarlsberg.dk), nos arredores da cidade. Fundada por Jacob Christian Jacoben, em 1847, figura, hoje, como o quarto grupo cervejeiro do mundo. É um enorme complexo de tijolos vermelhos, com uma entrada faraônica, com dois enormes elefantes. Durante a visita é possível conhecer, de forma sucinta, fases da fabricação da cerveja, através de projeções, visitar a coleção de garrafas de cerveja e veículos, além de tomar dois copos da dita cuja.
Mas não dá para ir a Copenhague sem dar uma caminhada, para observar, com mais vagar, os magníficos edifícios de tijolo marrom e suas torres e cúpulas esverdeadas, algo similar as de Estocolmo. Então, há que se deter, por alguns minutos, diante do suntuoso edifício da Prefeitura, construído na idade do ouro da cidade, para admirar suas formas e sua vizinhança. Depois, continuar pela Stronget, a enorme rua de pedestres e de lojas, onde se encontram marcas internacionais e dinamarquesas de renome, além de muita gente diferente para observar.

E, assim, fomos para no Palácio Cristiamborg, que já foi residência dos reis da Dinamarca, entre o século XV e1799, e que, hoje, é um centro político, que abriga a Casa Real, onde são realizadas cerimônias oficiais, o Parlamento, a Suprema Corte, o escritório do Primeiro Ministro, além de museu, teatro, capela e estábulos. O complexo de edifícios que se vê atualmente é a terceira construção feita no local, as outras duas queimaram-se em incêndios, sua última grande reforma foi realizada em 1907.
Entre as coisas que mais nos impressionaram durante nossa visita estão os imensos lustres de cristal, os estuques e a biblioteca, branca e dourada. A Great Hall é a maior das salas reais de recepção e está decorada com uma fantástica coleção de tapeçarias moderas, datadas do ano 2000, que contam a história da Dinamarca e do mundo nos últimos 1000 anos. Visto de fora, o palácio não aparenta as jóias que tem em seu interior, pode até chegar a parecer feio e passar desapercebido, não fossem as três elegantes coroas de sua cúpula, mas é uma visita imperdível, inclusive para subir em sua torre e expiar a cidade desde o alto.

E no final da tarde, quase seis, chegamos aos Jardins do Tivoli e o que dizer dele... parece que resta muito pouco, já foi dito que ele é “para sempre como nunca antes”; que é parte integrante e o principal representante da cultura, música e entretenimento da Dinamarca; que é um parque para todas as idades e preferências;  que ele é velho, moderno, vintage, fantástico, sem graça, grande, pequeno e não sabemos mais quantos adjetivos.  O fato é que ele entrou em funcionamento em 1843 e recebe, anualmente, mais de quatro milhões de visitantes, interessados em descobrir seus segredos. Há quem diga que sua grande fama vem de sua montanha russa, que data de 1914, completando 100 anos, uma das mais antigas em funcionamento no mundo; outros afirmam, com convicção, que seu sucesso se deve ao The Five Star, o carrossel mais alto do mundo, com 80m; ou que se tornou imortal quando inspirou Walt Disney a criar a Disleylândia. O parque conta com 26 atrações, lago, muitas lojinhas, diversos cafés e restaurantes, além de apresentações teatrais e musicais, atrações curiosas, performances a céu aberto e queima de fogos. Sem falar em um hotel butique, o Nimb Hotel, com dezessete quartos, só para celebridades, até o Lula ficou lá (imagine o preço Caro Amigo). Tudo numa área de jardins de 21 hectares, bem no meio da cidade. Tudo isso já foi dito dos Jardins do Tivoli, mas nos parece longe de defini-los.

Resolvemos visitá-lo no final da tarde para, justamente, vê-lo iluminado pela luz do dia e, posteriormente, pelas milhões de luzes coloridas que o decoram, à noite. O que fizemos foi caminhar, sentar em algum banco, observar e, novamente, caminhar. E o que nos pareceu? Lindo! Maravilhoso! Um enorme carrossel, colorido, iluminado, vivo, inebriante. Ele pode até ser meio antiquado, tomando-se como base os mega parques atuais, eletrônicos e ruidosos. Mas acontece que, aos nossos olhos, não tão crianças, ele mostrou coisas que povoaram nossos sonhos e desejos infantis, e que, na ocasião, não tínhamos condições de conhecer. É muito bom realizar sonhos (ah, ah, ah!).

E agora, gostaríamos de dizer ao Caro Amigo o que há de podre no Reino da Dinamarca, contam por aqui que alma do Rei Hamlet apareceu a seu filho, o príncipe Hamlet da Dinamarca, clamando por vingança, pois ele fora envenenado por seu irmão, Claudio, que, tornou-se amante da rainha Gertrudes, com quem se casa apressadamente, após assassinar seu irmão, para tornar-se rei. Hamlet, então,  jura vingar o pai e divaga sobre os dilemas existenciais, afirmando que há mais mistérios entre o céu e a terra do que possa imaginar a nossa vã filosofia e que há algo de podre no reino da Dinamarca.


Ele finge-se de louco, agindo  como perturbado. Ser ou não ser, eis a questão. Em sua obsessão pela vingança, rejeita o amor de Ofélia, filha de Polônio, conselheiro de Claudio. Chega ao castelo uma trupe de artistas e Hamlet arquiteta um plano; monta uma peça teatral, encenando o assassinato do próprio pai. No momento da morte do rei, Claudio demonstra forte emoção, que Hamlet interpreta como culpa. Temendo por sua vida, Claudio manda o príncipe para Inglaterra, acompanhado de dois amigos, para que lá ele seja assassinado.

Antes de sua partida, Gertrudes, aflita, chama o filho a seus aposentos e com ele discute violentamente; é quanto Hamlet ouve ruídos atrás de uma cortina e, acreditando tratar-se de Claudio, desfere um golpe mortal, mas era Polônio, que cai morto. Ofélia, louca com o ocorrido, vagueia pelos corredores do palácio; seu irmão, Laertes,  volta da França.

O príncipe Hamlet não chega à Inglaterra, pois seu navio é atacado por piratas e ele foge, retornando à Dinamarca. Ofélia suicida-se e Claudio convence Laertes a competir com o príncipe, usando uma espada envenenada e, caso ele não morra, lhe será oferecida uma taça de vinho contendo veneno. Hamlet vence e sua mãe, para comemorar ... vamos visitar uma catedral, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio.





Helsingor (Elsimore), 21 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Voltando ao que contam por aqui, Hamlet vence e sua mãe, em comemoração, bebe a taça de vinho destinada a ele. Laertes fere  Hamlet com a espada envenenada e, num combate, corpo a corpo, que se segue, as espadas são trocadas e Hamlet fere Laertes com a espada envenenada. A rainha confessa tudo e morre. Laertes conta que o rei é o culpado de toda a trama e, antes de morrer, reconcilia-se com o príncipe. Hamlet obriga Claudio a beber a taça com veneno e morre dizendo: o resto é silêncio.

