terça-feira, 6 de outubro de 2015

EXPEDIÇÃO URUGUAY - 2010


Santos, 12 de dezembro 2010.

Caro Amigo,

Ouvimos dizer que, no mês dezembro, a cidade de Gramado fica ainda mais bonita, alegre e iluminada, tudo porque Papai Noel, juntamente com suas renas, duendes, gnomos, fadas, anjos e demais seres fantásticos, mudam-se para cidade, para fugir dos rigores do inverno no Pólo Norte. Ouvimos dizer até que, à noite, é possível até encontrá-lo comendo um bom churrasco, e tomando uma cervejinha, em algum restaurante da cidade.

Assim, em nossa constante ânsia pela VERDADE e JUSTIÇA, após longa análise, concluímos que meticulosa investigação, “in locu”, deve ser iniciada imediatamente, a fim de que não reste comprometido o futuro da humanidade. Portanto, e também com o legítimo intuito de cumprirmos nossa honrosa, longa e árdua META dos 100.000.000.000.000.000 Km viajando (ah, ah, ah!), resolvemos colocar, novamente, nossos pés na estrada.

Aproveitaremos para dar um pulinho no Uruguai, pois dizem que o país é sensacional, tem uma das melhores carnes do mundo, um excelente vinho (tannat), um povo muito hospitaleiro, além de belíssimas praias, como Punta Del Leste.

Vem com a gente!


Sayo e Claudio




Santos, 13 de dezembro de 2010.


Caro Amigo,

Para que você, que irá nos acompanhar em nossa árdua jornada até os confins da terra, não se perca da caravana, estamos mandando um mapa, com o roteiro da expedição.



---------Terrestre em carro (Pick-Up S-10 Cabine Dupla).

Compre reserve seu lugar, faça as malas (pode levar tudo que quiser, o carro é grande) pegue o passaporte, avise os familiares, desligue o gás, regue plantas, ponha o sapatinho na janela, deixe o gato com o vizinho e as crianças na casa da vó (mas não conte que visitaremos Papai Noel), pegue umas nozes e uma Bohemia gelada (pode até ser um champagne, afinal é Natal!), escolha uma poltrona confortável, ligue o computador e VEM COM A GENTE! 

Aproveite para enviar alguma dica para tornar nossa viagem mais interessante. Talvez alguma cidadezinha no sul, que já visitou e achou incrível; um restaurante, que viu em alguma revista de turismo; um lugar que você gostaria de conhecer, mas ainda não teve tempo; ou mesmo o endereço de sua adorável tia uruguaia, que faz um delicioso “chivito”, teremos imenso prazer em visitá-los, conferir e contar tudo, nos mais mínimos e prazerosos detalhes.

Beijos,

Sayo e Claudio



Gramado, 16 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Estrada chuvosa, neblina, casas de madeira, araucárias, pinheiros, pinos, hortênsias azuis e brancas, estrada ruim, pedágios, frio, frio e mais frio. A isso ia se resumindo nosso primeiro dia de viagem. Por volta das 17:00 horas, fomos obrigados a aceitar o fato de que não jantaríamos em Gramado, como era nossa intenção quando planejamos a viagem; já que comemorações da noite anterior nos obrigaram a iniciá-la umas horas depois do previsto.

Pelo menos o tempo tinha melhorado, já se via um pouco do azul do céu e o sol querendo aparecer, foi quando também vimos uma placa que indicava uma tal de “Rota da Amizade”. E, entre as cidades por onde ela passava, Treze Tilias, da qual já havíamos escutado algumas estórias contadas por amigos. Ficava a uns 130 km, à oeste, da nossa estrada (BR 116), que seguia rumo ao sul; mas parecia ser uma boa opção para dormir e conferir o que disseram os Caros Amigos. Seguimos então rumo a ela, passando pela “Estrada da Maçã”, já com uma perspectiva totalmente nova, entardecer bonito, lagoas, mais hortênsias, simpáticas cidadezinhas, macieiras carregadas de maçãs quase maduras, milharais, já íamos até reclamar que o sol estava ofuscando nossos olhos (ah, ah, ah!).

Treze Tilias foi fundada em 13/10/1933, por Andreas Thaler, um austríaco que veio da região do Tirol, juntamente com outras famílias, e que fizeram da pequena cidade uma miniatura de sua amada terra natal. Casarões brancos com varadas de madeira escura; floreiras cheias de gerânios; campanários sobre os telhados, com um galo indicando a vontade de levantar cedo e trabalhar; gente de pele e olhos claros, com um sotaque carregado, muitos conversam em alemão. A estreita estrada entra pelo portal da cidade, em meio a canteiros floridos, passando por lindas casas, hotéis, pela praça e prefeitura, dá até para acreditar estar em alguma pequena cidadezinha austríaca.

Os arredores da cidade são diversão garantida para alguns dias, com termas, alambique, trilhas, vilas de colonização alemã e italiana, onde se pode experimentar produtos como vinhos, embutidos, massas, geléias, licores e doces.

Deixamos as malas no Hotel Dreizehnlinden, que significa Treze Tilias em alemão, a proprietária é de Salzburgo, terra da Noviça Rebelde, ficou muito feliz ao saber que já visitamos sua linda cidade algumas vezes.

Corremos para jantar, afinal a cidade estava com poucos turistas, portanto os restaurantes não ficariam abertos até tarde. Escolhemos o Kandlerholf, cuja proprietária é uma gorda vovó austríaca que, como não poderia deixar de ser, encheu as paredes com fotos do Tirol, florestas nevadas, cantores em trajes típicos, em meio a pesadas mesas de madeiras e cadeiras com entalhe de coração, toalhas floridas, vasos e utensílios que, provavelmente, seu avô trouxe quando veio para o Brasil; restaurante onde nunca mais pretendo voltar (Sayo) e vou explicar ao Caro Amigo o motivo.

Escolhemos nossa mesa e logo uma garçonete, vestida com traje típico nos perguntou se iríamos jantar e o que beberíamos. Confirmamos que sim e, a conselho da proprietária encolhemos um vinho colonial Bordeau, vinho artesanal feito na região. O vinho veio, bebemos quase metade e nada de cardápio ou qualquer outro comentário sobre o jantar; Claudio já coçava a cabeça, arregalava o olho e mexia-se na cadeira sem parar (normal). Chega, então, a garçonete com uma cestinha de pão, azeite, mostarda e um molho especial. A fome era grande, atacamos o pão com azeite. Daqui a pouco ela volta com dois pratos contendo um caldo de carne quase incolor, salpicado de salsinha e uma bola, parecida com uma almôndega. Já conhecíamos a sopa de nossas viagens pela Áustria e Alemanha, a almôndega é feita de batata, farinha e lingüiça defumada. Uma delícia!

Volta a garçonete com uma enorme bandeja cheia de tigelinhas com: beterraba, repolho, salada de batata, alface, tomate, vagem, arroz (acho que andaram abrasileirando o prato). Mais tigelinhas: goulash (ensopado de carne), chucrutes e uma massa caseira de formato irregular, sem molho, coberta por cebola frita. Já tínhamos certeza de que não daríamos conta, quando ela surgiu com uma enorme travessa, onde jazia um imenso joelho de porco, ladeado por duas salsichas, uma branca e outra tipo Viena. Foi a morte.

Quando já havíamos desistido de dar conta da comida, já pensávamos em pedir a conta e nos arrastarmos até nossa cama, chega a mocinha com a sobremesa, torta de maçã morninha (strudel), uma bola de sorvete de creme e algo que ela chamou de creme de leite, mas na verdade era uma nata de textura entre a manteiga e o chantily, com uma leve pitada de açúcar, e que derretia na boca como nuvem. Tivemos que comer, mas também nunca mais volto lá, engordar todo o previsto para as férias em um só jantar e inaceitável (ah, ah, ah!).  

No dia seguinte, dez quilos mais gordos, rumamos para Gramado, ainda pela chata, cansativa e cheia de pedágios BR-116. Encontramos a cidade lotada de turistas, mas não foi só isso, ela estava mesmo é lotada de... temos que ir ao teatro, ainda temos que tomar banho, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio


Canela, 17 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Ousamos até dizer que Gramado virou uma imensa capital nordestina, nunca vimos uma concentração tão grande de turistas nordestinos, devem vir atraídos pelos encantos do frio (imagine usar cachecol e sobretudo, tão na moda, impossível no calor nordestino), da paisagem serrana, dos fondues, dos chocolates (que lá, com certeza, só podem ser bebidos), de um Natal Europeu. Foi difícil encontrar hotel, pois, os poucos que tinham vaga, tinham também preços exorbitantes, já que nessa época do ano o valor das diárias dobra, mas, finalmente, encontramos uma pousada simples, com melhores preços, bem pertinho, do centro.

A cidade está um espetáculo, coloca Campos do Jordão no chinelo, muito limpa, com bela arquitetura, reflexo da colonização alemã e italiana, com grande utilização de madeira, inclusive com franjas de madeira decorando os telhados, em substituição à eira e beira de nossa arquitetura colonial. Hortênsias crescem por todos os lados, imensos e altos arbustos, cheios de repolhudos buques azulados e brancos.

 A decoração de Natal é de um bom gosto incrível, só chegando perto e pondo a mão para ter certeza que é feita de pet, são lindos candelabros de cristal transparentíssimo, cheios de luzes, enormes guirlandas verdes com laços vermelhos. Árvores de Natal, renas, trenós, bonecos de neve, bolas, presépios estão por toda parte maravilhando adultos e crianças.

De Gramado fomos visitar a cidade de Canela, que fica só a 14km. É uma simpática cidade e estava ainda mais simpática com sua divertida decoração natalina. Divertidos duendes, papais e mamães noéis estavam espalhados pela cidade, nas mais diversas e estapafúrdias posições, além de árvores de natal e enormes presentes.

Os destaques da cidade são a Catedral de Pedra, consagrada a Nossa Senhora de Lourdes, e a Cascata do Caracol, a maior do Estado, com 131m de altura. Também vale a pena visitar o Parque da Ferradura, que possui um cânion com 420m de profundidade, em formato de ferradura, no fundo do qual um pequeno rio agoniza em meio a pedras, uma vista inesquecível.

Mas o Caro Amigo deve estar querendo voltar a Gramado e saber mais detalhes sobre o internacionalmente conhecido Natal Luz... estamos morrendo de sono, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Gramado, 18 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Há 25 anos a cidade realiza um evento chamado Natal Luz, são 74 dias de festa, de 4/11 a 14/01/11, nos quais Gramado se transforma em um enorme parque, tudo que sempre povoou nossa imaginação, desde que éramos crianças, que pensávamos só existir em sonhos, encontramos. São 20 diferentes atrações, que somam mais de 500 exibições, em diversos horários do dia, algumas ao ar livre, outras em teatros e parques. O Caro Amigo deve considerar, com toda seriedade, conferir pessoalmente, principalmente trazer seus filhos e netos, mas não esqueça a sacola de dinheiro, pois grande parte dos shows são pagos, além dos milhões de tentações que povoam as vitrines.

Nativitaten é um espetáculo noturno, que ocorre no Lago Joaquina Rita Bier e envolve cantores líricos, coral, fogos de artifício, luzes de chafarizes, em cinco atos: criação do mundo, paraíso, pecado de trevas, súplica pela salvação, nascimento do Salvador e epifania.

O Grande Desfile de Natal foi nosso evento predileto, é hollywoodiano, não fica nada a dever àqueles grandes desfiles americanos que vemos na TV; arrancou-nos sorrisos, palmas, exclamações, quase lágrimas. São 200 integrantes, entre patinadores, atores, dançarinos, acrobatas, em pernas de pau, e crianças, todos vestidos luxuosamente e com luzinhas iluminando seus trajes. É noturno e divido em alas, como em um desfile de carnaval.

A Abertura é feita por patinadores, cantores e atores, em elegantes trajes vermelhos, que saúdam o público; e, na seqüência, a Ala do Presépio mostra os Reis Magos, pastores, anjos, o espírito do Natal, com o nascimento do Senhor. A deliciosa Ala dos Doces, com enormes xícaras cheias de confeitos e brigadeiros, rodopiando pela avenida, seguida de pirulitos, bolachas, bengalas de açúcar. A Ala dos Brinquedos não esquece bonecas, ursos, marionetes, soldadinhos de chumbo, cavalinhos de madeira e o alegre trenzinho. A Ala Branca traz a neve, pesados flocos de espuma, a rainha e os bonecos de neve. Na Ala Vermelha desfilam os soldadinhos de honra e papais noéis do mundo todo. E, como não poderia deixar de ser, o desfile é encerrado com o Trenó trazendo Papai Noel.

A Arca de Noel é um musical infantil, que conta como os animais, de uma pequena cidade, encontram uma solução para levantar fundos e atrair turistas.

A Vila de Natal fica perto do Lago Joaquina Rita Bier, uma pequena cidadezinha encantada, com lojinhas de artesanato natalino, guloseimas e parque de diversão. Nela assistimos o Teatro de Marionetes, com a encenação do nascimento de Jesus, e o Povo da Vila de Natal, nove artistas que, caminhando pela Vila e interagindo com o público, mostram, de modo lúdico, as maravilhas do Natal.

O espetáculo da Árvore Cantante ocorre na Rua Coberta, um coral com 40 integrantes canta músicas natalinas, acompanhado por bailarinas de sapateado. A Parada de Natal é um cortejo natalino, bem menor que o Grande Desfile, que conta com a guarda de honra e o trenó de Papai Noel.
O Show de Acendimento das Luzes ocorre todas as noites, às 21 horas, é um espetáculo sincronizado de som e iluminação da Grande Árvore de Natal e da cidade.

A Aldeia de Papai Noel fica dentro do Parque Knorr, lá estão a Casa de Papai Noel, com um escritório abarrotado de cartas, e a Fábrica de Brinquedos, onde o bom velhinho, auxiliado pelos duendes, produz os maravilhosos presentes de Natal.   

Existem, ainda, inúmeros outros espetáculos no Natal Luz, porém esses foram os únicos que tivemos tempo de assistir, pois, nos intervalos, ainda tínhamos que comer founde, comida italiana e os chocolates, todos tão famosos na região; além de visitar o Lago Negro, os museus do Perfume,
Automóvel e a Igreja Matriz. O Caro Amigo já está cansado? Imagine nós! Já estamos até pensando em voltar para casa para tirar umas férias (ah, ah, ah!).

Seguindo a indicação de uma Cara Amiga, resolvemos fazer um passeio de vagoneta. Calma... nós também nunca tínhamos ouvido falar, trata-se de... hora de uma parada estratégica, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio


Rio Grande, 19 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

A caminho da cidade de Rio Grande, cidade da vagoneta, pela BR 101, passamos entre a Lagoa dos Patos e a Lagoa dos Peixes, onde pretendíamos visitar o refúgio de aves migratórias, como o flamingos e o  maçarico-branco, porém o local não tem a mínima estrutura, hospedagem e sinalização zero. Nos contentamos com a vegetação de restinga, com arbustos e árvores, como pintangueiras e figueiras, além de pequenas dunas de areia.

Rio Grande é uma cidade cheia atrações e adjetivos, casarões de interessantes estilos arquitetônicos, praças, museus, como o Ártico e o da Picada, Estação Ecológica do Taim. É a cidade mais antiga do estado e, ainda, tem a maior praia do mundo, a do Cassino, mais de 200km, estando, inclusive, no Guinness Book, embora quase tudo se resuma mais a nome pomposo, que a beleza de fato.

O Balneário do Cassino é algo parecido com Ilha Comprida, praia sem graça, de areia cinza, mas é nele que estão os Molhes da Barra, uma interessante obra de engenharia oceânica. São dois longos brancos de pedra, cada um com 4km, estirados sobre o mar, com a intenção de diminuir os efeitos erosivos do mar sobre a terra, algo parecido está sendo feito em Veneza.

Sobre um dos Molhes existe um trilho onde, originalmente, corria um pequeno vagão, utilizado para manutenção, inclusive de um farol existente em sua extremidade. Com o passar do tempo, pescadores se encantaram pelo local, onde se podia pescar peixes de até 40kg (os pescadores juram que sim!), e passaram a lotar o Molhe com suas varas e iscas. Infelizmente nos contaram também que esses áureos tempos acabaram, pois a pesca predatória, feitas por barcos com redes, que, por vezes, lotam toda a extensão do Molhe, não restando sequer espaço para atirar uma linha. Claro que perguntamos sobre as providências do IBAMA, já que o fato constitui crime, em virtude de se tratar de local onde os peixes ficam represados!!! Simplesmente nos responderam que o IBAMA chega, em seus possantes helicópteros, e quanto lê o nome dos barcos, percebendo que seu proprietário é pessoa influente, dá bye-bye e vai embora, não em tão boa hora. Uma vergonha, que além de destruir o ecossistema, prejudica o sustento de pequenos pescadores e pessoas que vivem do turismo local.

Mas voltemos ao passado feliz, quando os pescadores lotavam o Molhe e os pequenos vagões passaram a ser utilizados para carregar os peixes, que já quase não mais existem. Algum esperto teve, então, a brilhante idéia de colocar uma vela, a fim de utilizar a força do vento para o trabalho, e assim foi inventada a jangada sobre trilhos, ou seja, a Vagoneta. O passeio é interessante, lá conhecemos o Chico, um pequeno leão marinho, que se separou de sua família, trazido pela correnteza, que é pequeno demais para vencer de volta; então passa seus dias fazendo graça para os pescadores em troca de um peixinho (o mesmo IBAMA foi chamado, diz que está tudo certo, que quando estiver maior ele voltará. Não temos certeza se podemos acreditar). Também vimos alguns botos, existiam mais, mas a redução dos peixes em virtude da pesca predatória, levou-os para outras paradas.

Seguimos rumo ao sul, para o Chuí, extremo do Brasil, passamos por Banhados, a versão sulista do Pantanal, áreas alagadas, cheias de aves e pequenos animais. E quanto mais descíamos, mais horrível o dia ficava, cinza e frio. Nem nos animamos a parar para umas compras no lado uruguaio do Chuí, onde há zona franca, free shopping, alegria de qualquer turista feminino, já que homens, no quesito compras, em geral, são um ser a parte do resto da humanidade (ah, ah, ah!), odeiam compras.

Entramos no Uruguai pelo estado de Rocha, decidimos passar primeiro na capital, que tem o mesmo nome e fica no interior, antes de escolhermos em qual das pequenas cidades litorâneas nos hospedaríamos. Tivemos uma grande decepção. Na escura tarde de domingo, as ruas vazias da pequena cidade pareceram ainda mais tristes e mal cuidadas, nada que lembrasse uma capital no estilo que conhecemos. Saímos correndo.

La Paloma a maior cidade balneária do estado, outra decepção. Vento, frio, céu escuro, parecia que ia desabar um grande temporal, mudamos de cidade. Pedrera, cidade, tem algo de insólito, parece uma cidade de “hippies”, casas ecológicas em meio a pinheiros ao lado do mar, sem muros, “hippongas” andam para lá e para cá, acompanhados de seus cachorros. Para os mais novinhos, que não conheceram os “hippies”, esclarecemos que foi um movimento, que lá pelos idos dos anos 70, pregava tinha como lemas paz e amor,  é proibido proibir; provavelmente são os antecessores do chato e aristocrático movimento “natureba”, os politicamente corretos. Dizem que aqui não é preciso relógio ou espelho, pois cada um acorda e come na hora que querer e veste o que quiser. 

Em Pedrera alugamos um simpático chalé, com flores e paredes branquinhas. Após um banho, uma garrafa de vinho Tannat, um suculento bife de “entrecot” (o contrafilé Uruguaio), começamos a ver as coisas com novos olhos, menos críticos.


Beijos,

Sayo e Claudio



Pedrera, 21 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Finalmente o sol voltou e com ele nossa vontade de viver, hora de conhecer Rocha. Tomamos um café reforçado, preparamos um lanchinho e saímos, havia muito a conhecer e mostrar ao Caro Amigo.

O estado divide suas belezas entre os banhados, rios, arroios e lagoas onde repousam aves e pequenos animais, declarados Reserva de Biosfera pela UNESCO; fortificações, testemunhas da batalhas entre espanhóis e portugueses; florestas de Umbus, a maior concentração do mundo dessa espécie; milhares de hectares de Palmeira Butiá; boas lojas no Free Shop; e, e principalmente, em sua costa, povoados rústicos de pescadores, junto ao oceano e suas impressionantes formações rochosas, que dão uma peculiaridade a cada praia, hoje destino de surfistas e turistas descolados.