E foi em meio ao silêncio que chegamos, na fria manhã, ao Castelo Kromborg, em Helsingor, onde tudo se passou. Pesadas colunas de pedra, em cujos pés o musgo, verde, se espalhava, e rachaduras, sinais fortes do tempo, assim nos recebeu o castelo. Há quem diga que nada disso se passou, pura invenção de Shakespeare. Mas há os que afirmem que um amigo escutara tudo de sua avó, que tinha uma prima, cuja tia contou que seu pai ouviu tudo da boca de seu padrinho, que lhe foi contado pelo seu bisavô, que tudo presenciou. Cabe ao Caro Amigo decidir em quem acreditar.

O que vimos foi um castelo/fortaleza, debruçado sobre o Mar Báltico, com canhões vigiando o inimigo. Num canto ou outro, traços amargos, fotos, frases, tudo a lembrar a triste história e os vários incêndios que sofreu. Tapeçarias, nas paredes, e pesada mobília recordam a opulência que um dia teve, quando rainhas e reis caminhavam por seus corredores e combatiam inimigos.
Mas há uma preciosa e fresca capela, que permaneceu intocada, livre do ardente fogo, com seus coloridos painéis de madeira entalhada, prova viva da beleza que, outrora, revestiu o castelo  e de que, por ali, ainda caminham princesas, vestidas de branco, com buques de flores nas mãos, amparadas pelos vigorosos branços de seus pais orgulhosos, em direção a seus gentis príncipes encantados, com quem viverão felizes para sempre. E em todos esses contrates, que nada mais são que os contrastes da vida de qualquer um, reside a beleza do Castelo  Kromborg.

Essa foi a nossa primeira visita do dia, a cidade de Helsingor, a coisa de 40 km de Copenhague, o Castelo Kromborg, que foi construído entre 1574 e 1585, no reinado de Cristian II, no estreito entre Suécia e Dinamarca, é Patrimônio da Humanidade. Há visitas guiadas com dramatização, mas os horários não bateram com os nossos. De qualquer modo, todas as visitas têm uma pequena introdução, de meia hora, com um guia, mas dessa vez também não tivemos sorte, a nossa guia além de um sotaque estranho, tinha um cacoete, mexia os olhos de um modo estranho, ao menos, era mais alegre que o guia  do Castelo Drottningholm.

Daí seguimos para Hillerod, também no norte da ilha Zelândia, há 20 km da Capital, um agradável passeio por campos de golfe, casas de campo e bosques, nos quais o outono já estendeu suas mãos. O Castelo de Frederiksborg é o maior da Dinamarca e, dizem, uma das mais belas construções do país. Em estilo renascentista, foi construído por Christian IV, no início do século XVII, sendo quase todo destruído por um incêndio em1859. O fundador da Carlsberg,  J.C. Jacobsen, teve importante papel na restauração do mesmo e, em 1877, propôs sua transformação no Museu de História Nacional, que ilustra quinhentos anos de história dinamarquesa, através de retratos, pinturas históricas, mobília e arte decorativa.
Atravessando uma cidadela de tijolos marrons e cruzando a ponte sobre um lago, chegamos à fonte, onde deuses mitológicos vertiam água e, ao fundo, o castelo de conto de fadas, Frederiksborg, com relógio, torres, cúpulas e estátuas. A capela mercê destaque, seu tom azulado, quase cinza, com detalhes dourados, retâbulo de prata e estuques nas paredes e teto. O interessante da visita é que donzelas caminham pelo castelo, trajando réplicas de roupas dos quadros, e conversam com os visitantes e explicam partes da história. A partir de seu jardim barroco, o castelo tem uma vista espetacular.

Outro passeio interessante, que pode ser feito a partir de Copenhague, é Roskilde, há 40 km, que foi a primeira capital da Dinamarca, seu nome significa flor de primavera, por ter sido fundada nessa estação. Hoje, sua catedral, embora de aparência quase modesta, interior branco com alguns poucos detalhes em tijolo vermelho, é Patrimônio da Humanidade e abriga trinta e nove túmulos reais, muitos dos quais são verdadeiras obras de arte. 

Assim deixamos a Ilha Zelândia, com destino a Odense, na Ilha de Funen, cruzando uma enorme ponte, outra interessante obra de engenharia, o custo da travessia é de cerca de cem reais, não tão barato, mas ela possibilita chegar à Alemanha sem precisar tomar aquele ferry de 92 euros e ainda conhecer um pouquinho mais da Dinamarca. Na paisagem aparecem os enormes cataventos, uma forma de produção de energia não poluidora e que não agride o meio ambiente, muito utilizada no país, e zonas rurais.

E o Caro Amigo deve estar se perguntando o que nos levou a Odense e teremos imenso prazer em contar. Senta que lá vem história: Não se sabe como, mas entre os ovos de uma pata apareceu um maior. Mãe zelosa, ela chocou todos com o mesmo carinho. Nascem os patinhos e um deles destaca-se por seu tamanho, cor e falta de jeito. É perseguido pelas outras aves, por ser feio, diferente de seus graciosos irmãos. Um dia, desiludido, já cansado de sofrer e sem ter amigos, encontra sua verdadeira família e descobre que é um lindo cisne. Aliás, o cisne é a ave símbolo da Dinamarca.

E aí? Descobriu Caro Amigo? Não... não viemos experimentar carne de cisne (ah, ah, ah!).

Beijos,

Sayo e Claudio.




 Odense, 22 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Chegamos à cidade e iniciamos a caça a um lugar legal para ficar. O frio era cruel, 10 graus e com vento forte. Demos uma olhada no centro, nada! Fomos atrás de algumas indicações da Eva Maria (GPS), alguns B&B, sem vaga! Pensamos que talvez fosse melhor ligar, que ficar batendo perna naquele frio, precisávamos de wi-fi, para usar o skipe. Entramos em uma “musiteca”, uma biblioteca de música, não sabemos se isso existe no Brasil e qual é o nome correto. Foi lá que encontramos a nossa fada madrinha de plantão, uma senhora que tinha mesmo cara de fada madrinha, mas sem varinha, que nos indicou como acessar a internet, nos ajudou com a máquina de café, que estava quebrada, e o frio exigia um café quente, e até nos conseguiu, não temos idéia onde (deve ter sido com a varinha de condão, ah, ah, ah!), um mapa da cidade com indicações de hotel. O primeiro que ligamos, não tinha vaga; o segundo, não atendeu, mas resolvemos ir pessoalmente até lá.

A pesada porta de madeira só estava encostada, como não havia campainha fora. Empurrei a porta e entrei, do pátio eu enxergava duas pequenas macieiras, carregadas de frutos vermelhos; uma parreira, com pequenos frutos escuros; uma mesa, sobre a qual havia um vaso de flores, com quatro cadeiras; vidros de geléias, ou seriam compotas, talvez chutney; lá no fundo, um jardim, tudo uma lindeza. Quem vê de fora as antigas casas, com ar muito sóbrio, nem pode imaginar os tesouros de seu interior. Era onde adoraríamos morar pelo o resto de nossas vidas.