Pedreira, a praia onde nos hospedamos, é um tranqüilo balneário, no qual os hippies convivem com elegantes casas; uma faixa rochosa sobre o litoral atlântico, falésias como um balcão debruçado sobre o mar, de onde, no inverno, são avistadas baleias. La Paloma, um dos principais destinos do litoral uruguaio, tem 20 quilômetros de praia, onde residências também dividem o espaço com jardins e pinhais, hotéis, lojinhas e restaurantes.

O transporte para Cabo Polônio é peculiar, um caminhão, 4X4, cuja carroceria foi adaptada com tubos e bancos, já que atravessa dunas de areia, declaradas Monumento Natural, que têm trânsito proibido para veículos particulares. Uma pequena ponta rochosa que avança sobre o mar, onde colônias de lobos marinhos repousam sob o sol, vez por outra dando um mergulho ou emitindo algum rouco ruído, como um protesto. Pequenas e modestas casas, por vezes casebres, boa parte branca, com coloridos telhados, dá ao local um ar mediterrâneo, quase Greco. Antigamente, só uma aldeia de pescadores; hoje, destino de hipongas. Um muito bem cuidado farol permite ver o horizonte. 

Não resistimos e voltamos ao Chuí para umas comprinhas básicas de Natal, afinal temos toda a carroceria da caminhonete para encher, ou melhor, tínhamos, pois agora está cheia de caixas de vinho, afinal dizem que faz bem a saúde e é fonte de juventude, temos que constatar pessoalmente. Também não queríamos perder a oportunidade de tirar uma foto com um pé no Brasil e outro no Uruguai, coisa de turista (ah, ah, ah!)

A Punta Del Diablo é linda, dunas de areia e pedras avançando sobre o mar azul, em uma pequena enseada. Algo mais insólito que Pedrera, centenas de pequenas cabanas de aluguel, das mais diversas cores, materiais e modelos, espalham-se, sem qualquer simetria, separadas por frágeis cercas de madeira, em meio à grama, areia e pinheiros. Não há qualquer planejamento urbano; restaurantes e mercados funcionam quase improvisadamente em pequenos locais e os pescadores, que já são poucos, ainda pescam em pequenos barcos. Apesar de muito estranho, é igualmente simpático.

O Forte de Santa Teresa destaca-se imponente entre o azul do céu e verde da mata, mostrando, no horizonte, o mar perfeito. Impecável, quase como quando foi construído, não fosse o amarelo ocre, talvez um fungo, que recobre parte de suas pesadas pedras, onde andorinhas, que enchem o céu com seus gritinhos, encontraram pequenas fendas para, sem qualquer pudor, construírem seus ninhos.  Fantástico!

Não assistimos, infelizmente, nenhum pôr de sol, muitos negócios a resolver (ah, ah, ah!). Mas, para compensar, assistimos a lua dar um show. Sentados, em um pequeno restaurante, no balcão da Pedrera, acompanhados de uma taça de Tannat (ainda falaremos um pouco mais desse vinho), presenciamos a lua alaranjada romper a barreira do horizonte, deixando preguiçosamente o mar e caminhando pelo céu, enquanto se tornava prateada.

E foi o que vimos em Rocha, hora de seguir, com destino estado vizinho, Maldonado, onde, temos certeza, o Caro Amigo não vê a hora de chegar, afinal neles estão os dois... vamos dar uma paradinha para a enésima foto, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



Punta Del Leste, 23 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

O Uruguai é uma pequena república democrática, com área de cerca de 177 Km², um grande litoral, vários rios e lagoas. Um país estável política e economicamente, com liberdade de cultos, cujos níveis de bem-estar fizeram com que recebesse o apelido de Suíça da América. Tem na criação de gado sua base econômica e altos níveis de escolaridade. Mas o que tem de melhor é a amabilidade e tranqüilidade de seu povo, que chega a chamar a atenção e cativa o coração dos turistas.

Notamos, pelas diversas praias que passamos, uma grande movimentação de trabalhadores reformando, pintando, trocando tetos e decks, decorando casas e estabelecimentos comerciais. Conversando com a população local, descobrimos que a grande maioria das praias uruguaias só funciona no verão, de dezembro a março, após tudo fecha, pois o frio é atroz, e é economicamente inviável manter qualquer tipo de comércio em um vilarejo fantasma. As cidades maiores mantêm uma pequena quantidade de serviços em funcionamento. No verão, durante o dia, faz um calor absurdo, porém a noite chega acompanhada de um vento frio, não dá para sair sem um casaco.

Chegamos ao estado de Maldonado, onde estão os balneários mais famosos do país, há quem diga do mundo, Piriapolis e Punta del Leste, além de outros menores como José Ignácio, La Barra e Manantiales. Como em Rocha, é o mar convivendo com os pinheiros e eucaliptos, também convivem harmoniosamente palmeiras e hortênsias. Mas, nitidamente, a arquitetura mudou, observa-se que a urbanização recebeu mais atenção e que o poder aquisitivo da população subiu muito, elegantes lojas e restaurantes, dizem que é o lugar dos ricos e famosos, principalmente Punta Del Leste.

Não dá para falar em estilo arquitetônico definido, na verdade a coisa parece uma grande colcha de retalhos, tão diversificada como elegantes. Encontramos desde sobradões ao velho estilo colonial mexicano até a casa do Tarzan, com cordas de seda pura; passando por castelinhos, chalés de madeira, casas de pedra, brancos sobrados mediterrâneos, singelas casinhas rosadas. De muito parecido elas têm as grandes varandas e janelões de vidro com belas vista; o excelente estado de conservação e o bom gosto acima do luxo e do tamanho.

Punta Del Leste realmente é uma pequena ponta de terra que separa as águas do oceano das do Rio da Prata. Resolvemos que seria uma excelente base para conhecer a região. Tivemos a sorte de encontrar um simpático hotelzinho, com excelente preço, bem ao lado da principal rua da cidade, a Av. Gorlero, já bem na extremidade da península, de onde se pode avistar o mar, tanto à esquerda como à direita, e até admirar vitrines famosíssimas, como Valentino e Galiano.

A cidade ainda não está completamente lotada de turistas, o que só ocorrerá no Ano Novo, mas os argentinos, americanos e brasileiros, já estão por todos os lados. Dois navios vindos do Brasil chegaram hoje em Punta e nosso calmo hotel tornou-se um reduto de brasileiros (não dá para entender como se descobrem certas coisas?)

A comida predileta dos uruguaios é a carne, lógico, já que a deles é uma das melhores do mundo, e a comem na forma de “parrilla”, nosso bom é velho churrasco. Os frutos do mar também são excelentes, o filé de Brótola é tenro, de sabor leve, uma delícia. A comida rápida, graças ao bom Deus, é o chivito, um sanduíche de bife com inúmeros complementos. Para beber, além dos vinhos locais, a Patrícia, cerveja, e o clerico (mistura de vinho branco ou sidra, frutas picadas, suco de laranja, açúcar e muito gelo), uma delicia nos dias quentes.

Provamos tudo, estava uma delícia (ah, ah, ah!)

A Ponte Leonel Vieira, localizada no Arroyo Maldonado, antes de sua desembocadura no oceano, entre Punta e La Barra, é algo bem peculiar, única em sua forma e estilo, é ondulada.

Mas o Caro Amigo nem pode imaginar quem, inesperadamente, tivemos o imenso prazer de conhecer... hora de embrulhar os presentes, tomar banho, arrumar o cabelo (claro que é o dá Sayo), fazer uma super produção, ir à missa, comer aquela ceia maravilhosa e esperar o Papai Noel, não dá tempo para mais nada, contamos depois.


Beijos,

Sayo e Claudio



Piriápolis, 25 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Infelizmente, não encontramos decorações natalinas nas cidades uruguaias por onde passamos; imaginávamos encontrar Punta piscante, ledo engano. Fachadas de casas, edifícios, hotéis praças sem qualquer adorno que lembrasse o Natal; raramente uma pequena árvore em seu interior. Igrejas sem presépio.  Que pena! Lemos que 66% da população é católica, porém grande parte é não praticante, talvez seja o motivo.

As praias de Punta Del Leste estão divididas em Brava, que estão voltadas para o oceano, onde está a famosa escultura A Mão do Afogado; e Mansa, voltadas para o Rio da Prata. Não poderemos dar detalhes sobre os cassinos, a Ilha de Caras ou o Conrad Hotel pois deixamos para conhecê-los em uma próxima visita, assim seremos obrigados a voltar (ah, ah, ah!).

A capital de Maldonado, cidade de mesmo nome, nem parece que está grudada em Punta del Leste,  é muito sem graça, nem pense em visitá-la, use seu tempo para coisas mais úteis, como uma voltinha em José Ignácio, Manantiales e La Barra.

Já Piriápolis, há 30Km de Punta, na direção de Montevidéu,  o mais antigo balneário do país, idealizado por Francisco Piria, em 1890, como cidade de turismo, é um passeio agradável, Lá encontramos o Hotel Argentino, um SPA famoso, um zoológico, 25km de praia contornados por pilastras e um calçadão (rambla), alguns museus e lojinhas para compras.

Entre Punta del Leste e Piriápolis está Punta Ballena, que dizem tem um pôr-do-sol como em poucos lugares do mundo. Por indicação de uma Cara Amiga, fomos até lá para conhecer Casapueblo (valeu Deise!).

Carlos Páez Vilaró é um artista plástico uruguaio de renome internacional, não só pelo conjunto de sua obra, mas, e talvez principalmente, por sua estória de vida, pelo seu engajamento social e político, pelos vários trabalhos que realizou pela melhoria da qualidade de vida de populações necessitadas, principalmente na África. Além de esculturas, pinturas e desenhos, também produziu filmes e documentários, além de literatura. Esteve com Che Guevara, com Pelé; expôs na China, ainda no período mais rígido do comunismo e, como muralista que é, frente às Muralhas da China, expressou seu desejo de pintá-las. Sempre manifesta sua admiração pelas mulheres, que afirma serem sempre belas, não importando a idade que tenham, e fundamentais na vida dos homens.

Vilaró foi amigo de Vinicius de Moraes, Pablo Picasso, Salvador Dalí e Pablo Neruda, que foram freqüentadores de Casapueblo, que ele define como um forno de barro, alegando que assim pessoalmente a construiu para que fosse mais humana, um lugar onde pudesse estar com seus amigos, uma casa do povo. É um misto de casa, ateliê, museu, hotel e restaurante, um dos símbolos mais divulgados do Uruguai. Um enorme palacete branco, que na verdade lembra um imenso complexo de fornos de barro branco, cheio de portas e orifícios, pendurado em um penhasco à beira-mar, paisagem inigualável, onde inclusive as andorinhas encontram um instante para parar e admirar.

E enquanto nós, pobres e reles mortais, caminhávamos maravilhados em meio às belas obras produzidas por Deus e por Vilaró, não pode o Caro Amigo imaginar quem nos apareceu em carne, osso e simpatia! O próprio Carlos Sáez Vilaró, que estava em sua casa do Uruguai para o Natal, já que parte do ano está em sua casa da Argentina, no Tigre. Duvida?

Simpático ele, não? Mais um dos excelentes serviços que só quem viaja pela CRKTour pode desfrutar (ah, ah, ah!). O magnífico pôr-do-sol, desde uma das varandas da Casapueblo, ouvindo Vilaró declamar uma poesia de sua autoria, não tivemos a oportunidade de presenciar. Teremos mesmo que voltar!  

Nos vemos em Montevidéu!

Beijos,

Sayo e Claudio


PS- Se quiser saber sobre a biografia e obra de Vilaró visite http://www.carlospaezvilaro.com/casapueblo.swf





Montevidéu, 27 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Montevidéu, a capital da República Oriental del Uruguai, tem mais de 22km de praias fluviais, pois o mesmo Rio de La Plata, que banha Buenos Aires, dá à cidade um charme muito especial, através do calçadão (Rambla) onde as pessoas se reúnem para uma caminhada, uma pescaria, um banho de praia, um bate-papo, acompanhado do sempre presente chimarrão, hábito nacional, ou, simplesmente, para admirar o pôr do sol, que acontece, por volta de nove da noite, nas águas do rio, que mais se assemelha  a um mar por sua imensidão.

Mas as duas cidades têm outras semelhanças, a paixão pela parrilla  e pelo tango, e é melhor nem entrar muito no mérito desse último, para não provocar a terceira guerra mundial,  já que Carlos Gardel é uruguaio e La Cumparcita foi escrita também por um uruguaio e tocada por primeira vez aqui, é algo mais ou menos parecido com a discussão sobre quem tem o melhor futebol, Brasil ou Argentina, problema matemático sem solução.

Tem um certo ar europeu, pessoas sentadas nos bancos das  praças ou passeando com seus animais de estimação. Presente, ainda, nas fachadas dos edifícios do século 19, com estilos arquitetônicos diversos, como o Art Nouveau, o Art Deco e o Neoclássico Espanhol, conservado em algumas construções da Cidade Velha. Porém causa pena o estado de conservação em que se encontram e o sistema de fiação utilizado, um verdadeiro crime, grosseiros fios pregados, sem qualquer cuidado, por fachadas de majestosos edifícios, destruindo a singela beleza de sua arquitetura.

Tivemos trabalho para encontrar hotel, pois queríamos ficar entre o centro e da cidade velha, perto dos principais pontos turísticos, grande parte deles, apesar das duas ou três estrelas, encontra-se em péssimo estado; outros são caros; já os que nos agradavam, estavam lotados. Mas finalmente encontramos um onde, provavelmente, está também hospedada toda a torcida do flamengo, só tem brasileiros.

Domingo é dia da Feira de Tristan e Narvaja, localizada na rua de mesmo nome, a prima pobre da Feira de San Telmo, em Buenos Aires. A princípio era uma verdadeira feira, vendendo legumes, frutas, flores, produtos alimentícios; porém, hoje, vende de um tudo. Também localizada em uma zona de lojas de antiquários, não tem o glamour de sua prima argentina, mas é bem divertida. Parece bem informal, que basta chegar esticar seu paninho e expor seu produto, sem qualquer burocracia, seja ele vendável ou não.

Encontramos de vasos sanitários usados e churrasqueiras a jóias antigas. Mais peculiares ainda são as pessoas que a freqüentam, desde intelectuais, em busca de algum livro raro, a malucos passeando seus chapéus mirabolantes, não faltam os brasileiros, um pouco em cada grupo. Mas tem antiguidades de qualidade, jogos de game e pequenas coleções de tampinhas e garrafas (essa é para o Caro Amigo Mauricio), e umas comidas gostosas, se fecharmos um pouco os olhos para as condições em que são preparadas. Compramos, comemos e sobrevivemos, apesar do sol escaldante.

A cidade está um cemitério, reflexo do feriado prolongado, nem lugar para um cafezinho se encontra, aproveitamos, então, para conhecer admirar os edifícios históricos e que se destacam por sua arquitetura, seguindo um mapa que conseguimentos no Centro de Informações Turísticas de Chuí.  Seguimos pela Avenida 18 de Julio, uma das principais artérias de Montevieu, do Centro para a Cidade Velha, cruzando as Praça da Independência e a Puerta da Cidadela, único vestígio do que foi a muralha que circundava a cidade. Atravessamos a Peatonal Sarandi, quase sem “peatones” (pedestres), tudo fechado, até a Catedral, nas proximidades da qual está o Restaurante Cortes, que nos foi indicado por uma Cara Amiga, mas que encontra-se fechado, somente reabrirá em janeiro, sinal de que termos realmente que voltar.

Finalmente, quando já voltávamos para o hotel, encontramos o Teatro Solis, o mais importante do país, inaugurado em 1856, aberto e com uma visita guiada prestes a se iniciar; tempo justo para um delicioso café em sua elegante cafeteria. O teatro está completamente restaurado, com confortáveis cadeiras de veludo vinho, palco ampliado, restaurante e uma sala de apresentações menor, aberta a exibições mais populares. Infelizmente, nenhuma exibição em dezembro e janeiro.

Chegamos ao hotel com tempo para um rápido banho, antes de assistir ao show do pôr do sol na praia e saborear um saboroso jantar, confortavelmente sentados entre hortênsias e palmeiras, no simpático jardim do Restaurante El Viejo y el Mar. Ótima opção, massa deliciosa e “Ojo de Bife” (parecer ser filé mignon) divino.

Por falar em comida, por indicação de uma Cara Amiga (está mais para Inimiga) resolvemos provar... hora do banho, outro delicioso jantar nos aguarda, contamos depois.

Beijos,

Sayo e ClaudiO



Montevidéu II, 28 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

A melhor definição que encontramos para o Mercado Del Puerto é que ele é uma pequena filial do inferno e provaremos. Sua construção, de 1868,  parece ser contemporânea ao famoso Mercado da Cantareira, que temos em São Paulo. É uma linda estrutura de ferro construída na Inglaterra, que abriga o maior centro gastronômico da cidade, onde basicamente servem parrilla (churrasco).

São enormes parrilleros, enormes grelhas de ferro, que diferem também das nossas churrasqueiras por ser inclinada e trazer a lenha, que queima produzindo enormes labaredas (deve ser bem parecido com as que ardem no inferno), em um canto confinado da mesma e, quando se transforma em pequenas brasas, são espalhadas embaixo da grelha, como fazemos com o carvão. Produzem um calor infernal, que, aliado ao calor do verão que está cruel, levam os pobres turistas, que lotam seus corredores, à beira da loucura. Verdade que tem alguns ventiladores, que quase somente servem para espalhar a fumaça e o calor. Por todos os lados crianças gritando, músicos cantando, turistas tirando fotos, menopausadas se abanando, garçons transpirando, gente devorando carne avidamente.

Quanto às comidas, mais tentações que no inferno, enormes pedaços de carne assando lentamente, grossas lingüiças, miúdos, chouriço, pimentões vermelhinhos, enormes cebolas, forte cheiro de pecado. Para refrescar uma cerveja, a Patrícia, ou um Médio y Médio, espumante com vinho, invenção local.

E foi para esse cenário que uma Cara Amiga (?) nos enviou, aconselhando-nos que comêssemos no El Palenque ( um carneiro divino) e ainda teve a capacidade de nos recomendar que não deixássemos de provar a Panqueca de Doce de Leite.

A princípio pensamos: Panqueca de Doce de Leite! Não deve ser nada de mais.  Então assistimos sua preparação, uma massa fininha, feita na hora, envolvendo um montão de doce de leite, também uma preferência nacional no Uruguai, polvilhada de açúcar (já ficou um pouco diferente da nossa), aí vem o moço da churrasqueira, com um vergalhão de ferro em brasa, fumegante, e repousa sobre a panqueca produzindo uma fumaceira danada, é quando a fumaça se dissipa... sobre a panqueca uma fina camada de caramelo, uma finíssima camada de vidro marrom com um delicado sabor adocicado, que transforma totalmente o sabor da panqueca.  É viciante!

Como somos pecadores contumazes, voltamos três vezes para comer no dito local, lambemos os beiços, chupamos os dedos, queimamos nas brasas do mercado e nos entregamo ao doce pecado da gula.  

E depois de ler tudo isso, não concorda o Caro Amigo com a nossa definição do Mercado del Puerto, mas nem pense em ir à Montevidéu e deixar de conhecê-lo e comer de tudo, principalmente a Panqueca de Dulce de Leche (valeu Yara, engordamos mais uns 100kg mas amamos de paixão).  

Mas não pense o Caro Amigo que passamos nossos lindos dias em Montevidéu somente comendo, claro que não! Nós também... hora de tomar banho e sair para jantar (ah, ah, ah!), contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



 Montevidéu III, 29 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Além de comer muito bem, em Montevidéu também fizemos interessantes passeio, uma visita guiada pelo suntuoso Palácio Legislativo, inaugurado em 1925, estilo neoclássico, um tanto eclético, sede da Câmara dos Deputados e do Senado, belo edifício em mármore, adornado por esculturas, baixo relevos com quadros de pintores uruguaios.

No Museo de La Casa del Gobierno, instalado na Plaza Independência, dentro do Palácio Estevez, encontramos um pouco da história do país, quadros de todos os presidentes, objetos pessoais de alguns e documentos. Na mesma praça, o Caro Amigo não pode deixar de tirar uma foto do Palácio Salvo, edifício símbolo do país, que quando foi inaugurado, em 1927, era o mais auto da América do Sul, onde foi tocado pela primeira vez o tango “La Cumparsita”.