Toquei a campainha doida para que aparecesse algum cristão, mas nada, nem alma penada. Toquei três vezes e nenhuma resposta. Mas quem sairia deixando o portão só encostado? Que falta de prudência! Será que demorariam? O jeito era ir procura vaga em outro lugar, não podíamos ficar por ali a noite toda, esperando algo que poderia nem acontecer, vai que foram jantar em casa de parentes em outra cidade! Quando me aproximei da porta de madeira e já estendia a mão para empurrá-la, ela se abriu, como por encanto, ou melhor, por obra de Deus, que é Pai e não nos desampara nunca,  e um jovem senhor, loiro e bonitão, entrou no pátio e sorriu.

Perguntei sobre o quarto do B&B, ele respondeu que não tinha quarto, mas sim um apartamento, sem café da manhã, querendo dar a entender que era algo mais caro. Já que eu estava por ali mesmo, sem coisa melhor para fazer (ah, ah, ah!), não custava nada perguntar o preço, estava tão acostumada com a carestia que nada me assustaria. Ele respondeu 600 coroas, perguntei novamente, pensando não ter entendido direito, porque o preço era uma bagatela para o país, cerca de 250 reais, ainda mais por um apartamento todinho, onde poderíamos até cozinhar, ele confirmou. Mais que rapidamente disse que estava ótimo, antes mesmo de ver, para que ele não mudasse de idéia. E, como o seguro morreu de velho e o desconfiado até hoje é vivo, bem dizia meu pai, pedi para conhecer o “AP”, embora tivesse certeza que nada ali poderia ser meia boca.

E realmente não era, não. Ocupava o andar térreo da casa; o proprietário, e sua família, moravam no andar superior. Ele era gracioso, com cozinha equipada, sala de jantar, sala de estar enorme, quarto e banheiro, até com máquina de lavar roupa. Tudo limpinho, bem cuidado e decorado, o sonho de qualquer turista cansado. O proprietário é muito simpático e solícito; até pão, preparado por ele, nos levou uma noite. Tudo era tão perfeito que não nos animamos a ir embora. E foi o que fizemos, ficamos morando nele, resolvemos sair cedo para conhecer as outras cidades, não nos importávamos de rodar 150 km e voltar, ganharíamos o tempo da procura hotel e o prazer de morar ali uns poucos dias. E, no final, nosso senhorio nos deu até um desconto, pois ficamos quatro noites.

Mas, finalmente, o Caro Amigo descobriu o que viemos fazer aqui?  Viemos visitar o museu do filho mais famoso da cidade, talvez o mais famoso do país,  Hans Christian Andersen. Quando eu (Sayo) era criança, adorava histórias infantis, lia muito, de algumas delas jamais me esqueci, fecho os olhos e enxergo as figuras que ilustravam os livros, foi o que nos trouxe a Odense, a vontade de rever A Polegarzinha, A Rainha do Gelo, a Princesa e a Ervilha, A Vendedora de Fósforos, A Roupa Nova do Rei, O Soldadinho de Chumbo, A Pequena Sereia, O pequeno Claudio e o Grande Claudio (não parece familiar, ah, ah, ah!), A Caixinha de Surpresa, os Sapatinhos Vermelhos  e, quem sabe, conhecer alguma nova historinha.

O autor nasceu em 02/04/1805, em Odense, filho de um sapateiro e de uma lavadeira, não teve uma infância de conto de fadas, viviam em um cômodo apertado, que também era a oficina de seu pai, que o amava muito, contava-lhe muitas histórias e construiu para ele um pequeno teatro de marionetes. Mas o pai morreu cedo e o autor, com catorze anos, muda-se para Copenhague para ficar mais perto do teatro e de uma vida que pudesse levá-lo a concretizar seus sonhos. Ele era alto, alguns diziam que até feio, teve alguns amores, mas nunca se casou; viajou e conviveu com amigos. Morreu em 1875, mas não sem antes deixar seu nome escrito na história, pelas obras literárias que escreveu, peças de teatro, histórias, contos, canções patriotas e principalmente, contos infantis, que levaram seu nome por lares do mundo todo.

Por um edifício, em meio a um jardim, entra-se no museu H.C.Andersen, um não grande edifício moderno. Em seu interior, a vida do autor contada cronologicamente e de modo bastante didático, é possível compreender em linhas gerais, mesmo não tendo um excelente inglês.  É grande o acervo de objetos do próprio autor e, ligada ao edifício moderno, está a casa onde ele nasceu, onde ocupavam apenas um dos quartos, pois não pertencia a seu pai, que era muito pobre; a mobília que guarnece a casa não é original, mas é o que supostamente existiria na época. Na lojinha do museu, esperávamos encontrar algum livro em português, com os contos do autor, mas, infelizmente, não; encontramos um em espanhol, mas pequeno, longe do lindo livro, cheio de ilustrações, que gostaríamos de ter comprado. Fica a recordação!

Na saída do museu, pode-se ver a casa amarela de Andersen de frente, justamente na antiga rua parada no tempo, onde as casas permanecem como quando ele por ali deu seus primeiros passos. Tudo na cidade gira em torno do autor, locais ligados à história de sua vida estão indicados com um “sol”, feito por ele mesmo, que adorava fazer figuras recortando papel. Há ainda, em outros endereços, a casa onde ele passou a infância e um centro cultural, Fyrtoejet, que se dedica a narrações, jogos e encenações das obras do autor.

A cidade tem muito a oferecer, como um passeio pelo parque Munke Mose ou ao Zoo. Uma das principais atrações são os passeios pelo rio Odense, com pedalinhos ou de balsa, para espiar os jardins das casas, que ficam ao fundo delas e não podem ser vistos da rua. Imperdível também é Den Fynske Landsby, um museu a céu aberto, feito com mais de vinte construções, retiradas de diversos pontos da ilha, e contam um pouquinho da história local no século XIX; além dos cenários, há gente com trajes da época, em suas atividades cotidianas. Sem falar em compras, pois o comércio é agitado, há, inclusive, uma loja que só vende coisas antigas, a Kramboden, que fica na Rua Nedergade; em frente ao Museu Andersen, visitamos uma muito simpática que vende enfeites de natal, cartões e móbiles recortados, como os que o autor fazia. Mas, como faltou tempo, vamos deixar para conhecer mais dessas maravilhas na próxima visita, como bem sabe o Caro Amigo, é nossa teoria sempre deixar algo por conhecer, assim a gente tem uma desculpa para, um dia, voltar aos locais que gostou (ah, ah, ah!).  

E por falar nas coisas que a gente gosta, ir a Roma e não ver o Papa é algo inconcebível, assim como vir à Dinamarca e não ir à Billund para ver a... mas temos que fechar a mala, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio




Billund, 23 de setembro de 2014.


Caro Amigo,


O mundo sempre esteve, está e estará cheio de artistas. Vez por outra aparece alguém que inventa algo que marca a humanidade para sempre. Assim foi a invenção da roda, da calça jeans, da camiseta, da havaiana, do leite em saquinho e um montão de outras coisas. O dinamarquês Ole Kirk Christiansen figura entre esses inventores, responsáveis por quase mudar o destino da humanidade com suas invenções, muitas vezes, aparentemente bobas. Ele inventou algo capaz de levar mentes infantis, e adultas, a arquitetar e construir maravilhas sem fim, como uma simples brincadeira, ele inventou o “lego”, que, em latim significa juntar, unir partes, o pequeno tijolo plástico.

De Odense a Billund  são 103 Km, uma cidade com mais de nove mil habitantes, que, direta ou indiretamente, trabalham para a Lego, quer na própria fábrica, quer no parque, a maravilhosa cidade da Lego, a Legolândia. Inaugurada em 1968, a cidade do faz-de-conta, onde nem tudo que parece é, foi construída com mais 59 milhões de tijolinhos coloridos, em uma área de 140 mil metros quadrados. Lógico que, num país de dezenas de castelos, de príncipes e princesas, de pequenas sereias, de grandes contadores de história, não poderia deixar de existir uma cidade de faz-de-conta, onde tudo pode acontecer.

 Dizem que se trata de um parque para crianças até doze anos, mas isso realmente não nos pareceu verdade, pois vimos gente de todas as idades, inclusive nós, e sem companhia de qualquer criança, de boca aberta e maravilhando-se como se crianças fossem, ou melhor, mais do que se crianças fossem. Mas com o que? Com um montão de pequenos retângulos justapostos? Não! Com um mundo todo construído em tamanho pequeno, a Lilipute de Guliver, onde é possível ir de Atenas aos Estados Unidos, da China à Alemanha em poucos passos e com muita diversão.

O parque tem três montanhas russas, casa assombrada, barquinho, navio de batalha, aquário, bate-bate, elevador panorâmico, trenzinho, montanha russa aquática, rafting com canoa e mais algumas coisinhas, tudo infantil, ou para criança grande, adolescente deve achar meio bobo. Tem até secador de gente, para quem se exceder nas brincadeiras, já viu isso? Além disso, há vários restaurantes, lanchonetes, lojas, cidade cowboy, sorveteria, loja da Lego (claro, ah, ah, ah!) e tudo que manda o figurino, o que, por si só, já bastaria.
Aí a gente se depara com a Miniland, um mundinho em miniatura, formado por réplica dos mais lindos e interessantes monumentos e cidades do mundo, com requinte de detalhes. Caminhando por lá encontramos, em miniatura, a fábrica da Wolkswagen, uma via férrea de Dusseldrof, os castelos Amaliemberg e Fredensborg, a central do Corpo de Bombeiros  e o Nyhavn de Copenhague, o aeroporto de Munique, Beverly Hills, o Canal de Göta, a Costa Escocesa, Amsterdã, Bergen, a Estátua da Liberdade, a Acrópole, o Capitólio e mais um montão de coisas e bonecos feitos de lego, até turista tinha por lá (ah, ah, ah!).
 Mas o sensacional, o maravilhoso, o “the best” (meio redundante, mas se muitos falam o plus a mais, nós também queremos dizer o the best) é que as miniaturas feitas com lego,  não só miniaturas, elas tem movimento, os trens realmente andam em seu trilhos; os barcos navegam em rios calmos, atravessando eclusas e pontes elevadiças..........; os caminhões trafegam por rodovias; os guindastes carregam carga; os balões flutuam; os aviões taxiam, enquanto o túnel de acesso de passageiros se movimenta; o foguete da NASA solta fumaça; a batalha de Star Wars prossegue. E nada ocorre em silêncio, tudo com seu respectivo som, para dar mais autenticidade. Ouvimos dizer que, para o ano que vem, tudo terá cheiro também (é mentira, ah, ah, ah!).
 É um passeio imperdível então, Caro Amigo, quando programar sua viagem para Dinamarca, não esqueça de atentar para o mês, pois, assim como os Jardins do Tivoli, a Legolândia fecha no inverno. É uma diversão para o dia todo e é bom levar um lanchinho, porque o preço dos restaurantes é um pouco salgado. O passeio vale cada centavo do custo do ingresso, que está por volta de cento e quarenta reais e com direito a entrar de graça na temporada de 2015, já estamos pensando em voltar no ano que vem. Está a fim Caro Amigo (ah, ah, ah!). 
Tentamos aproveitar o restinho do dia para conhecer Arhus, que fica alguns quilômetros adiante mas já era final de tarde e encontramos tudo fechado, a visita só não foi de todo perdida porque encontramos exemplares de peculiares telhados feitos de palha, usados em antigas construções.
Então voltamos para nosso “apzinho”, em Odense, para tomar uma tacinha de vinho e preparar o jantar, enquanto programávamos o dia seguinte.

Beijos,

Sayo e Claudio



Egeskov/Ribe,  25 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Não longe de Odense, há 20km, está um castelo, um dos mais famosos do país. Aliás, ele é muito mais que um castelo, é um verdadeiro parque de diversões e, se o Caro Amigo for pela estrada 167, em direção à Kvaerndrup, o programa estará completo, pois ela segue por cenários de um país tranqüilo e rural, com pomares e plantações,  pitorescas casas de telhados de palha com madeira cruzada no topo, praças, jardins, igrejas, pequenas vilas imóveis, cidades de brinquedo,  legolândias.

O Castelo de Egeskov é uma construção renascentista, datada de 1554,  um dos mais bem preservados da Europa e está envolto em várias lendas, uma delas é que foi derrubada toda uma floresta de carvalho para construir os alicerces que o mantém sobre as águas, daí o seu nome, que significa justamente  floresta de carvalho.

Outra história é sobre um boneco de madeira, que fica sobre um travesseiro, num canto do sótão, próximo ao local onde há a exposição de brinquedos antigos, dizem que se ele for removido do local o castelo desabará na noite de natal; nós o vimos, é algo meio tétrico.

O que sabemos de fato é que, hoje, o castelo pertence a um conde, Michael Ahlefeldt-Laurvig-Bille, que o herdou de seu pai, uma figura excêntrica que mandou fazer uma armadura, de cavaleiro medieval, para si.

Mas, lendas à parte, o castelo por si só já vale uma visita, ele é de tijolos marrons, tem as cúpulas de metal esverdeado, como grande parte das grandiosas construções que encontramos pela Escandinávia, e parece flutuar sobre um espelho de água. As salas abertas à visitação estão muito bem decoradas, possibilitando conhecer costumes e um pouquinho da opulência com que viviam os nobres.   Merece destaque a sala de caça e sua coleção de armas, com algumas caixas com pares de pistola para duelar (pensávamos que era coisa de filme, ah, ah, ah!); e por todo castelo há elegante mobília e fina porcelana, sofisticação em cada pequeno detalhe.

O grande destaque do Egeskov é uma casa de bonecas, Titania´s Palace, que foi construída por um irlandês para sua filha, entre os anos de 1907 e 1922, a coitadinha nem desfrutou, já estava grande quando ficou pronta. É a réplica de um palácio, que foi adquirido pela Lego e emprestada ao Egeskov. A perfeição e a riqueza de detalhes são de impressionar e de deixar qualquer criança com água na boca, imaginando-se arterando por aqueles minúsculos corredores e quartos.