O Museu do Carnaval, que fica ao lado do Mercado, é pequeno, vale a visita por mostrar que o Uruguai tem carnaval aos moldes do Brasil, guardadas as devidas proporções, e Candombe dança e música, feita por tambores, de origem africana, pois o país também utilizou o escravo como força de trabalho.

Encontramos mais uma feira, a Feira Biarites, já mais organizada que a de Tristan de Navaja, onde além dos produtos comuns, aos moldes da nossa, encontramos uma enorme quantidade de roupa, coisas bem moderninhas. Fomos à Mercado de los Artesanos, varias barraquinhas com artesanato local, mas nada de muito diferente, e ao Mercado de La Abundância, uma pequena e barata versão do Mercado Del Puerto, onde aos sábados há apresentação de tango e, durante a semana, aulas de tango.  

Os pés do Caro Amigo já devem estar doendo, então nada como uma paradinha no Café El Copacabana, na Peatonal Sarandi, serviço impecável. Basta pedir um simples café expresso para receber um copinho com suco natural de laranja, outro com água levemente gaseificada, uma tacinha com chantily, um Bis e, lógico, um delicioso café, levanta o astral de qualquer um.

Para uma linda vista da cidade, a Torre de las Telecomunicaciones (ANTEL) é uma excelente opção, uma moderna torre envidraçada, que lembra a vela de um barco, com 160m de altura. As visitas são guiadas e Daniel, nosso guia, um simpático rapaz, que, após confirmar que todos éramos brasileiros, arrematou dizendo que seria melhor, pois assim treinaria seu português; daí para frente disparou, feito uma metralhadora, em espanhol, raramente intercalado por um preposição em português. Uma graça! A vista do porto é magnífica.

O Santuário Nacional do Sagrado Coração de Jesus é enorme, num tom de tijolo, réplica da Santa Sofia; porém estava fechado, não pudemos conhecer seu interior. A Catedral é Consagrada a Nossa Senhora da Conceição, com o nome de Nuestra Senhora de los Treita e Três, em alusão aos trinta e três patriotas que deflagaram o processo de independência, onde chama a atenção o ar sombrio e sóbrio do altar principal, cor púrpura, com detalhe de iluminação nos rostos das imagens dos Santos.   
Fomos visitar uma famosa cidade balneária, Atlântida, que fica no estado vizinho a Montevidéu, Canelone, a praia é bonitinha e a cidade sem gracinha, um hotel em forma de navio, uma casa, vazia e aberta à visitação, em forma de Cabeça de  Águia, ambos necessitando restauração. O Museu de Pablo Neruda, uma das melhores atrações, foi transferido para Punta Del Leste.

Amamos o Museu Del Gaucho e da moeda, o pequeno edifício, que o abriga, foi construído pelo famoso arquiteto francês Alfredo Massüe, em 1896, e fica escondido, no numero 998, entre outros maiores e toda agitação da Avenida 18 de Julio, onde tudo acontece e todos podem ser encontrados; ainda que estivesse vazio, continuaria sendo uma preciosidade, uma caixinha cheia de jóias. Suas escadarias são em mármore, ladeadas por madeira de lei finamente trabalhada, há corredores onde o mármore forma lindos mosaicos; estuque nas paredes e teto, que ainda trazem delicadas pinturas; candelabros e arandelas em bronze, trazendo cúpulas em murano; clarabóia e vitrais sóbrios; rosáceas nos pisos de azulejo hidráulico e parquet, nos de madeira; grades de ferro com motivos florais; lustres de cristal reluzente; altas portas em madeira com vidro bisotê.     

E ainda tivemos tempo de passar pelo Estádio Centenário, inaugurado em 18 de Julio de 1930, para primeira Copa do Mundo; pelo Club Atlético Peñarol; pelo Parlamento do MERCOSUL, pelos elegantes bairros de Pocitos e Punta Carrasco; pela distribuidora da Conaprole, dizem que é o melhor doce de leite do país, vamos tratar de provar todos a fim de que o Caro Amigo possa ter uma certeza absoluta (ah, ah, ah!).

Já sentimos que o Caro Amigo está cansadíssimo, à beira da exaustão, quase a ponto de desistir da viagem e voltar correndo para casa (ah, ah, ah!); então pensamos que o ideal para relaxar seria... precisamos descer para tirar fotos com novas amigas que fizemos aqui no hotel, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio



 Canelones, 30 de dezembro de 2010.

Caro Amigo,

Nada melhor para relaxar que uma taça de um bom vinho e o Uruguai é conhecido internacionalmente pela qualidade do seu. Então pegamos o carro e saímos pela Ruta 5, entre Montevidéu e Canelones,  para conhecer (e provar, lógico) um pouco mais sobre o vinho  daqui.

O vinho do Uruguai é cultivado em uma localização geográfica privilegiada e em terras particularmente adequadas para o cultivo da vinha, pois está na mesma latitude que as melhores áreas cultiváveis da Argentina, Chile, África do Sul e Austrália - entre 30º e 35º sul, sendo possível o cultivo em todo seu território.
Foi com o vinho Tannat que o Uruguai  iniciou sua produção comercial. Em 1870, Dom Pascual Harrigue, procurando uma espécie que se adaptasse ao solo e clima locais, introduziu, no país, numerosas variedades de uva, e, entre elas, a variedade Tannat, originária do sul da França.  Algum tempo depois, Dom Pascual obteve o prêmio de melhor vinho produzido no país com o  Tannat. Por causa disso, desde 1877, o Tannat  é conhecido como o "Vinho Uruguaio". Os Tannats são vinhos de taninos suaves e macios, e uma atrativa cor. O Uruguai é o único produtor de Tannat, no mundo, onde existem vinhedos significativos em quantidades ainda maiores que em sua terra natal, Madiran e Irouléguy, no sudeste da França. A superfície plantada desta variedade representa um terço dos vinhedos do país.
Em 1978, especialistas franceses chegaram ao país, como consultores, visitaram vinhedos e adegas em todo o país e sugeriram mudanças, que foram implementadas, resultando no reconhecimento do vinho uruguaio em diversos concursos internacionais. Importante ressaltar que a arte de produzir vinhos no país continua sendo realizada por empresas familiares, não existindo, portanto, conglomerados multinacionais envolvidos no processo.

Bem, mas não estamos aqui para escrever longos tratados sobre vinhos, deixemos de retórica e passemos a parte prazerosa da coisa, estivemos em duas bodegas, a Juanico, que produz o Dom Pascual, um dos vinhos mais conhecidos no país, leva o nome do vinicultor que trouxe o Tannat  da França, e a Bouza. Em ambas é possível fazer uma visita completa, incluindo os vinhedos e a forma de fabricação, degustar 4 tipos de vinho, acompanhados de queijos e embutidos, pelo preço de R$45,00. São lindas casas de fazenda em estilo colonial, que ainda apresentam os traços originais de sua fundação, na Bouza há um ótimo restaurante, se o Caro Amigo estiver interessado é melhor fazer reserva antecipada.
Em ambas também é possível comprar, lógico, vinhos. Espumantes, brancos, tintos, roses, licores de vinho e, sem dúvida, o Tannat, em suas diversas variedades, jovens, envelhecidos em tonel de carvalho francês, combinado com outras uvas; aqui somos obrigados a confessar que, desde que chegamos ao Uruguai, não temos poupado esforços em conhecê-las todas (ah, ah, ah!) e para tanto, exceto raríssimos dias de muito calor, que nos entregamos à Patrícia, temos tomado, todos os dias, uma garrafa dele.
Como já passamos um pouco da idade de dizer que tinto só pode ser bebido com carne vermelhas, porque existe a idade de ser radical e seguir estritamente as regras, mas felizmente, graças ao bondoso Deus, existe aquela na qual nos permitimos fazer o que temos vontade, não dando mais tanta atenção ao que vão falar de nós, aprendemos que, por mais que nos esforcemos, sempre encontraram algo a criticar em nosso procedimento, afinal, sejamos caridosos, dando um pouco mais de assunto, de diversão, a quem tem uma vidinha tão triste, que a desperdiça cuidando da vida alheia.
Mas voltando ao velho e bom Tannat, nos permitimos experimentá-lo com pescado e frutos do mar, são possíveis ótimas combinações, principalmente entre massas e queijos. E como dizem que o vinho embeleza e rejuvenesce, chegaremos ao Brasil engatinhando (ah, ah, ah!), parece que já tomamos muito Tannat, começamos a falar besteiras (ah, ah, ah!).
Descobrimos como se originou o costume de tomar Medio y Medio, metade vinho e metade espumante; os imigrantes italianos que chegaram ao Uruguai trouxeram o hábito de tomar vinho branco seco, acontece que o vinho seco não era agradável ao paladar das mulheres, assim, como uma forma de galanteio, para agradar suas bem amadas, os homens passaram a servi-las com uma mistura de vinho branco seco e espumante branco doce. Hoje, a bebida é uma das marcas registradas do país, sendo já fabricada e vendida, com o próprio nome Medio y Medio, em garrafas de espumante. Uma delícia! Quem sabe o Caro Amigo passa lá em casa para prová-lo, pois é lógico que estamos levando algumas garrafas (ah, ah, ah!) 
Mas tratemos de assuntos mais sérios, onde pensa o Caro Amigo que seria um excelente lugar para passar o Ano Novo? Sabemos... mas Punta foi descartada no início da viagem, pois teríamos que dormir na praia ou deixar o dinheiro da viagem toda em algum dos caríssimos hotéis que ainda tinham vaga. Passamos então a considerar uma cidade muito charmosa, também internacionalmente conhecida como Punta, pois foi declarada Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, onde, dizem, é possível ver o a queima de fogos duas vezes, meia-noite e uma da manhã. Já adivinhou?
Beijos,
Sayo e Claudio   



Colonia del Sacramento, 01 de janeiro de 2011.

Caro Amigo,

Deixando Montevidéu, seguimos pela tranqüila Ruta 1, 177km de retas, atravessando imensos pastos e pequenos povoados. Impossível não saber quando se aproxima Colônia, já que a estrada transforma-se em um longo corredor de altas palmeiras, como que a esperar o cortejo real, já que a cidade foi fundada, em 1680, por portugueses, na desembocadura do Rio de La Plata. Palco de disputada, durante mais de um século, entre portugueses e espanhóis, até que foi incorporada ao Uruguai no começo do século XIX.
Em virtude desses conflitos, a cidade passou do domínio português ao espanhol várias vezes, o que se refletiu na arquitetura de Colonia del Sacramento, que é o resultado dos diferentes estilos arquitetônicos de seus colonizadores. O traçado da cidade, sem sombra de dúvida, é de origem portuguesa, pois contrasta com a forma de tabuleiro de xadrez ditada pelas Leis das Índias, comum a todas as cidades de origem espanhola.
Com o auxílio das gentis moças da agência de informações turísticas, conseguimos a última vaga existente em um hotel de preços módicos, para falar a verdade era quase a última em qualquer hotel, afinal a combinação de feriado, sol, praia, cassino e monumentos históricos é ideal para encher hotéis. Ele não é lá aquelas coisas, mas fica no Centro Histórico, às margens nada plácidas do Rio de La Plata e, para ir ao Cassino, basta atravessar a rua, demos uma conferida. Esquecemos de contar que aqui, no Uruguai, tem cassino por todo lado, não é muito nossa praia, por isso, em geral, não os visitamos, mas se for do agrado do Caro Amigo, pode trazer um dinheirinho a mais para suas apostas.   
No pequeno centro histórico, que a UNESCO, em 1995, declarou Patrimônio Histórico da Humanidade, uma dúzia de ruas com calçamento de pedra, praças, luminárias amarelas, casas coloniais coloridas, onde funcionam restaurantes, lojinhas, galerias e museus, disputam um pedacinho de chão e um lugar ao sol com floridas primaveras e com as águas escuras e revoltas do Rio da Prata. Um ventinho abençoado alivia o calor e lota algumas ruas de folhas secas das enormes árvores, parecem Maple, dando ao verão um tom de outono. Céu azul anil, turistas de todos os pontos do mundo, com seus trajes de verdadeiros desbravadores, botinas especiais com meias de algodão, e nós, pobres tupiniquins, com nossa havaianinha demos conta de tudo. Mas também tem gente que não se situa, pensa que América do Sul e sinal de faroeste, nem parece que existe a tão falada globalização!
Há quem diga que se parece a Parati, talvez uma coisinha ou outra. Tem uma meia dúzia de pequenos museus, que podem ser visitados com um ingresso único, que custa R$5,00, não visitamos nenhum, estavam fechados em virtude da virada do ano, mas não perdemos a subida ao farol. De qualquer modo a cidade pode ser tuda vista em meio dia, mas vale muito à pena passar pelo menos uma noite, vagar sem destino, ver o pôr-do-sol no rio, jantar em um pequeno restaurante, escutar um tango, ver o dia amanhecer nas ruas desertas; mas se tudo isso entediar o Caro Amigo, tome o Buquebus (barco veloz que atravessa o Rio da Prata) e, em apenas 50 minutos, chegará Buenos Aires, na outra margem do rio, onde poderá fazer umas comprinhas, confesso que tive (Sayo) que me segurar para não sucumbir à tentação.
Encontramos os preços, em Colônia, mais baratos que em Montevidéu e Punta. A cidade conta com ótimos restaurantes, de maneira particular gostamos do Solar de La Plaza, que tem um agradável jardim interno e uma comida ótima; não deixe de provar o Entrecot a Tres Pimientos, acompanhado de um Tannat, e o Postre de La Nona (espécie de Petit Gateau um pouco mais calórico)
Sobrou-nos o dilema de como entrar no Novo Ano, algum restaurante no centro histórico ou um picnic no calçadão da praia, como faz parte da população local, para assistir à queima de fogos dos vários hotéis e de Buenos Aires, acredite ou não o Caro Amigo, aqui afirmam que é possível. Optamos pela segunda, afinal tínhamos que conferir a tal queima de fogos diretamente de Buenos Aires. Então fomos ao mercado, compramos um Medio y Medio, alguns queijos, frios, azeitonas, tomates e matambre (uma manta de carne, recheada com ovos inteiros e legumes, enrolada, amarrada e bem cozida, que depois é cortada em fatias finas ou grossas, como um embutido, muito comum na Argentina e no Uruguai).
Pegamos nossas cadeiras de praia, o material para o picnic, o champagne e nos juntamos aos locais. A noite agradável, o céu estrelado e no horizonte era possível perceber a claridade de Buenos Aires, tudo estaria perfeito não fossem as músicas horríveis que nosso vizinho de picnic insistia em escutar no som de seu carro.  À meia noite, brindamos à chegada de 2011 em Colônia, acompanhada da queima de fogos.
 Então esperamos uma hora, pois na Argentina não há horário de verão, assim como no Brasil e no Uruguai, e, após essa uma hora... hora do banho, temos que decidir o que comeremos no jantar para acompanhar o Tannat (ah, ah, ah!).
Beijos,
Sayo e Claudio  



Paysandú, 02 de Janeiro de 2011.

Caro Amigo,

Quantos aos tais fogos artificiais vistos em Colônia, puro mito! Há quem jure que, em noites claras, realmente é possível ver, não acreditamos!
Rumo ao norte, seguimos, pela Ruta 21, até Carmelo, cidade sem graça, mas a moça do Centro de Informações Turísticas, Beatriz, fez valer nossa visita, ficou contentíssima ao saber que éramos brasileiros, seus olhos brilhavam enquanto conversávamos. Fez questão de mostrar seus diplomas do curso básico de português e português turístico; nos explicou, em nossa língua, os pontos turísticos da região, falou de sua vida e planos. Quando lhe demos uma garrafinha de Guaraton, que trazíamos do Brasil, ficou ainda mais radiante e  presenteou-nos com vários livrinhos sobre o país e o estado de Colônia. Estava escrito que era o dia de fazer alguém sorrir! Muito fácil!
Continuamos até Fray Bentos, Estado de Rio Negro, para visitar o Museo de La Revolución Industrial, antigo Frigorífico Anglo, onde, em finais do século XIX, começou a ser produzido o extrato de carne, desenvolvido por um químico alemão Justus Von Leibig, pai da Química Orgânica; que era exportado para a Europa, sendo alimento de soldados em várias guerras. Produziram, também, carne enlatada, “Corned Beef”. A fábrica foi desativada no final dos anos 70, depois de passar de mãos inglesas para o estado, por já não ser rentável, foi quando se transformou em museu, que matem parte dos escritórios originais, que tem um mobiliário bem interessante, máquinas, instrumental, documentos e cartazes. A fábrica está isolada, só pode ser vista através de um vidro, pois dizem que na manutenção das tubulações era usado um produto que hoje é considerado cancerígeno, talvez seja amianto.  
As estradas não são das piores, mas a sinalização é péssima, quando existe. Como fizemos o percurso no domingo, só cruzamos com gente indo para a praia (fluvial), já que o dia estava radiante. Iam de carro, moto, bicicleta, carroça e carregavam a casa toda, cadeiras, mesas, geladeiras portáteis, cuias de mate, garrafas térmicas, cachorros, sogras, avós, bebês. Também encontramos essa turma, sentada à beira da estrada, no final do dia, tomando mate e admirando o movimento. A vida aqui parece que caminha devagar.
Resolvemos parar para dormir em Paysandú, La Heróica. A cidade é engraçadinha, tem um comércio intenso e vários restaurantes, mas parece que não escolhemos um dia muito apropriado para visitá-la. Na Plaza de La Constituición, em frente à Basílica Nuestra Señora del Rosário y San Benito de Palermo, um coral canta o  Hino Nacional e o da Cidade, acompanhado pela Banda Municipal, discursos, espetáculos de luz e som homenageiam o  herói nacional lá assassinado, defendendo a democracia e a constituição de seu amado país.
Contam que o General Venâncio Flores, uruguaio do partido colorado, com intenção de derrubar o partido branco, que se encontrava então no governo do país, pediu auxilio ao Brasil; e que as tropas brasileiras, juntamente com as de Venâncio Flores, assassinaram, naquela mesma praça, no dia 02/01/1865, o General Leandro Gómez, um dos homens mais bravos que o Uruguai já teve, depois de mais de um mês de luta, nos quais a praça foi arrasada também. Contam, ainda, que as mesmas tropas foram responsáveis por dizimar toda população masculina adulta do Paraguai, que era, então, um país muito desenvolvido, e que nunca mais conseguiu recuperar-se. Mais uma dívida nossa!
Aí seguimos mais para o norte, para Salto, região turística de termas e parques, ideal para relaxar, tirar umas férias (ah, ah, ah!). E não pode o Caro Amigo imaginar qual não foi nossa surpresa ao saber que... vamos dar um mergulho, contamos depois.
Beijos,
Sayo e Claudio



Salto, 04 de janeiro de 2011.