E nos jardins há muito mais para ver e fazer. Visitar o Museu de Trajes e, quem, sabe escolher seu vestido de noiva, bem à moda antiga.

Perder-se pelos labirintos de cerca viva. Apreciar o jardim de rosas ou o só dedicado a brincos-de-princesa. Comer algo na lanchonete ou piquenicar Roubar algum temperinho na horta que abastece o castelo. 

Conhecer a coleção de carros, motocicletas, caminhões de bombeiro e de aviões.

E, finalmente, se ainda não estiver cansado, praticar arvorismo, em pontes suspensas, entre as árvores do bosque, em 100 metros de passarelas, suspensas a mais de dez metros.

Ribe, há 128km de Odense, é a cidade mais antiga do país, data dos anos 700, quando os vikings ainda viviam por aqui. Por isso, antes mesmo de ver a cara da cidade, fomos ao Vikingcenter, que fica  nas aforas da cidade.

É a reprodução de uma cidade viking. É possível entrar nas casas, conhecer as construções, famílias e o modo de vida, as camas cobertas de pêlos de animal; o fogão no meio do cômodo, sobre o qual pende um suporte para secar carne e pescado, modo similar ao de muitos indígenas brasileiros; os legumes e cereais utilizados na alimentação; os trabalhos de tecelagem e agulha. Aí descobrimos que é de origem viking o interessante telhado de palha que vimos em Arhus.

Os ofícios também estão retratados. É possível ver ferreiros, marceneiros, vidreiros, carpinteiros, padeiros e fazendeiros todos trabalhando em suas devidas funções; confeccionando produtos e objetos que, por vezes, são vendidos aos turistas. Durante o dia ocorrem dramatizações, com lutas, e apresentações de falcões e corujas.

Já na cidade, em seu centro histórico medieval, as casas com paredes tortas, tijolo carcomido e vigas de madeira escurecida, quase petrificada, não negam a sua idade, nem escondem sua beleza. É para caminhar e admirar, parar para um café e admirar novamente, sem qualquer pressa, sem trajeto definido.

A Catedral, mais antiga do país, internacionalmente conhecida, está localizada em uma praça que lembra a Catedral de Siena, na Itália. É possível subir em sua torre para ter uma visão da cidade e das imediações, além de visitar seu museu.

É uma igreja, no mínimo curiosa, pois, em parte, lembra a Catedral de Córdoba, com colunas, arcos em forma de ferradura, pintados com quadrados brancos e marrons, um toque românico ou mudejar. Mas ela apresenta também traços góticos, com arcos em forma de mãos postas. Seu púlpito não é tão glorioso como muitos que já vimos, mas tem colorido e formas bem agradáveis de observar.

Sua maior polêmica está no altar, por conta de trabalhos executados por Carl-Henning Pedersen’s, entre 1982/1987, sete mosaicos com motivos bíblicos, os afrescos do teto e os vitrais, que  causam controvérsia até hoje; algo estilo psicodélico, que faz até lembrar Gaudí. Em nossa modesta opinião, eles, no mínimo, não combinaram com o conjunto da obra.

E roubando um fruto da árvore proibida, uma maçã vermelha como a da Branca de Neve, nos despedimos da Dinamarca e da nossa adorável casinha de Odense. É hora de seguir para... vamos parar para ver o que aconteceu, está o maior congestionamento na estrada, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio




Hasbergen (Alemanha), 27 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Em verdade é hora de começar a voltar para casa... Já sabemos... também achamos que é cedo, mas alguém na CRKTour tem que trabalhar e, parece, que somos nós (ah, ah, ah!).

Mas ainda temos uns poucos dias para aproveitar, fazer umas comprinhas, pois já estamos com síndrome de abstinência, e jantar fora, pois já estamos magrinhos (ah, ah, ah!). A viagem pela Escandinávia foi maravilhosa, o Caro Amigo não achou? É bem verdade que foi só um aperitivo, não vimos nem metade de tudo que há para conhecer, mas foi o suficiente para amar e querer voltar. Principalmente, foi uma viagem para aprender e mudar a rotina, mudar (?) alguns conceitos consumistas ou, ao menos, verificar que dá para sobreviver sem eles. Conseguimos viver com metade da mala que levamos, porque o verão nunca chegou, o máximo que conseguimos, uma tarde, foi 23 graus e por nada mais que duas horas; assim que tudo que levamos de verão, ficou em sacos plásticos, embaixo do banco do carro, para, pelo menos, não atrapalhar.

Tenho que confessar à Cara Amiga, que sei me compreenderá, que até gostei do negócio de jantar em casa. Não que não ame jantar fora, adoro! Acontece que acordo muito cedo, em geral antes das seis, é quando escrevo, se não o fiz no carro, durante o trajeto, e é quando verifico a programação do dia. Assim que, à noite, depois de ralar o dia inteiro (porque passear dá trabalho, ah, ah, ah!), estou cansada, tomo banho e passo vinte mil cremes, um para cada pequena parte do corpo. Se não for sair, faço dois rolinhos no cabelo (que agora cismei de usar cacheado) agarro uma taça de vinho, ponho a roupa de casa e, mesmo que vá cozinhar, já estou relaxada.

Acontece que, ao Kuc, não basta sair para jantar, num cantinho qualquer de um pequeno e simpático restaurante, que sirva uma comida saborosa e ponto, preferencialmente o primeiro que encontrarmos. Ele gosta de fazer do jantar o maior acontecimento do dia (ou será martírio, ah, ah, ah). Então, quando saímos para jantar, tenho que me vestir a altura  e iniciar a via sacra, pois ele caminha por todos os restaurantes da cidade, analisa seus cardápios, para ver se há realmente comida regional, como estão os preços e se é um lugar hiper-super. Depois, indeciso, ele volta a repetir todo o roteiro, até escolher onde comer. Aí vem o drama da mesa, que deve estar muito bem colocada, preferencialmente às margens do Sena ou do Nilo; por vezes, mudamos de mesa mais de uma vez.

Chega o cardápio, outro estresse, porque ele me pergunta sobre todos os pratos que lá constam, independentemente dele estar escrito em javanês e de eu nunca ter estado no país; até que eu escolha o prato dele e o eu, que deverá ser a segunda opção dele, para que ele satisfaça sua vontade duplamente, comendo uma parte do meu. Horas depois, pratos escolhidos, chega a hora da foto do casal, o pobre do garçom tem que fazer das tripas coração para entender as explicações, em português, de como mexer na câmera, de que ângulo deve ser feita a foto e a que distância, minha cara até dói de tanto fazer pose e a foto não fica boa. Mas ainda falta a foto de cada prato individualmente, que tem que ser analisada para conferir se ficou exatamente como o esperado, sob pena de ser feita nova foto. A essa altura o restaurante inteiro já está olhando para nossa cara, se bobear até o pessoal do restaurante ao lado. E a comida? Já congelou. Então, Cara Amiga, é melhor cozinhar qualquer engasga gato, já que ele não ousará reclamar do prato que eu fizer, e lavar a louça (ah, ah, ah!).

Confesso, ainda, que me parece bestial a banalização do ato de fotografar que chegou com a máquina digital. Chega à beira do ridículo, que os portadores de máquinas fotográficas se julguem seres superiores aos demais mortais, com licença para incomodar quem quer, simplesmente, apreciar uma imagem ou um ponto turístico, julgando que tem prioridade sobre os demais semoventes. Qualquer dia eles vão achar que são como o próprio 007, que tem licença para matar e vão sair matando quem se atreva a impedi-los de tirar as fotos tão sonhadas (ah, ah, ah!). Chego a achar que é uma invasão de privacidade ser fotografado a todo momento e que é uma enorme perda de tempo parar para tirar foto de tudo o que se vê. Não que não goste de fotografias, julgo ser uma maravilhosa recordação, desde que dentro dos limites do razoável e de que seja realmente uma fotografia, não algo que ficará enfiado dentro de um computador e que ninguém verá ou, sequer, se lembrará. Infelizmente, confesso que vivo com um aspirante a 007.

Voltando à viagem, paramos para dormir pelo centro da Alemanha, em Hasbergen, o trânsito, de sexta-feira, nos atrapalhou um pouco. Ao menos encontramos um daqueles hotéis com preço legal (55 euros) e até um restaurante que nos surpreendeu, em uma cidade tão pequena.

Lógico que o Caro Amigo, que vem passando uma fome danada, está louco para saber o que comemos, muito simples, um 66- SCWEINRÜCKENSTEAK (mit Speck, Zwiebeln, Pfifferlingen, Champignons, gebackener Kartoffel und Salatteller), que nada mais é que uma bisteca de porco grelhada, coberta com champignons refogados com cebola e bacon, e acompanhada por batata recheada com queijo tipo cottage.

E um 78 – SCHWEINELENDCHEN MIT GORGONZOLAKÄSE (überbacken, Bohnen im Speckmantel, Röstis und gem. Salatteller), que é filé de cordeiro grelhado, com molho de gorgonzola, acompanhado por feixes de vagem amarrados com bacon e pequenas batatas rosti.

Uma salada de entrada (com aquele pepino agridoce e molho de yogurt), pão, patê e cerveja alemã para acompanhar. E tudo pelo preço módico de 31 euros, voltamos à Europa barata, nem no Brasil comeríamos comida com essa qualidade por esse preço (ah, ah, ah!).

E melhor que o jantar, só as compras, o centro comercial da cidade é novinho, mal acabou de inaugurar. Em verdade, encontramos uma loja inaugurando, com direito a coquetel, champanhe, descontos e sorteio.

Encontramos até nossos mercados prediletos, Lidl e Aldi. Foi a maior diversão, afogamos nossas mágoas pelo fim da viagem, não queremos nem ver as lágrimas na hora de ter que enfiar as coisas na mala, mas essa é uma equação que resolveremos depois (ah, ah, ah!).

No início da viagem, passamos por uma graciosa cidade, na fronteira da França com a Bélgica, Givet, em Ardenne, não paramos para dormir porque estava perto de Paris, uns 280 km, e estávamos ansiosos por chegar na Escandinávia. Nada melhor que parar agora e apreciar com mais vagar a pequena cidade, pois só precisaríamos chegar a Paris no domingo. Tínhamos cerca de 420 km para rodar, deixamos Hasbergen perto do meio dia, imaginando que só estaríamos nós na estrada. Mas não foi bem assim porque... vamos fazer uma parada estratégica  na área de descanso, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio 




 Givet (França), 28 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

Havia um jogo importante, lá para os lados de Dortmund e a estrada não estava tão veloz quanto gostaríamos; porque metade da Alemanha parecia querer assisti-lo. Na área de descanso, encontramos uma turma de torcedores que vinha em uma van e também fizeram uma parada estratégica, mas a deles foi para tomar uns tragos. Brincaram com a gente falando em francês, pois a placa de nosso carro é francesa, tivemos que responder que éramos brasileiros e, mostrando nossa boa educação, parabenizá-los pela Copa do Mundo. Pena que não fotografamos as caras deles, ficaram de boca aberta, preferimos acreditar que não foi por nosso inglês ser incompreensível, mas sim por receber cumprimentos de brasileiros  e para arrematar ainda os presenteamos com uma caneta do Fuleco, comemorativa da Copa de 2014. Se o time deles ganhou o jogo não sabemos, achamos mesmo que eles nem se importaram, pois o dia deles estava ganho (ah, ah ah!).

Casas de pedra escurecida, desgastadas pela erosão do tempo, telhados negros, parece que a primeira guerra, que este ano completa seu centésimo aniversário, acabou de ocorrer, pois o tempo parou por aqui. Qualquer colorido mais exuberante fica por conta do verde dos bosques, do azul do céu e das flores, que estão por todos os lados, trabalho paciencioso de muita gente.
 
É a fronteira da Bélgica com França, Dinant e Givet. Rota das Fortificações, margem do Rio Meuse e suas eclusas. Foi por aqui que os alemães entraram, apesar da ferrenha resistência e da Bélgica ter destruído suas pontes na tentativa de impedir o avanço.

Demos uma rápida parada em Dinant, que estava em festa, comemorando o bicentenário de nascimento de Adolphe Sax o inventor do saxofone. Visitamos a catedral, gótica, quase negra, com vitrais delicados como um rendado e onde um anjo, pousado sobre o púlpito, com trompete na mão, aprecia querer anunciar algo.

Em Givet, uma simpatia, caminhamos pela cidade admirando-a e procurando um hotel. Foi muito fácil, encontramos opções, acabamos ficamos no Ibis, a 52 reais (www.ibisbudget.com). Após um banho rápido, saímos para nosso jantar de despedida da viagem, não sabíamos como seria nosso domingo, pois tínhamos que devolver o carro à noite. Andamos um pouco pela cidade, mas não encontramos nada que atendesse às especificações (ah, ah, ah!). Pegamos o carro e, entre Givet e Dinant, encontramos um local legal, o salão estava lotado, tudo reservado, mas havia mesa no terraço, parece que ninguém queria se sentar à beira do rio, estavam com frio, mas nós, como o Caro Amigo bem sabe, queríamos (ah, ah, ah!).

O Kuc estava doido para comer o prato típico da Bélgica, que é mexilhões com batatas fritas, escolheu-os preparados com alho, salsão, cenoura, vinho branco, cebola e creme. Como de costume, os recebeu numa grande caçarola, em cujo fundo sobra uma deliciosa sopa.

Eu escolhi um menu (uma combinação de três pratos pré determinados) que incluía entrada, que escolhi escargot, preparada com champignon, creme e bacon; o prato principal foi osso buço com talharim; finalizando com uma saladinha com queijos (gorgonzola, brie e gouda). Vinho, uma taça de moscatel (cortesia do restaurante) e um café, tudo perfeito.