Caro Amigo,

Qual não foi nossa surpresa ao saber que todos, absolutamente todos, os museus e teatros da cidade de Salto fecham em janeiro, mês de férias, quando a cidade certamente recebe mais turistas. Assim, não visitaríamos o Museo del Teatro D. A.  Larrañaga, o Ateneo de Salto, o Museo de Bellas Artes y Artes Decorativas, o Museo Histórico Municipal, o Museo del Hombre y La Tecnologia Arq. Nestor J. Minutti, a Exposición de Esculturas Edmundo Pratti  e o Museo del Rio.
A cidade tem uma linda arquitetura, casarões térreos ou sobrados, que devem datar do final do século XIX, com camafeus e estuque na fachada, colunas e altas portas-balcão que conduzem a ínfimas varandas onde as grades de ferro criam uma romântica atmosfera e, seguramente, facilitam a circulação nos calorosos dias de verão. A grande maioria dos casarões encontra-se em muito bom estado, necessitando talvez só alguma pintura; mas, infelizmente, continua o emaranhado de fios a enfear as fachadas. E neles estão sediados muitos dos museus que não visitaremos, ainda estamos inconformados! Deve o Caro Amigo ter atenção ainda ao fato de que meio dia há toque de recolher, na principal rua da cidade, a estreita Rua Uruguay, tudo fecha, é a hora da “Siesta”, a vida só recomeça às 15:00 horas.
Restou-nos fazer um passeio a represa de Salto Grande, que fica há 15km da cidade,  para conhecer a hidroelétrica internacional de mesmo nome, que Uruguai e Argentina construíram para aproveitamento do Rio Uruguai, algo parecido com Itaipu, que funciona deste 1979; sobre ela está uma das pontes que liga os dois países. Nenhuma usina passa desapercebida pelo Claudio, ele para nem que seja para uma rápida fotografada, são os ossos do ofício!  
Também visitamos a Costaneira Norte, para jantar no “El Mojarra”, que nos disseram ser um dos melhores restaurantes da cidade,  onde comemos uma deliciosa Parrilla, bem ao estilo uruguaio, com costela, lingüiça, tripa recheada, tripa assada, intestino, chouriço doce (aquela lingüiça feita de sangue, que também tem uva passa, o que lhe dá um sabor adocicado), tudo servido em uma pequeno fogareiro com brasas; tinha até farinha de mandioca, que é conhecida por aqui, e um molho de pimenta, que o nosso gentil garçom preparou, uma espécie de molho branco e pimenta do reino, que foi o que ele entendeu de minha (Sayo) explicação do molho de pimenta que preparamos caseiramente no Brasil (meu espanhol deve estar péssimo, que não me ouçam minha professora e, principalmente, minhas alunas, ah, ah, ah!).  Claro que tomamos um Tannat, que comemos tudo e que lambemos os beiços, pois como bem sabe o Caro Amigo, somos bons de garfo.
Na minha sincera opinião (Sayo), parque aquático é uma coisa para “brother”, sol causticante, muita criança chorando, aborrecente gritando e mãe berrando, briga por lugar, água gelada, brinquedos radicalíssimos e longas filas; além de estragar o penteado. Mas nada disso parece afetar o Claudio (acho que ele continua sendo “brother” em alguns aspectos). E lá fui eu, pobrezinha, acompanhá-lo em mais essa empreita, no Acuamania. Mas a coisa saiu bem melhor que eu imaginava. Local bem arborizado e cheio de quiosques de palha; cadeiras e espreguiçadeiras espalhadas, passarinhos cantando. Criançada tranqüila, mães sem crise, deve ser o mate! Água termal quentinha, é bem verdade que tinha uns brinquedos meio radicais, mas só fui à enorme e rasa piscina, que tinha quedas de água massageadoras, além de uma boa sombra. Já o Claudio, lógico, não perdeu nada. Nas redondezas também estão as Termas de Salto Grande, Daymán e San Nicanor, além do Parque Acuático, há outras termas, porém já muito distantes.
Após, passarmos a tarde de molho na água quente, demos uma voltinha pela praça Artigas e entramos na Catedral de San Juan Bautista, onde nos chamou a atenção os lindos quadros que formam a Via Sacra.
 Já quase 20:00 horas, o sol ainda era cruel, na famosa Rua Uruguay, onde também ficava nosso hotel, arborizada, com seus bancos e grades, as cadeiras da Tratoria, na calçada, nos chamavam a descansar nos braços de Patrícia. A rua estava lotada, lojas abertas, camelôs, brinquedos espalhados por todo lado, crianças fazendo birra. Pode o Caro Amigo imaginar o motvo de toda essa comoção, afinal o Natal já passou! Acontece que no Uruguai... está muito quente, resolvemos que é hora de nos rendermos aos apelos de Patrícia, a cerveja, contamos depois.
Beijos,
Sayo e Claudio



Termas de Arapey, 06 de janeiro de 2011.

Caro Amigo,

Enquanto tomávamos nossa cerveja, a Patrícia, na Tratoria, observamos, localizado do outro lado da rua, o Hotel Concórdia, onde já sabíamos havia se hospedado Carlos Gardel, dizem até que seu quarto transformou-se em um museu, estando preservado como deixou o cantor. Fomos dar uma espiada, cruzamos a porta entreaberta, seguimos pelo corredor e, pasme o Caro Amigo, descobrimos que o hotel, o mais antigo do país, que funcionava no andar superior, estava fechado, por todo o mês de janeiro, para férias coletivas. Mas, ainda assim, apesar de mais essa decepção, encontramos um Centro Cultural, fechado, e um solitário bistrô, Arcano, com mesas bem postas, toalhas cor de erva-doce, taças, guardanapos dobrados em forma de flor. Ficamos para o jantar.
Abrimos mão do conforto das cadeiras Art Noveau com almofadinha, que, seguramente, chegaram ao local pouco depois da construção do velho casarão, provavelmente a meados do século XIX, para sentar no misterioso pátio interno, cheio de plantas, de onde se tinha uma melhor vista de todo o interior do edifício, que tinha um romantismo meio decadente, uma nostalgia nas paredes já precisando pintura, nas grades de ferro já enferrujadas, nas portas de madeira dos quartos, em forma de veneziana, que saem para o corredor, que se debruça sobre o pátio e seu jardim, onde alguma senhora, com seus longos cabelos soltos e camisolas de algodão e renda, deve ter saído para tomar ar em alguma madruga quente, e é bem capaz que Gardel a tenha espreitado. Talvez fosse a própria Patrícia, em carne, osso e formosura. Why not? Juramos que sempre estamos bem sóbrios quando escrevemos (ah, ah, ah!).
Nosso coração não resistiu e, finalmente, resolvemos dar uma esticadinha até a Argentina, já que para chegar à cidade Concórdia basta atravessar a ponte sobre a Represa de Salto Grande. Passamos a tarde, caminhamos pela Costaneira, onde estão as praias, fomos ao Parque San Carlo, fizemos umas comprinhas no centro e jantamos um Bife de Chorizo, no Cristóbal Café, um agradável restaurante na agitada Plaza 25 de Mayo; que estava ainda mais agitada por ser quarta-feira, dia em que, em mesa de mulheres, a conta tem 50% de desconto. Nunca vimos tanta mulher junta e de idades tão variadas, de mamando a caducando, em algumas mesas se podia observar avós, filhas, netas e, talvez, até bisnetas, algo bem democrático.
Agradou-nos, sobremaneira, a cortesia de nossa garçonete, Lucrecia (nome forte) que, ao reclamarmos que nossa salada, que deveria ter tomate seco, trazia apenas minúsculos pedaços de tomate natural, prontamente a retirou e dirigiu-se à cozinha para reclamar; mas, infelizmente, não havia tomate seco, preferimos ficar sem salada. Quanto aos bifes, vieram passadíssimos, apesar de os termos pedido “rugosos” (mal passados), um crime, mas não me animei a reclamar (porque é sempre Sayo a reclamar, enquanto Claudio faz cara de santinho, de “nem conheço essa mulher”); Lucrecia, que passava, gentilmente indagou sobre eles, então, aproveitando a deixa, mostrei-lhe as condições dos bifes, ela própria teve o surto que eu estava louca para ter, retirou os pratos e deu um show ao devolvê-los para a cozinha, afinal nenhum turista merece bifes como aqueles, nem os brasileiros; retornou desculpando-se e indagando se poderíamos aguardar outros bifes. Esperamos e nos deliciamos com suculentos Bifes de Chorizo.
Voltamos a Salto já quase uma hora e, pasme o Caro Amigo, a Rua Uruguay continuava um pandemônio, lojas ainda abertas, restaurantes cheios, pessoas carregadas de sacolas de presentes. Acontece que aqui, o Uruguai, dia de Reis, 06 de janeiro, é que é dia de criança ganhar presente, dia que os Reis Magos chegaram para presentear Jesus, inclusive é ponto facultativo e a maioria do comércio fecha.
Então deixamos Salto, em direção mais ao norte, com a intenção de passar o dia nas Termas de Arapey, uma das mais famosas do Uruguai, principalmente por seu valor medicinal, e seguir para dormir em Artigas. Acontece que erramos a estrada, o que não é muito difícil por aqui, já que a sinalização é ruim e não andamos com GPS, seguimos sofrendo com o bom e velho mapa. Difícil mesmo é reencontrar o caminho, já que não há postos de gasolina nas estradas, onde também quase não passa viva alma, o jeito é bater palma em alguma minúscula casinha, quando a encontrar, o que também não é tão fácil, e rezar para que alguma alma caridosa atenda. 
Resumo da estória, tivemos que encarar 60km de terra, no meio de fazendas de vacas, emas e ovelhas, mas, finalmente, água quentinha.
 Nas Termas de Arapey encontramos camping, chalés, hotéis, seis piscinas, jardins, restaurantes. É como uma pequena vila, afastada de tudo, não a consideramos tão sensacional como todos comentavam e como lemos em guias de viagem, está um pouco decadente, necessitando de restauração e modernização.
 Mas como já era tarde, a próxima cidade era distante e a água era realmente deliciosa, resolvemos ficar em um dos hotéis e aproveitar melhor as piscinas, que ficam abertas até às 24:00 horas; Artigas e as compras nos vários “free shop”ficam para amanhã.
Beijos,
Sayo e Claudio



Artigas, 08 de janeiro de 2010.

Caro Amigo,

Chegamos a Artigas esperando uma cidade grande, cheia de hotéis e free shops, não foi bem o que encontramos. A cidade é pequena, tem só dois hotéis, nada bons, tivemos que escolher o menos pior, porque procurar hotel no lado do Brasil e ficar atravessando a fronteira, para lá e para cá, com o carro trazendo metade da produção de vinho do Uruguai, não dava (ah, ah, ah!), seria contar muito com a sorte.

O calor era infernal, mesmo assim, saímos visitamos as poucas pequenas lojas e, como sempre, encontramos um monte de coisas que, há centenas de anos, vínhamos incessantemente buscando, sem jamais encontrar (nem pense o Caro Amigo que estamos exagerando), e as compramos todas. Também encontramos um restaurante, El Viejo, onde a Patrícia estava estupendamente gelada e a churrasqueira em labaredas, ficamos e comemos mais uma parrilla.

Na manhã seguinte levantamos cedo, pois resolvemos ir até Rivera, para mais comprinhas, mas agora pela estrada brasileira, então teríamos que atravessar a fronteira para o Brasil e, conseqüentemente, enfrentar a Policia Federal, com as nossas dúzias de garrafinhas de vinho além da quota, uma coisa bem inocente, afinal vinho é considerado alimento funcional, portanto não deveria estar sujeito a esse tipo de restrição. Passamos a barreira, não havia ninguém, paramos rapidamente em Quarai (BR) e seguimos nossa viagem tranqüilos, em companhia de todas as nossas garrafinhas, já sonhando com uma taça de Medio y Medio, bem gelada, na varanda de casa.

Após 100km de uma boa estrada, BR-293, e chegamos a Santama do Livramento, no Brasil, que faz fronteira com Rivera, no Uruguai, mas que de fato são uma só cidade, assim como Chuí, estando os países separados por uma rua.

É algo parecido a nossa fronteira com o Paraguai, em Pedro Juan Cabalero, mas muito mais organizado e limpo, um paraíso de compras, principalmente cosméticos, wiskies e perfumes (o que você procurava Diana). Não nos fizemos de rogados, compramos mais um pouquinho, não exageramos porque, há 5km da cidade, na estrada, existe um posto da Policia Rodoviária Federal, o que significa nova fiscalização, outra incógnita.

Beijos,

Sayo e Claudio



Ibirubá (RS), 09 de janeiro de 2011.

Caro Amigo,

Mais uma vez passamos pela fiscalização sem problemas, pode passar lá em casa para uma tacinha de vinho.

Viemos para o Rio Grande do Sul pela BR-116, foi uma viagem ruim, muito caminhão, difícil ultrapassagem, escolhemos, então, outro trajeto para iniciar o retorno, mais pelo interior, fizemos uma boa escolha, pois as estradas são boas, vazias e atravessam plantações de milho, soja e arroz, lagos, matas, riachos, pastos com vaquinhas marrons e pequenas cidades, muito floridas, onde o pessoal, à principio, é um pouco reservado demais, mas depois se acostumam com a gente.

Assim, tomamos a BR-158 até Santa Maria, onde pegamos a BR-223, Rota das Terras, parando em Ibirubá para dormir. A cidade é simpatiquinha, com árvores cheias de flores rosa e lilás (não sabemos o nome); tem vários hotéis, sendo o Suíço o melhor; modernas casas amplas e confortáveis; lojas boas, com confecção moderna; mas, no quesito restaurante, deixou a desejar.

Quando entramos em um deles, que dizem ser um dos melhores, muito sem graça e precisando de uma geral, parecido com restaurante de rodoviária, e a garçonete nos perguntou se tínhamos reserva, dessa vez foi o Claudio que quase enfartou, pois, para quem não sabe, ele diz que 50% da viagem é o que ele vê e 50% é o que ele come, portanto quer sempre comer em um dos bons restaurantes da cidade, badaladíssimo, com linda decoração, toalhas impecáveis, garçons engomados e cheio de gente linda e sorridente, do pessoal que trabalha em propaganda de creme dental; sentando-se na melhor mesa, à beira da janela que dá para o Rio Sena, podendo aceitar o Rio Danúbio ou, talvez o Nilo. E, para tanto, me arrasta horas pelas ruas das cidades, até que eu, pobre de mim, faminta, à beira de um desmaio, dou um grito e ponho um ponto final na coisa; então ele rapidinho se decide.

Mas quando chega o prato... recomeça o calvário, é a hora do festival de fotos, ele fotografa cada um dos pratos, passa o manual da máquina de fotografias (em alemão, claro!) para o pobre do garçom para que ele tire um maravilhoso retrato do casal, a fim de guardar, para a posteridade, uma lembrança do fato (isso se não der um problema no computador e perder tudo, porque fotos, infelizmente, nunca mais as vi); e o meu prato esfriando (adoro comida quente, queimando a língua), então ele quer conferir se as fotos ficaram boas e, se for o caso, repeti-las, aí eu tenho que sorrir tudo de novo, o restaurante todo olhando para minha cara e pensando: que turista babaca. Responda sinceramente o Caro Amigo, não está na hora de dar outro grito com ele? Claro que está e é o que eu sou obrigada a fazer novamente. Depois há quem diga que mulher é estressada, não tem paciência, está sempre na TPM e mais um montão de asneiras. A grande verdade é que tem um montão de homens que não se situam, que adoram viver perigosamente, que cutucam a onça com vara curta, não é verdade Cara Amiga?

Mas voltando ao enfarto dele, acho que a pobre garçonete não foi muito feliz com a pergunta, e ainda por cima ofereceu para ele uma mesa que não era a da janela, à beira daquele translumbrante rio, realmente ela não foi feliz novamente e... está na hora de comer, senão a comida esfria, contamos depois.

Beijos,

Sayo e Claudio


Curitiba, 10 de janeiro de 2010.

Caro Amigo,

Resumindo a estória, deixamos para comer naquele restaurante tão concorrido, Taverna, na próxima vez que retornemos à cidade, quando, então, seguramente faremos reserva (ah, ah, ah!), a pobre da garçonete até que insistiu para que ficássemos, mas sem aquela mesa à beira daquela janela, que dá para aquele rio, não teve a menor chance.

 Fomos para um outro dos melhores restaurante da cidade, Palatu’s, que, pelo menos na aparência, era pouca coisa melhor que o primeiro, onde encontramos um garçom que, segundo as palavras dele, não gostava de falar dos outros, mas nos contou a vida da cidade toda, inclusive do noivo do casamentão, que se realizava naquele dia, motivo pelo qual o restaurante estava vazio, pois todos foram ao casório. Já sem os braços de Patrícia, nos entregamos à Bohemia e demos muita risada lembrando da tal reserva, comemos e fomos dormir.

Na manhã seguinte, no café da manhã do hotel, reencontramos aquele delicioso e diferente creme de leite que acompanhou nossa torta de maçã no restaurante de Treze Tílias, no inicio da viagem. Dessa vez não tivemos dúvida, perguntamos o que era, e a dona do hotel nos contou que se trata de creme de leite-nata, que é muito comum na região, sendo utilizado inclusive como substituto da manteiga no pão; é vendido fresco nos supermercados e, quando batido, vira manteiga. Corremos ao supermercado para comprá-lo, afinal temos nossa super geladeira no carro.


Partimos através da BR-153, atravessando Santa Catarina, mas ao chegar ao Paraná já não a encontramos tão bem; alguns trechos estão bem ruim, outros estão em manutenção, restando cerca de um terço dela em boas condições, além dos caminhões que reapareceram.

Rodamos quase o dia todo, abandonamos as malas no hotel, tomamos aquele banho relaxante e fomos jantar com amigos que há anos não víamos, Rosane e Carlos. Uma dupla satisfação, a boa comida do restaurante Panphylia (que atendia aqueles requisitos do Claudio, ah, ah, ah!) e reencontrar os amigos muito bem.

O Mercado Municipal de Curitiba não é tão grande, nem tão charmoso, como o de São Paulo, mas vale uma voltinha, tem umas bancas de pimenta de enlouquecer os amantes da danada; muitos produtos japoneses; carnes especiais, como marreco e javali; além de restaurantes com comida das várias etnias que formam a população do estado, como pierog (já lhe contamos em nossa viagem da Polônia), joelho de porco, chucrutes, marreco recheado, polenta e massas. 
  
Vamos parar por agora, está na hora seguir viagem a Régis Bittencourt (BR-116)  nos aguarda.

Beijos,

Sayo e Claudio



Santos, 14 de janeiro de 2011.

Caro Amigo,

Na manhã do nosso último dia em Salto, enquanto tratávamos de arrumar as malas para partir, escutávamos a Globo Internacional, em certo momento nos demos conta de que Monica Valdwogel... entrevistava duas psicólogas, ou psicanalistas, que, infelizmente,  quando nos demos conta, já haviam sido apresentadas, portanto não sabemos seus nomes. A entrevista discutia o tema “A Felicidade Aumenta com a Idade” e muitas das considerações feitas chamaram nossa atenção, portanto gostaríamos de dividi-las agora com você, Caro Amigo, até porque a grande maioria dos Caros Amigos, assim como nós, já passou dos 50.

Diziam, então, que a nossa felicidade tem um gráfico em forma de “U”, que decresce com a idade, voltando a aumentar na maturidade. Assim, entre 40 e 50 anos seria o período mais infeliz de nossas vidas, quando as grandes mudanças acontecem. Quando já não somos tão bonitos; perdemos muitos de nossos entes queridos, ou porque morreram, ou porque casaram e mudaram; caem as taxas de hormônio; já não enxergamos tão bem; nos aposentamos ou não encontramos emprego; ficamos doentes com mais freqüência. Em resumo, deixamos de ser os Super Homens e as Super Mulheres que sempre fomos, temos que aceitar a nossa simples humanidade e as nossas perdas,

Chega a hora de uma, para usar uma palavra da moda, repaginação, de ter julgamentos menos rígidos; não podemos mudar a carga que a genética nos trouxe, mas podemos mudar os fatores ambientais em que vivemos, o que colocamos a nossa volta. Ter a memória mais curta ajuda muito, esquecer certas coisas, não ficar apegado a detalhes do passado, imaginando que tudo que deu errado foi proposital. Ser mais tolerante, mais permissível, permitir-se errar, perdoar-se e perdoar os outros.

O mais importante é que devemos acreditar que podemos fazê-lo, que está em nós fazê-lo, pois é quando encaramos e aceitamos as mudanças que a idade nos traz, embora nem sempre tão boas, e nos tornamos mais flexíveis, passando a acreditar um pouco mais no acaso e deixar que ele nos leve um pouco para lá, um pouco para cá; é aí que voltamos a fazer as pazes com a felicidade.

É bem verdade que há pessoas para quem as coisas são mais fáceis, que têm síndrome de Polyana, que estão sempre de bem com a vida e felizes. Normalmente são as pessoas extrovertidas, pois encontram ajuda através de um conselho, um alerta, uma palavra de apoio; interagem com outras pessoas tornando-se também mais úteis. Mas seguramente todos têm a capacidade de mudar, porque tudo que se alimenta, que se cuida, cresce e dá frutos, porém há que se escolher o que deve crescer.

Na mesma viagem tivemos ainda o prazer de conhecer muitas pessoas admiráveis, que cruzaram o nosso caminho e contribuíram para tornar nossas vidas ainda mais felizes; além de contar com a excelente companhia do Caro Amigo, lógico.

Obrigado por escolher nossa empresa para sua viagem (ah, ah, ah!)

Hasta la vista!

Sayo e Cláudio

PS: Quanto as nossas metas? Todas integralmente cumpridas, encontramos Papai Noel, tomamos muito Tannat, comemos carne uruguaia e visitamos tudo quanto foi praia, pode aparecer em casa para conferir nosso bronzeado, pois certamente serviremos uma taça de Medio y Medio ao Caro Amigo (ah, ah, ah!!!).






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