Às cinco da manhã, levantei para tentar colocar tudo dentro das malas e bateu o arrependimento, chegou a hora de chorar, era uma missão totalmente (?) impossível, as coisas somente caberiam se arrumássemos uma máquina de miniaturizar. Será que já inventaram? Não que tenhamos comprado mais que de costume, acontece que compramos coisas mais volumosas e, além do mais, não costumamos trazer malas grandes, trazemos uma tipo mala de bordo, de fibra, para carregar as garrafas de pinga, uma pequena e duas médias, em duas delas conseguimos chegar perto dos 32 kg permitidos, as outras duas ficam pelos 20 kg, assim que tínhamos direito a peso, mas não tínhamos espaço para colocar as coisas. O jeito era sair para caçar uma mala maior, mas domingo, na França ... a onde?

Perguntamos na portaria do hotel e Givet estava descartada.  Há alguns quilômetros outra cidade, mercado aberto, mas era pequeno, não vendia mala. Outra cidade, mas o Carrefour fechava 12:30 horas, chegamos 12:20 e já não era possível entrar.
Começávamos a pensar em abandonar parte das coisas. Quem sabe o fogão elétrico portátil? Mas ele é tão fininho, não pesa nada, parece uma placa de vidro, só passar um paninho e está limpo, poderemos até cozinhar na varanda. Os chocolates? Mas eles são tão gostosos, os belgas são sensacionais. Os marzipans? Mas são de Lubeck, onde, dizem, se fabricam os melhores do mundo. Pensamos até em passar na casa dos amigos e deixar alguma coisa, que não fossemos precisar, ou mesmo as coisas que sempre trazemos, assim já estariam na Europa no ano que vem. Se não encontrássemos a mala seria a solução.

Toda região da Rota das Fortificações é um sonho, dá para ficar meses explorando, principalmente se for navegando, um de nossos planos para o futuro, pois é possível alugar um pequeno barco, cabinado, e viajar por rios e canais da França. Agora, infelizmente, só tivemos tempo para uma rápida olhada.

Ainda atrás da mala e em direção à Paris, entramos na região de Champagne. Paramos em Reims, uma linda cidade, quando o Caro Amigo estiver pela região não deixe de conhecer, já estivemos lá duas vezes, dessa só paramos para procurar a mala. Havia uma feira, mas só encontramos sacolas, sem rodas, não dá para carregar 32 kg no muque, já somos velhinhos (ah, ah, ah!). O centro comercial da cidade estava fechado.

Então chegamos a Paris, passava das três da tarde, e sem a famigerada mala. Lembramos que há um bairro de imigrantes, o Kremlin, que tem feira no domingo e muitos mulçumanos que abrem suas lojas. Demos o endereço para a Eva Maria e estávamos a caminho ou quase lá, não sabemos ao certo, quando nos deparamos com o cruzamento da Avenue Porte de Montreuil com Boulevar Davout. A coisa estava um verdadeiro pandemônio, os guardas ensandecidos, mandavam o lápis em tudo quanto é carro, o mercado de Marrakesh não chegava nem aos pés daquela bagunça. Parecia qualquer lugar, menos Paris, talvez algum país africano, Turquia, aliás, a confusão era tanta que, talvez fosse a Faixa de Gaza ... chegou o jantar,  contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio




Paris, 29 de setembro de 2014.

Caro Amigo,


Havíamos chegado a Paris 20, algo, no mínimo, peculiar, mas no exato local onde se pode comprar uma mala maior no domingo à tarde, justamente o que precisávamos e que, algum dia, algum Caro Amigo pode precisar, anote o endereço. Tinha mala de tudo quanto é tamanho, cor, modelo e marca. Aliás, vendia-se de absolutamente de um tudo, tinha gente vendendo até a mãe do cunhado (ah, ah, ah!). Compramos uma enorme, assim poderíamos colocar a pequena dentro e completar com as outras comprinhas; não compramos nada caro porque desistimos de ter malas boas, pois eles as destroem no avião, sempre chegamos com alguma delas quebrada..

Marchamos para o hotel. Chegando lá, a primeira coisa que fizemos foi fechar as malas, vai que precisássemos voltar a Gaza para compra mais uma (ah, ah, ah!). Como teríamos que entregar o carro naquela noite, nas imediações do Aeroporto Charles de Gaulle (CDG), de onde partiríamos no dia seguinte, reservamos, com bastante antecedência o Ibis Aeroport, para facilitar as coisas, pois nosso vôo decolaria às 07:20 da manhã. E sobre o horário do vôo, gostaríamos de dividir uma experiência com o Caro Amigo.

Em nossas andanças, experimentamos várias opções. Quando já se conhece alguma grande cidade, é legal fazer escala lá, chegando cedo e partindo no princípio da noite. Assim dá para passar o dia e rever, rapidamente, alguma coisa conhecida. Fizemos isso em Madrid, para rever o Museu do Prado, almoçar no nosso restaurante predileto e tomar “unas cañas” no “Museo del Jamón”. Também fizemos para comer um joelho de porco em Munique, na maior cervejaria do mundo, HB e para passear na rambla em Barcelona.

Em nossas últimas viagens, temos optado por voar durante o dia. A princípio, pode parecer um pouco estranho, mas é legal. A primeira vez, o fizemos por acaso e repetimos por achar interessante. Como o Caro Amigo deve ter notado, chegamos em cima da hora de voltar a trabalhar, para falar de modo gentil, pois, em verdade, chegamos um pouco atrasados. Então, temos que chegar, na medida do possível, inteiros. Assim, na noite anterior ao vôo dormimos legal, pois ele parte pela manhã, chegando ao Brasil à tarde, de modos que, à noite, estamos em Santos, onde tentamos dormir uma boa noite de sono. No dia seguinte, estamos, na medida do possível, até que inteiros e não sofremos muito com a mudança de fuso.

Agora voltando ao Ibis do aeroporto, também é uma ótima opção, porque simplesmente é possível ir caminhando para o embarque. O terminal nº 3, fica pertinho, basta uma pequena caminhada. Para os terminais nºs 1 e 2, basta tomar o trenzinho, que também sai das imediações do hotel.

Mesmo com quatro malas grandes, duas de mãos (bem pesadinhas) e mais as bolsas pessoais (nada leves), fizemos o trajeto com os pés nas costas. Então, não é preciso táxi. O preço do hotel não é dos melhores, cerca de 140 euros, mas se a reserva for feita com mais de quinze dias de antecedência, o preço cai para 83 euros. E para completar, ainda há um português na recepção, gentilíssimo, nos deu o estacionamento de cortesia, que as Caras Amigas solteiras não podem deixar de conhecer, Cédric, um gato (ah, ah, ah!). Deixamos nosso cartão, pois ele disse que pretende, um dia, morar no Brasil.    

Outra coisa legal é que, naquela noite, fomos conferir o caminho até o local de embarque, para não termos sobressaltos na manhã seguinte, e já fizemos o “check in eletrônico”, em terminais de computador, que emitem o cartão de embarque e as etiquetas para a bagagem. O interessante é que a máquina pede o passaporte, na página da foto, realiza a leitura por meio de um scâner; em seguiada, aparecem todos os dados do vôo e ela pergunta (a danada fala nove línguas) quantas bagagens o passageiro tem. Com isso, na manhã do vôo, não precisamos pegar aquelas imensas filas para fazer o “check in”, perguntamos à mocinha que estava na recepção da fila, indicando que já tínhamos os bilhetes e indagando sobre as duas malas de 32kg permitidas aos brasileiros, pois essa é uma prerrogativa de poucos países no mundo (Brasil, USA, Venezuela e Senegal) e aí residia nossa dúvida sobre o “self check in” ou “check in eletrônico”. Ela nos indicou o guichê para despachar as malas, sem fila alguma, e informou que não haveria qualquer problema quanto ao peso das malas, exceto se excedessem 34kg.

Mas ainda havia um detalhe, que nos deixava reticentes quanto ao hotel Ibis e dentro do aeroporto. É que gostamos de fazer um jantar de despedida para fechar a viagem. Sem carro e no Ibis, que está para um hotel como o MC Donald está para um restaurante, algo previsível, comível, mas sem glamour. Ainda mais no fim do mundo do aeroporto! Também temos que dizer que foi uma boa surpresa, pois o local, onde fica o hotel, é denominado Ville, e há algumas opções de restaurantes, inclusive, uma área de máquinas de venda de comida, com microondas e mesas, onde se pode fazer o maior piquenique.

Optamos por jantar no Restaurante Sud et CIE, e ficamos bem satisfeitos. Os preços não eram tão baratos como o jantar da noite anterior. Aliás, restaurantes de aeroporto nunca são, mas também não eram caros quanto o Aeroporto de Guarulhos, e a comida estava saborosa, bem temperada, com gosto de comida de verdade. O Kuc escolheu uma Parrillada de Frutos do Mar, marisco, camarão, bacalhau (fresco) e salmão, servidos numa prancha quente, acompanhado de sortido de legumes e batatas. Ele só lastimou que a quantidade fosse pequena.

Optei, novamente, por um menu de 24 euros. A entrada era Carpaccio de Salmão; prato principal, Bacalhau Ensopado com risoto; sobremesa, Creme Bruleé e uma garrafa de água com gás, poderia ser uma cerveja ou uma taça de vinho, mas já havíamos pedido uma garrafa.  Estava uma delícia.

 Às 04:30,  levantamos e, após uma banho, repetimos o trajeto, agora com as malas e tudo correu muito bem. Voamos pela KLM, o cardápio não estava tão interessante quanto o da vinda, almoçamos frango e jantamos pizza. Mas o serviço de bordo é muito bom, vinho à vontade, três refeições, chocolates, guloseimas e sucos sempre à disposição. A classe econômica até que tem um espacinho razoável. Se não der para dormir, tem uma boa seleção de filmes e, como era aniversário do Kuc, ganhamos até... estamos aterrissando, temos que apertar os cintos,  contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio





Santos, 30 de setembro de 2014.

Caro Amigo,

A velha caçarola, meio amassada, com uma alça mais feia que ela própria, só continha arroz, que fora feito e trazido desde uma outra parada. Foi assim que nos apercebemos delas! Da caçarola, com arroz, e das garotas. Uma interrogação, de imediato, surgiu em nossas mentes. Afinal, quase ninguém come arroz na Europa! 

Em um pequeno prato de sobremesa, uma mais pequena parte dele foi colocada e aquecida no microondas. Eram duas, as garotas. Uma delas não chegava aos trinta anos, cabelos castanho, querendo ser chanel, olhos claros que, de onde observávamos, não conseguíamos precisar a cor. A iluminação do refeitório não era tão boa e a noite já havia caído, mais de dez horas. Mas estávamos seguros de que nos observavam, tanto quanto nos a elas. Além do arroz, um pequeno pedaço de queijo, não maior que dois dedos, e uma lata de cerveja.

A outra um pouco mais velha, cabelo um pouco mais claro e um pouco mais curto, uns poucos anos a mais, sua cerveja estava em uma pequena garrafa e era bebida no próprio gargalo. Acompanhando aquele mesmo arroz, o da velha caçarola, não mais que três fatias de salame, que tirou de um pequeno pedaço, que receberá de um companheiro, que passou rapidamente, trocou umas poucas palavras e saiu.

Foi quando nossa dúvida aumentou, pois nos apercebemos da língua que falavam, não que fosse tão estranha, afinal, tudo em volta era estranheza. É que seu estranho nos soava familiar. Arrisquei que eram romenas. Claudio afirmou que eram russas.

As parcas misturas, queijo e salame, não dividiram, só o arroz e umas poucas batatas de um tubo de Pringles, não todas, guardaram o restante. Enquanto nos observavam, e nós a elas, volta o amigo e conversa mais um pouco, mas não come. Pelos trajes, não se intimidavam com o frio. Seguimos trocando olhares.

Quando já se tinham levantado, posto sobre a caçarola uma tampa, mais velha ainda, antes de voltar a pô-la na geladeira, e estavam prestes a agarrar suas coisas e partirem, sentimos que a última chance nos escapava entre os dedos.

Então, rapidamente, perguntamos, à de cabelo quase chanel, que mais nos fitava: Where are you from? Ao que nos respondeu,  como se uma criança fora, entre meios sorrisos encabulados, de quem estava doido para falar, e pequenas sacudidelas de corpo, de quem quer saltitar: Ukraine.

Milhões de outras perguntas vieram a nossas cabeças. Mas ela, como uma criança, que ninguém consegue calar, seguia avidamente contando algo, que o forte sotaque quase não nos permitia entender, mas a educação e o prazer de vê-la tão feliz  em contar suas façanhas, nos permitia sorrir, balançar a cabeça em aquiescência e, ao final do discurso, desejar uma boa viagem.

E muito mais dessa cena teríamos a contar, mas nada, nunca, seria, ou chegaria, tão perto do real como o que agora povoa a mente do Caro Amigo, que conosco compartilhou tão auspiciosa experiência, a proximidade, o interesse, a preocupação, o olhar compassivo para quem está ao nosso lado.  
Uma vez mais, como sempre acontece, com a graça do bom Deus, tivemos o imenso prazer de visitar lindos lugares, rever queridos amigos e conhecer pessoas admiráveis, como já lhe contamos, que cruzaram o nosso caminho e contribuíram para tornar nossas vidas ainda mais felizes; além de contar com a excelente companhia do Caro Amigo, lógico!

Obrigado por escolher nossa empresa para sua viagem (ah, ah, ah!)!

Hasta la vista!

Beijos,

Sayo e Claudio

PS – E quando já tínhamos lavado nossa louça e observávamos um pouco mais, bebericando um pouquinho mais de vinho, elas voltaram, com suas canecas de metal, para o chá. E ainda pudemos dar-lhes dois bilhetes de ônibus, que nos sobraram, e dizer: Nice to meet you. Um prazer conhecer vocês!

O que ganhamos no vôo? Já íamos esquecendo de contar, foi champanhe.





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